A ti, António!
António, custa-me ter de te escrever,
desta maneira, sem ter palavras e muito menos vontade. Conheci-te há mais de 20
anos, era eu um miúdo e tu um jovem aficionado, relações públicas e moço de
espadas do teu amigo de sempre, Rui Bento! Ficava contente quando recebia uma
carta tua (na altura não havia e-mails e muito menos enveredaste por isso) a
reportar os êxitos do Rui e sempre acompanhado com uma foto dele em ombros ou
com as orelhas na mão; recebia e divulgava no Jornal Fundamental e na Rádio
Ribatejo; com 16 anos de idade, fazias-me sentir importante!
Na noite de sexta-feira, quando
perguntei por ti ao Maestro Bastinhas (como carinhosamente o tratavas), senti-o
tenso, respondeu-me sem o seu sorriso habitual e com ar preocupado, "não
sabemos, saiu de casa para vir para a Póvoa, mas não apareceu"; tal como
ele, temi o pior, mas guardei para mim, como tu sempre fazias quando estavas
preocupado. Não me passava pela cabeça e muito menos não queria acreditar que o
pior podia ter acontecido, mas tinha de ter acontecido alguma coisa, pois não
eras homem de faltar aos teus compromissos!
Da corrida das Entradas por volta da
1h30 da manhã surgiu uma notícia mais preocupante ainda... o teu jipe tinha
sido encontrado e o coldre da pistola vazio... Voltei a não querer ver o que
estava na cara. Só de madrugada, quando soou o telefone e um amigo comum me
ligou a chorar, senti que estava consumada a tragédia.
António, ainda agora não acredito que
puseste termo à vida, ninguém diria que farias isso e só uma razão muito forte
que respeito, mas não entendo, poderia ter levado a tal fim. Eras dos bons,
tivemos as nossas "guerras", mas com respeito um pelo outro, pois as
opiniões são sempre respeitáveis, mesmo que sejam diferentes. Tanta vez adiámos
o nosso almoço, que agora já não será neste mundo, mas sim no local sagrado
onde decerto te encontrarás. Um dia António, um dia!
Hoje recordei tanta coisa, tanta
história, tantos momentos; recordei aquela tarde na tua casa em Vilar Formoso,
onde estive com os meus pais, contigo, com a tua esposa, com o Joaquim
Mesquita, com o João Pedro Pires... recordei as minhas idas com o Lourenço
Mourato (irás encontrá-lo por aí certamente) a Nave de Haver e sempre o bem que
nos recebias!
Recordei todos os bons momentos, as
conversas aficionadas, o carinho que tinhas pelo Rui Bento e mais recentemente
pela casa Bastinhas, a ilusão que tinhas pela carreira do Marcos e o respeito
pelo Maestro Bastinhas. A festa de toiros está muito mais pobre, perdeu um
taurino e um grande aficionado.
Podia estar a noite toda a escrever, só
coisas boas, porque as menos boas já foram esquecidas; mas não tenho palavras,
não tenho ganas e muito menos vontade.
Respeito-te António, supostamente assim
quiseste, mas vou ter saudades que me atendas o telemóvel e digas "Ó Pedro
tás bom?"
Até um dia amigo!
Pedro Pinto
Fotos D.R. e @Joaquim Bastinhas