Pedro Borges é o forcado (de Montemor) que na foto de cima se aproxima do toiro, anteontem no Campo Pequeno, procurando socorrer o irmão Francisco, desmaiado no chão depois de violenta colhida; e na foto ao lado, está com seu Pai, Francisco Borges, também ele antigo forcado dos Amadores de Montemor. O que a seguir vão ler - e que aqui transcrevemos com a devida vénia - foi o texto que deixou escrito no mural da sua página no "Facebook", sobre os momentos dramáticos que viveu na arena de Lisboa. Um depoimento comovente e emotivo - escrito por um homem com alma. Feito de outra fibra.
Muita é a controvérsia em torno das
Corridas de Touros à Portuguesa e sobre se devem ou não existir, desde já quero
deixar claro que não é minha intenção fazer qualquer tipo de propaganda a favor
ou contra a festa brava por isso aviso que qualquer comentário de mau gosto,
seja ele pró ou contra será imediatamente apagado.
Vivi ontem à noite no Campo Pequeno a
minha pior noite enquanto forcado do Grupo de Forcados Amadores de Montemor
dentro de praça, o meu irmão mais novo Francisco Maria Borges havia perdido os
sentidos ao tentar pegar o 5º touro da corrida, estava nesse momento
inconsciente e indefeso contra qualquer ataque do touro sem que ninguém o
conseguisse ajudar. Sem pensar corri para junto dele tentando levar o touro
para longe, acabei por eu próprio ser colhido pelo touro mas o importante é que
o meu irmão já estava fora de perigo.
Enquanto brigava para me ver livre do
touro passaram-me inúmeras coisas pela cabeça, "será que ele está bem...os
meus Pais estão na bancada a ver isto... espero que não lhe aconteça o que
aconteceu ao "Mata"... chega lá depressa ele precisa de ajuda e nem
sabe o que fazer...", tudo me passou pela cabeça menos o meu bem estar
físico.
Quando finalmente consegui chegar perto
do meu irmão ela já estava com varias pessoas à volta mas todos sem saberem bem
o que fazer, mas com a ajuda de alguns elementos do nosso grupo e do grupo de
Lisboa acabamos por conseguir mete-lo na maca e leva-lo para fora de praça.
Voltei para a arena pois tínhamos um
bravo oponente pela frente e tinha de ser pegado, valente e tigre o Frederico
Caldeira já estava de barrete na mão pronto para pegar o touro. Acabá-mos por
só conseguir consumar a pega ao terceiro intento depois de também o Fred ter
sido "sacudido" violentamente pelo touro na sua primeira tentativa.
Felizmente quando voltei a estar com o
meu irmão, já no hospital, apercebi-me que não tinha lesões graves. Hoje embora
bastante "amaçado" já esta bem e cheio de vontade de voltar às
arenas.
Não consegui explicar o sentimento que é
ver um irmão mais novo inconsciente com um animal bravo de 590kg em cima dele,
foi sem duvida a pior experiência que tive como forcado, os momentos entre
tirar o meu irmão da arena e voltar a estar com ele só posso descreve-los como
agonizantes.
Isto de ser forcado, para quem nunca
viveu este meio e não faz ideia do que é vestir uma jaqueta, tem muito mais que
se lhe diga do que ser "valente" e "destemido", ha até quem
nos chame inconscientes. Pois a verdade é que temos toda a consciência do que
nos pode acontecer e mesmo assim entramos para uma arena predispostos a
sacrificar o nosso bem estar físico e até mesmo a nossa vida, esta
predisposição é a prova de que somos feitos de outra fibra, uma fibra que
permite que aconteça o que aconteceu ontem e que hoje o Francisco esteja bem de
saúde, uma fibra que nos faz saltar para dentro da arena para enfrentar um
touro mesmo depois de vermos o que aconteceu a um amigo, como fez o Fred, uma
fibra que nos faz proteger qualquer um dos nossos irmão de jaqueta seja ela de
que ramagem for, como fizeram os elementos do grupo de Lisboa, uma fibra que
nos dá coragem para pormos o nosso bem estar físico em prol dos nossos
"irmãos".
Chamem-nos o que quiserem, mas uma coisa
é certa desta fibra só nós somos feitos e doa a quem doer a verdade é que os
que estão de fora nunca saberão o que é vestir uma jaqueta e pertencer a esta
irmandade.
A todos aqueles que vestem ou já
vestiram um dia a jaqueta de um grupo de forcados, o meu bem haja!
Pedro Borges
Pedro Borges
Fotos Maria João Mil-Homens e D.R./@Pedro Borges/Facebook