sexta-feira, 25 de julho de 2014

Amigos para sempre: Ventura virou tudo do avesso e reconquistou Lisboa!

Rigorosa, serena, aficionada, a direcção de corrida de Manuel Gama foi ontem meio
caminho andado para o grande sucesso da noite
Ventura fez definitivamente as pazes com o público de Lisboa. Reconquistou
o Campo Pequeno, reconciliou-se com os directores de corrida, mas sobretudo
protagonizou um triunfo memorável
Logo no primeiro toiro (extraordinário, mas com pouca presença), Rouxinol
deu o litro e disse que se tinham ido ali ver Ventura, não haveriam de sair dali sem
também falar dele. Em baixo, Filipe Gonçalves com o cavalo que bate palmas



Miguel Alvarenga - Diego Ventura é quem é e chegou onde chegou pelo seu imenso valor, esse valor que ontem deixou bem patente no Campo Pequeno e a que não fazem falta malabarismos, jogadas de bastidores, toiros enfeitiçados e jogos viciados como os que marcaram a sua anterior apresentação nesta mesma praça e que tão mau ambiente deixaram à sua volta.
Ontem, Ventura bateu os pés, aqui quem manda e é figura sou eu, foi sózinho ao sorteio, não permitiu interferências de ninguém e saíu à arena, parecia ele que trazia o diabo no corpo, decidido a cumprir a suprema missão de reconquistar Lisboa, pôr os pontos nos iis, reconciliar-se com quem estava de candeias às avessas - o público e os directores de corrida, até mesmo a empresa - e triunfar numa praça que, doa a quem doer, é muito mais do seu rival Hermoso do que sua. Mas conseguiu virar tudo do avesso. E são gestos como este que marcam a trajectória dos toureiros grandes. Ventura é um deles, sem dúvida alguma.
O ambiente inicial não era propriamente favorável, o que se entende na perfeição, depois dos escândalos que marcaram a anterior corrida de Ventura nesta praça. Houve assobios nas cortesias e na sua entrada na arena, assobios aos bandarilheiros de cada vez que intervieram, assobios a Ventura quando sofreu um violento toque logo no princípio da primeira actuação. Mas, aos poucos, ele foi invertendo tudo.
A primeira faena foi "diabólica" e o público terminou rendido. A segunda, com um toiro com muito mais presença, a pedir contas e sem facilitar (nem cair...), foi enorme, primeiro com o cavalo "Puerta Grande", depois com a égua "Milagros". Ventura foi finalmente Ventura sem artifícios pelo meio - e Lisboa rendeu-se-lhe. O director de corrida Manuel Gama, rigoroso, mas sensato, permitiu-lhe mais três ferros e a festa acabou em grande, com uma segunda volta à arena acompanhado pelos cavalos e tudo! No final, deitou-se para beijar a arena e o público explodiu numa estrondosa ovação. Bom para Ventura, bom para o Campo Pequeno e bom, sobretudo, para a Festa. A praça encheu à custa dele, na expectativa e na surpresa de ver o que acontecia desta vez. A lotação não esgotou, havia sobretudo muitas barreiras e contra-barreiras (os lugares mais caros) por ocupar, mas o Campo Pequeno registou uma das maiores enchentes deste ano - e isso a Ventura se deve.
Os toiros de Herdeiros de Cunhal Patrício tiveram excelente comportamento e deram bom jogo. Muito bom o primeiro, apesar de pequenote, algo reservado o segundo (também pequeno), fabuloso o terceiro, de boa nota o quarto, complicado o quinto (um "toirão") e bom o sexto. Exceptuando os dois primeiros, os restantes tinham inquestionável presença e trapio. Já vi ganadeiros chamados à arena por muito menos - ontem, esqueceram-se desse pormenor...
Frente a um Ventura que ontem foi mesmo um autêntico "furacão", eu diria mesmo, um "tsunami" de proporções incalculáveis, Luis Rouxinol deu ontem o litro, como sempre, e logo no primeiro toiro fez questão de dizer que se tinham ido ali para ver Diego, também haveriam de sair dali a falar dele. Lide brilhante e reveladora da imensa maturidade e maestria de um toureiro que nunca sai de uma arena vencido. Esteve enorme e enorme voltou a estar no seu segundo toiro.
Filipe Gonçalves é um toureiro valoroso e em fase de permanente afirmação, mas está ainda numa "galáxia" inferior e ontem, no seu primeiro, acusou os nervos de querer superar o que não se supera: as lides anteriores de Rouxinol e de Ventura.
No último da noite, começou por cravar un fabuloso comprido de poder a poder, veio depois outra vez abaixo, mas conseguiu subir o tom da sua actuação nos curtos e terminou com o adorno dos "violinos" no cavalo "Xique", o que bate palmas, acabando por conquistar também o público.
A noite de ontem em Lisboa ficou também marcada pela extraordinária e elevada competição entre os grupos de forcados de Santarém e de Vila Franca, que executaram seis "pegões" à primeira tentativa - com destaque para todas as pegas, mas em particular para as duas últimas, enormes, de António Grave de Jesus (Santarém) e Pedro Castelo (Vila Franca).
Por Santarém foram ainda solistas o cabo Diogo Sepúlveda (tecnicamente perfeito, numa grande pega) e António Taurino (bem, emendando-se na cara do toiro e fechando-se com decisão); e por Vila Franca, também abriu praça o cabo Ricardo Castelo (muito bem, como é seu timbre) e pegou depois Bruno Casquinha (numa pega emotiva e poderosa). Os dois grupos estiveram muito bem a ajudar.
O grupo de Santarém brindou uma pega a Duarte Cortes, irmão do saudoso José Maria Cortes; e o de Vila Franca dedicou a sua última intervenção ao companheiro Ricardo Patusco, vítima de lesão numa perna por colhida na corrida do Colete Encarnado.
Numa noite de alguma (incompreensível) hostilidade para com os bandarilheiros, ressalve-se as boas intervenções de David Antunes e Josué Salvado, Paco Cartagena e Mário Figueiredo, Cláudio Miguel e Duarte Alegrete.
A terminar, renovo os meus aplausos à excelente direcção de corrida de Manuel Gama, assessorado pelo Dr. Carlos Santana (de Évora), que foi meio caminho andado para o sucesso da corrida e para a reconcilicação de Ventura com a aficion lisboeta. No início da corrida, guardou-se um minuto de silêncio em memória de Francisco Lobo de Vasconcellos, filho do ganadeiro do mesmo nome, que morreu terça-feira no Algarve, vítima de ataque cardíaco.

Já a seguir, não perca: as pegas uma a uma, os Momentos de Glória e o registo dos Famosos que ontem estiveram no Campo Pequeno.

Fotos Emílio de Jesus/fotojornalistaemilio@gmail.com