terça-feira, 21 de dezembro de 2021

Toureio a pé: o parente pobre da nossa tauromaquia...

2021 foi o ano de "Juanito"

Miguel Alvarenga - Foram poucas e quase se contam pelos dedos das mãos as corridas com matadores ou novilheiros na temporada de 2021, o que significa que o toureio a pé, apesar do entusiasmo manifestado pelo público nas vezes em que "apareceu", continua desgraçadamente relegado para segundo plano. É a realidade. Infelizmente.

Temos um extraordinário naipe de bons matadores e de promissores novilheiros - mas eles continuam a ser uma "raça em vias de extinção"... O toureio a cavalo e os forcados são, há muitos anos, os grandes pilares da nossa Festa.

Luis Miguel Pombeiro (no Campo Pequeno e nas suas outras praças) e Ricardo Levesinho (em Vila Franca e na Moita) foram os empresários que mais arriscaram e que mais deram visibilidade ao toureio a pé. Um e outro deram-se mesmo ao luxo de organizar (em Lisboa e na "Palha Blanco", respectivamente) duas corridas de oito toiros e quatro matadores. A resposta do público foi fraquíssima nas duas praças... Rui Bento apostou também numa fortíssima corrida mista em Almeirim - que esgotou a lotação permitida.

Nos anos mais recentes, houve a ajuda de Padilla (no Campo Pequeno) que nos fez acreditar no ressuscitar do toureio a pé, mas foi sol de pouca dura e praticamente em nada beneficiou os matadores lusos. Este ano veio António Ferrera e exceptuando o facto de Diogo Peseiro ter dado nas vistas a seu lado em Almeirim, tudo ficou como estava.

Morante de la Puebla, na Moita e no festival da Chamusca (com "El Fandi" e Manzanares) e José Garrido e Román em Lisboa, foram os matadores estrangeiros que deram que falar este ano em Portugal.

Os matadores que temos continuam, contudo, a lutar e a triunfar. São persistentes e acreditam, presumo, que um dia a sorte lhes sorrirá. Como ainda ontem me dizia, na entrevista que lhe fiz, o novilheiro Diogo Peseiro, por mil vezes pensou em desistir, mas encontrou sempre mil e uma razões para continuar.

O boom "Juanito" marcou a temporada de 2021. Os tempos são outros e a projecção do toureiro não alcançou (ainda) o mesmo mediatismo da de Pedrito de Portugal no início dos anos 90, de qualquer forma o jovem matador de Monforte deu este ano nas vistas e é neste momento a grande esperança dos aficionados do toureio a pé. Triunfou em Espanha, Badajoz foi importante e outras praças também o foram, mas não deu ainda o salto para fora da raia fronteiriça. Sevilha e Madrid ainda lhe faltam para a afirmação definitiva - o que pode vir a acontecer já no próximo ano. Roma e Pavia não se fizeram num dia...

Graças a uma boa máquina promocional, ultrapassou as barreiras da tauromaquia e teve este ano presença nos jornais generalistas e na televisão, numa bem sucedida entrevista a Manuel Luis Goucha na TVI.

Nas arenas, triunfou em Lisboa, na Moita, na encerrona em Vila Franca, marcando uma posição de destaque entre os matadores nacionais. É, disso ninguém tem dúvidas, a nova estrela do nosso toureio a pé - e o nome de que os aficionados falam.

Manuel Dias Gomes é um clássico e permanece na crista como o veterano mais activo de cada temporada. Toureou sete vezes em 2021 e manteve o seu nível, o perfume do seu temple e da sua arte sevilhana. Não toureou em Espanha, mas no início do ano teve honras de dirigir, com Padilla e outros, o ciclo de novilhadas que se realizou no México - o que, por si só, diz bem do seu prestígio além-fronteiras.

Joaquim Ribeiro "Cuqui" explodiu no ano passado nas Caldas e este ano, nas apenas quatro vezes em que se apresentou em arenas nacionais, reafirmou ser um toureiro de raça, de valor e de muita arte. De quem muito se espera e que é já um nome consagrado.

António João Ferreira toureou uma única corrida em Vila Franca - e, como sempre, ninguém deu por isso que se trata de um matador mal aproveitado e demasiado injustiçado. Triunfou, como se estivesse toureadíssimo. É lamentável que não toureie mais e que os empresários o continuem a esquecer.

E João Diogo Fera tomou a alternativa em Espanha, passando a engrossar a lista dos nossos matadores. Não teve sorte em Vila Franca, triunfou na Azambuja, faltou a confirmação em Lisboa - que se espera venha a acontecer na próxima temporada. É um toureiro de arte e que marca a diferença.

Nuno Casquinha, que desde a pandemia deixou de fazer, como sempre fazia, a habitual campanha no Peru, toureou uma única corrida na "Palha Blanco" e a seguir anunciou que se retirava das arenas, certamente desiludido e desanimado com o panorama pouco optimista que se apresenta para o toureio a pé. Uma desistência que se lamenta.

No que aos novilheiros diz respeito, o maior nome é Diogo Peseiro, que este ano fez importantes progressos em Espanha e marcou uma posição em Portugal na corrida de Almeirim, onde alternou com António Ferrera. Será o próximo matador, é um toureiro completo, pode vir a ter uma importante palavra a dizer em Espanha. E cá também, obviamente.

João D'Alva debutou com picadores, triunfou na Azambuja, mas não toureou muito entre nós. Continua a ser, no entanto, uma esperança em que todos acreditamos.

Filipe Martinho e Sérgio Nunes passaram com dignidade pelo ciclo de novilhadas (louvável) que a empresa Ovação e Palmas levou a efeito em Maio na Azambuja. E Duarte Silva também, surpreendendo depois tudo e todos com o anúncio de que desistia da profissão.

Casquinha e Duarte Silva são os dois exemplos de quem muito lutou e a seguir desesperou, deixando de acreditar no futuro do toureio a pé em Portugal. A realidade é esta, na verdade. E eles não estão enganados. Valha-nos a vontade e a ilusão dos outros todos - porque com os empresários não vamos poder contar muito...

O toureio a pé continua a ser o parente pobre da nossa Tauromaquia. A persistência dos que se mantêm é de louvar. Pode ser que um dia isto mude. Haja esperança. O toureio a pé tem lugar e valores não lhe faltam.

Fotos M. Alvarenga, Carlos Silva, Sara Navarro e D.R.

Manuel Dias Gomes - um clássico, a magia do temple

Joaquim Ribeiro "Cuqui" - plástica, poderio, valor
António João Ferreira - que pena tourear tão pouco
João Diogo Fera - o novo matador
Nuno Casquinha retirou-se
Diogo Peseiro - a nova esperança
João D'Alva - às portas de dar o salto