terça-feira, 15 de fevereiro de 2022

Manuel Gonçalves: 12 anos de saudade

Manuel Gonçalves morreu há doze anos. O mais dinâmico e mais empreendedor empresário tauromáquico dos finais do século XX, um homem que viveu sempre à frente do tempo, perdeu a vida no dia 15 de Fevereiro de 2010 em consequência de uma queda pelas escadas da casa que estava a reconstruir na aldeia de Mizarela, no concelho da Guarda, onde nascera e onde está sepultado.

Foi transportado ao Hospital da Guarda e transferido para o de Coimbra, onde já nada foi possível fazer para o salvar, dada a gravidade da lesão sofrida. Tinha 76 anos.


Encontrava-se na sua aldeia natal, onde ainda vivia um seu irmão, na companhia de sua Mulher, Dª Maria Emília (também já falecida) a passar o fim-de-semana prolongado de Carnaval. A notícia deixou o meio tauromáquico em estado de choque.


Poucos dias antes de morrer, a 6 de Fevereiro, recebera a última grande homenagem por parte da Rádio Portalegre, que lhe outorgou um troféu durante um jantar que decorreu em Espanha no Hotel "El Convento" em Valência de Alcântara. Foi a sua última aparição pública no meio tauromáquico.


Empresário taurino e não só, iniciou a sua vida em Moçambique, onde organizou grandes e históricas corridas de toiros com as maiores figuras da época na Monumental de Lourenço Marques (hoje Maputo), sua propriedade até à descolonização, bem como muitos outros espectáculos como os célebres Concursos de Misses, também combates de boxe e concertos musicais. Levou a Moçambique, na época, as maiores figuras do mundo tauromáquico e também os maiores nomes da canção e do mundo do espectáculo, como Amália, Raúl Solnado, João Maria Tudela e tantos mais.


Depois do regresso a Portugal, apressado pelas circunstâncias revolucionárias do tempo, refez a vida em França, para onde rumou levado pelo seu amigo Manuel André Jorge (cavaleiro tauromáquico de Nave de Haver) e durante vários anos geriu algumas das principais praças de toiros desse país.


No início dos anos 80 restabeleceu-se em Portugal e fez história gerindo algumas das principais praças nacionais, entre as quais a do Campo Pequeno, onde foi empresário em duas ocasiões.


Lançou e consolidou corridas que passaram a ser datas tradicionais no nosso calendário taurino, com destaque para a do programa "Despertar" da Rádio Renascença, com a qual esgotou anos seguidos a Monumental de Santarém. Foi também obreiro da Corrida "Correio da Manhã" e destacado organizador das corridas do jornal "Farpas" e da RTP.


Foi, juntamente com o saudoso Alfredo Ovelha, o grande incentivador e apoiante do arranque da carreira do cavaleiro Luis Rouxinol, que este ano comemora 35 anos de alternativa, recebida em Santarém precisamente numa Corrida da Rádio Renascença por si organizada. Manuel Gonçalves chegou também a ser apoderado de alguns toureiros, entre os quais Pedrito de Portugal.


No ano em que morreu, tinha agendada a organização de três corridas da RTP nas praças do Redondo, da Póvoa de Varzim e da Figueira da Foz e ainda a 11ª Corrida "Farpas" de novo no Coliseu Figueirense - espectáculos que se chegaram a realizar, assegurados por seu filho António Manuel Gonçalves. Estava ainda em conversações com a empresa "Aplaudir" de João Pedro Bolota, para a possibilidade de realizar ainda uma quinta corrida numa das praças geridas por esta empresa, provavelmente a do Montijo. Acalentava a esperança de nessa temporada poder finalmente realizar o seu antigo sonho de juntar mano-a-mano João Moura e Paulo Caetano.


Homem de rara visão empresarial e um sentido apurado do espectáculo, foi sobretudo um grande empresário, sem ser um grande taurino. Sabia e tinha a intuição para dar o tiro na hora certa e por isso montou inesquecíveis corridas como os mano-a-mano Domecq/Moura, Moura/Ojeda em Lisboa, e outras. Relançou nos anos 90 a moda das corridas de seis cavaleiros, muito criticada na altura, mas que hoje estão de volta e com o agrado de todos.


Manuel Gonçalves, que recordamos com saudade, continua a fazer muita falta à Festa. Muita falta, mesmo. Nada voltou a ser como dantes depois da sua partida.


Fotos M. Alvarenga, Emílio de Jesus/Arquivo, Marques Valentim e D.R.


Um empresário visionário - que viveu à frente do tempo
Com João Moura e Miguel Alvarenga, a quem chamava "os
meus meninos"
No Campo Pequeno com Pedrito de Portugal e Cinha Jardim
Também no Campo Pequeno, final dos anos 80, com Miguel
Alvarenga e Fernando Camacho
6 de Fevereiro de 2010, dias antes de morrer,
quando foi homenageado pela Rádio Portalegre.
Na foto, com os jornalistas Hugo Calado, Pedro
Pinto (agora na política, líder parlamentar do
Chega) e Miguel Alvarenga
Capa do jornal "Farpas", Fevereiro de 2010