Os três grupos em praça no momento em que se anunciou o vencedor do Concurso de Pegas: houve palmas e protestos, para variar, dividiram-se as opiniões... |
Noite brilhante para os forcados alentejanos: grupo de São Manços executou as suas duas pegas à primeira tentativa |
A pega de Francisco Montoya, com reunião menos correcta, mas que teve algum aparato e acabou por vencer o prémio - sem, contudo, convencer... |
Miguel Alvarenga - Nem sempre o que
parece, é. E no mundo da tauromaquia, quando há prémios em disputa, raramente
existe consenso. Foi o que aconteceu ontem à noite no Campo Pequeno, quando e
apesar das más condições sonoras, se percebeu que o vencedor do Concurso de
Pegas fora Francisco Montoya, do Aposento da Chamusca (na foto ao lado, recebendo o troféu das mãos do empresário Dr. Henrique Borges), autor da última e rija
pega da noite a um toiro de António Charrua que, como os restantes, não
facilitou a vida, antes pelo contrário, aos valentes rapazes das jaquetas de
ramagens. Houve aplausos para o vencedor, vindos da larga falange de apoiantes
do grupo liderado por Pedro Coelho dos Reis (verdade seja dita, havia muitos
fãs do Aposento nas bancadas) e houve também sonoros protestos do público em
geral - a melhor pega, talvez mesmo uma das melhores dos últimos tempos e, sem
dúvida, até agora, a grande pega da temporada em Lisboa, fora a pega anterior,
ao quinto toiro da corrida, feita por esse enorme forcadão que é Nuno Marques,
cabo dos Amadores da Chamusca. Sem dúvidas nenhumas, o vencedor foi ele. Por
outras palavras: Montoya venceu, mas quem convenceu foi Nuno Marques.
A pega de Francisco Montoya (irmão do
antigo novilheiro, hoje peão de brega, Gonçalo Montoya) foi, sobretudo, uma
pega rija e dura, protagonizada por um jovem que se tem revelado nos últimos
anos e que, apesar do aspecto franzino e frágil, tem uns braços de ferro e uma
coragem de leão.
O toiro arrancou-se com a velocidade de
um comboio sem que o forcado tivesse mandado, esperado ou mesmo citado.
Arrancou-se e Montoya aguentou-se. Fechou-se mal na cara do toiro, ficou com
"uma perna de fora", foi recolocado pelos ajudas, que actuaram
oportunamente e a pega foi consumada. Daí a merecer o prémio...
A pega de Nuno Marques, pelo contrário,
foi outra loiça. O cabo dos Amadores da Chamusca esteve toureiro e sereno no
cite, fez-se na praça um silêncio de arrepiar, até que o toiro arrancou e Nuno
voltou a estar toureiro - enorme! - templando a investida, recuando como mandam
as leis, fechando-se com braços de ferro e aguentando barbaridades. O grupo
esteve pronto e coeso a ajudar, já bem perto das tábuas e o público levantou-se
em euforia. Ninguém mais pensou que houvesse pega igual - foi o que se pode
chamar uma obra de arte!- e que o prémio deste concurso "saísse",
como acabou por "sair", das mãos do valente Nuno Marques. Mas
depois...
A decisão do público - que não foi a do
júri, composto, dizem, porque mal se ouviu o que disse Paulo Pereira ao
microfone, por membros do Real Clube Tauromáquico (?) - estava tomada e Nuno
Marques foi calorosamente aplaudido na volta à praça que deu com o cavaleiro
Filipe Gonçalves. O respeitável queria-o só na arena, mas Nuno, com uma
humildade que só o engrandece, voltou a chamar o cavaleiro para com ele
repartir no meio da arena a estrondosa ovação que era, apenas e só, para si. A seguir,
recusou a segunda volta que lhe pediam - e que ele merecia.
De resto e àparte esta divisão de
opiniões que marcou o momento do anúncio do vencedor, o Concurso de Pegas
realizado ontem no Campo Pequeno foi, acima de tudo, um momento alto de
enaltecimento ao Forcado Amador, por obra e graça dos três grupos concorrentes,
que estiveram valentes e mesmo heróicos frente a toiros duros e difíceis da
triunfadora ganadaria de Charrua.
As duas pegas (primeira e quarta da
noite) dos Amadores de São Manços foram perfeitas. Brilhante, mesmo, a de
António Reis, a abrir praça. Rija e tecnicamente correcta a de Pedro Fonseca,
ambas ao primeiro intento, o que diz bem da triunfal passagem do grupo
alentejano pela arena de Lisboa.
Pelos Amadores da Chamusca, pegou em
primeiro lugar Luis Isidro, que concretizou a sorte à segunda tentativa com o
grupo a ajudar bem.
O Aposento da Chamusca não teve tarefa
fácil na sua primeira pega, ao terceiro toiro da noite. Há, não duvido, toiros
"impegáveis" e este era um deles - apesar de o grupo e o forcado da
cara, o cabo Pedro Coelho dos Reis, nem sempre terem estado bem. João Rui
Salgueiro foi o forcado inicial, mas recolheu à enfermaria depois de ficar
inanimado na arena. Foi dobrado pelo cabo, que foi literalmente
"cuspido" da cara do toiro em três ocasiões, algumas com enorme
aparato, acabando por pegar à quarta tentativa, a sesgo e nos moldes menos
apreciados de "todos ao molho e fé em Deus". Aplauda-se, contudo, por
que foi inteiramente merecedor de todo e qualquer elogio, a coragem, o
estoicismo e a vontade de dar o exemplo e salvar a honra do seu convento,
atributos defendidos com unhas e dentes por Pedro Coelho dos Reis, um grande
forcado. Obviamente que recusou a volta à arena - mas antes isso, do que o
toiro "ir vivo" aos currais, como por pouco esteve para suceder.
Em suma, frente a grandes e bons toiros,
houve ontem forcados enormes na arena do Campo Pequeno! Olé a todos!
Não perca, já a seguir, todos os
pormenores da corrida de ontem em Lisboa - uma reportagem de Miguel Alvarenga e
Fernando Clemente.
Fotos Fernando Clemente/cortesia
www.parartemplarmandar.com