A entrevista por que a aficion esperava.
João Oliveira, organizador da corrida que ontem "deu raia" e não se
realizou em Lousada (Porto), fala ao "Farpas" e dá a sua versão dos
factos, depois de ter sido acusado "de tudo e mais alguma coisa" e de
até andar a circular nas redes sociais um "cartaz", que ele atribui
aos anti-taurinos, onde se escreve que "é procurado". "Não fugi
de ninguém, pelo contrário, estive fechado dentro da praça cerca de três horas,
com o meu filho de doze anos e só não me mataram por milagre, fui salvo pela
GNR da ira popular e não fui eu o culpado", garante. Quem foi, então?
Oliveira acusa o apoderado Ricardo Levesinho e diz que vai avançar amanhã com
uma queixa-crime "por roubo" contra ele. E diz que também vai ter que
"acertar umas contas" com a Associação do Melão, que deu a cara pela
organização "e depois se descartou, deixando-me sózinho na cara do
toiro". Sobre o caso de Vizela, há três anos, fala também e diz que nunca
foi alvo de nenhum processo por parte da família da criança vítima de paralisia
cerebral, a favor da qual realizou essa tristemente célebre tourada. A versão
de João Oliveira, já a seguir.
- Circula um cartaz no
"Facebook" dando conta de que anda fugido depois do escândalo de
ontem em Lousada. Onde está?
- Estou em minha casa. Não fugi de
ninguém. Estive cerca de três horas "preso" dentro da praça, com o
meu filho de apenas doze anos. A minha mulher, grávida de sete meses, estavava
na rua, dentro do carro e tive que telefonar a um amigo e pedir-lhe que a
levasse a casa, para estar em segurança. No exterior da praça, o povo estava
revoltado e eu não fui linchado, não morri ontem, por milagre. Saí sob a
protecção da GNR. Agora, estão a crucificar-me na praça pública e a atribuir-me
todas as culpas. Reconheço que falhei em algumas coisas, que fui adiando os
pagamentos, mas porque me falharam a mim, mas as coisas acabariam por se compôr
se a corrida se tivesse realizado. Na hora em que o Ricardo Levesinho decidiu
ir embora e inviabilizou a realização da corrida, estavam na rua entre 60 a 70
pessoas para comprar bilhete e mais viriam certamente... Já me falaram desse
cartaz a dizer "Procura-se", com a minha fotografia, mas ainda não
vi. Deve ser obra dos anti-taurinos...
- Disse que lhe falharam. Quem?
- Primeiro a corrida ia ser dada em
parceria com a Comissão das Festas de Lousada, depois acabou por ser com a
Associação do Melão. Deram a cara como organização e no fim descartaram-se,
disseram que não tinham nada a ver e deixaram-me a mim sózinho na cara do
toiro. Mas isso é um assunto que me diz respeito e que eu vou resolver
pessoalmente com as pessoas da Associação do Melão...
- Mas é verdade ou não que ao longo do
dia de ontem foi adiando sucessivamente a hora do pagamento aos toureiros,
alegando que a Associação do Melão iria passar os cheques, que nunca
apareceram?
- Porque era isso que estava combinado,
mas, como lhe disse, o assunto com a Associação do Melão trato eu
pessoalmente...
- É verdade que perto da hora de início
da corrida pagou mil euros a cada cavaleiro profissional (Alberto Conde e Pedro
Salvador) e seiscentos euros à cavaleira praticante Verónica Cabaço?
- E também paguei 4.250 euros ao senhor
Agostinho Silva, proprietário da praça desmontável.
- Pagou esses valores aos toureiros por
conta de despesas que teriam tido na deslocação a Lousada, ciente de que a
corrida não se realizaria na mesma ou para que a corrida se realizasse?
- Não sou doido! Acha que ia ficar sem o
dinheiro e sem os toureiros? A determinada altura das atribuladas negociações e
quando se aproximava a hora de início da corrida, Ricardo Levesinho disse-me,
na presença de muitas testemunhas, entre as quais um agente da GNR, o director
de corrida Nuno Nery, o médico veterinário, o Miguel Malhoa (transportador dos
toiros), o Ricardo (cabo dos Forcados de Arronches), o bilheteiro Paulo e
outras pessoas que, se cada toureiro recebesse já mil euros, íamos com a
corrida para a frente e isso levaria a mais entrada de dinheiro na bilheteira e
no final acertavam-se as contas. E eu paguei de imediato mil euros a cada
cavaleiro e seiscentos à toureira praticante. Nesse momento, e também há várias
testemunhas disso, mal se viu com os mil euros na mão, o Ricardo Levesinho saíu
porta fora, mandou recolher os cavalos do Pedro Salvador e disse que não haveria
corrida. Os apoderados dos outros toureiros, o Inácio Ramos Júnior e o Pedro
Pinto, ficaram estupefactos, como todos ficámos. Aí, tive que suspender de
imediato a venda de bilhetes e também fiquei sem dinheiro para devolver às
pessoas que tinham já comprado os seus. A verdade é esta. Quem inviabilizou a
corrida, mais grave que isso, depois de ter recebido dinheiro e se ter
comprometido a que o seu toureiro toureava, foi o Ricardo Levesinho.
- Não é essa a versão que Ricardo
Levesinho conta...
- Pode contar as que quiser. Já falei
com o meu advogado e amanhã, segunda-feira, vou avançar com um queixa-crime na
GNR e no Ministério Público, por roubo, contra o Ricardo Levesinho. Roubou-me a
mim e roubou as gentes de Lousada.
- Não á a primeira vez que se mete
"numa alhada" destas, há três anos já houve o caso de Vizela...
- Disseram na altura, mas é mentira, que
os pais da criança a favor da qual realizei essa tourada em 2009 em Vizela, me
tinham processado em tribunal. Não houve processo nenhum porque não havia
matéria para me acusarem de nada. Se tive prejuízo, como é que poderia ter
lucro para lhes entregar a receita?
- É verdade que lhe adiantaram na altura
dois mil euros?
- É verdade. O pai da criança
adiantou-me esse valor, mas por que quis, não porque eu lho pedisse, para
ajudar às primeiras despesas. Não desminto, porque é verdade. Depois, a corrida
não deu lucro, pelo contrário, deu prejuízo. A Câmara de Vizela também se
comprometeu a apoiar e depois não apoiou. Tenho essa documentação toda do caso
de Vizela religiosamente guardada em minha casa. E ontem, posso também garantir
que não trouxe um cêntimo de Lousada e que também não fugi de ninguém. Pelo
contrário, paguei 4.250 euros ao dono da praça portátil e paguei 2.600 euros
aos toureiros, sob compromisso deles de que assim actuariam... fiquei sem os
toureiros e sem o dinheiro, impossibilitado de devolver o dinheiro dos bilhetes
às pessoas.
- Depois de os toureiros terem ido
embora, diz que ficou cerca de três horas "preso" dentro da praça.
Temeu pela sua vida?
- Já disse que sim. Foram-se todos
embora, fiquei eu, o meu filho e o casal de bilheteiros. Na rua, o povo estava
revoltado e com razão e se tenho saído porta fora linchavam-me, porque o
culpado diziam que era eu e só eu... Olhe, ainda esta manhã recebi uma mensagem
do cabo dos Forcados de Arronches a dizer que estava comigo e que eu tinha sido
enganado. Ontem, o director de corrida Nuno Nery teve um comportamento
exemplar. Toda a gente se predispõs a testemunhar em meu favor para aclarar a
verdade. O mau da fita não fui eu, é preciso que isso fique esclarecido.
Primeiro, a Associação do Melão descartou-se e fugiu às responsabilidades,
alegando que não tinha nada a ver com um espectáculo onde figurava como
organizadora... a seguir, Ricardo Levesinho propôs que se pagasse mil euros a
cada toureiro, comprometendo-se a que assim actuariam e, mal se viu com o
dinheiro na mão, pôs-se a andar e inviabilizou a realização da tourada, contra
a vontade dos outros apoderados e dos outros dois toureiros.
- Por que é que não foi com a corrida
para a frente com os outros dois cavaleiros, uma vez que estavam na disposição
de tourear?
- Essa hipótese chegou a ser
equacionada. Fazia-se um mano-a-mano entre o Alberto Conde e a Verónica Cabaço,
mas acabámos por desistir, até porque a rapariga não estava preparada para
tourear três toiros e isso compreende-se.
- Desiste de vez ou ainda pensa
organizar mais alguma tourada?
- Quis fazer esta, três anos depois da
de Vizela, precisamente porque sou aficionado e porque também queria limpar a
minha imagem depois de me terem denegrido da vez anterior. E afinal... Olhe,
falam muito dos anti-taurinos e em Lousada eles fizeram muito barulho contra a
tourada, mas nem isso os homens dos toiros tiveram em consideração. Cá para
mim, os principais e mais perigosos anti-taurinos são eles próprios, os que
estão no meio e que permitem que se dêm coisas como esta de ontem em Lousada.
Infelizmente, a verdade é essa.
- Quando, desde há uma semana, se
começaram a sentir os protestos dos anti-taurinos contra a corrida de Lousada,
sentiu algum apoio por parte das associações taurinas?
- Nenhum, absolutamente nenhum. Essa
gente só aparece lá para baixo, na Assembleia da República e nessas coisas, cá
em cima não existem, não se sentem... E esquecem-se que o Norte é um potencial
em termos do negócio tauromáquico. Ainda hoje, domingo, se realizam touradas na
Trofa e em Seia.
Fotos "JN" e D.R.