Em Março de 2011 terminei a minha pena
(por um "crime" de "abuso de liberdade de expressão"
motivado por um artigo que não escrevi, mas que assumi como director do jornal
"Farpas", não denunciando o seu autor) de 54 fins-de-semana na cadeia
do Linhó. Na altura, os meus companheiros de jornal fizeram-me uma surpresa e
encheram duas páginas da edição dessa semana com artigos de amigos e familiares
para assinalar a minha libertação e o final do cumprimento da pena. Houve dois em
particular que me tocaram. O da minha querida filha Maria Ana e aquele que o
meu Pai escreveu e que hoje, quando se assinala o 30º dia da sua partida, aqui
quero recordar e partilhar com todos. Foi assim:
Meu bom, meu querido, meu filho muito
amigo, Miguel
Escrevo-te hoje e só hoje, porque como
sabes, nunca escrevi ou tive interferência nos teus jornais. Mas, hoje, escrevo
para te falar de um facto que estás farto de conhecer, a solidarieadade, nunca
é demais falar sobre este tema e a verdade é que, ao inscrever a mensagem que
quero deixar-te, relevo, arrumo e questiono as minhas ideias.
Com efeito já
percorreste todos os caminhos normais, começaste muito cedo, muito cedo te
tornaste um Homem. Lembro-te miúdo, no liceu D. Leonor, em Lisboa, lutando com
2 ou 3 amigos, contra infâmias e ideias subversivas que alguns marxistas,
queriam inculcar nos miúdos e mais tarde, na Universidade.
Lutaste, com perigo,
integridade, ousadia e algum sofrimento, contra tudo e contra todos. Venceste
na execução dessa tarefa difícil.
Neste momento, terminas uma pena de prisão a
que foste inocentemente condenado, pagando presumíveis erros cometidos por
outros que, com a dignidade por serem teus colaboradores, teus dependentes, tu
quiseste assumir.
É, por isso, altura de demonstrar publicamente o meu apoio e
solidariedade perguntante, todavia, que mal tens feito ao mundo para a
aplicação de tal justiça, para a injustiça resposta a um caduco delito de
imprensa?
Pagaste... e bem, dirá, sem acreditar, a juíza! O preço esse, vai
fazer parte da tua vida e também da minha. Fazes-me lembrar a caneta em prata
que me ofereceste com a inscrição "aos seus 80 anos de luta". Este
preço é, para mim, mais duro, porquanto não consegui auxiliar-te no combate que
desenvolveste contra essa injustiça. Acompanhou-me sempre, porém, o
conhecimento que tinha do teu ânimo, da tua coragem, da tua força moral face às
tarefas difíceis em que foste envolvido.
Perseguia-me a angústia, porém, não
quis que tomasses consciência dela. Soube, sempre que ias reagir bem.
"Talent de bien faire" transmitido, não se esquece facilmente...
Como
já disse, tenho acompanhado a honestidade, o carácter, toda a dignidade com que
tens vivido e sobrevivido à tua transformação plena num Homem sério.
Todos
desejamos agora, renovada força, saúde e o dileto acompanhamento dos teus
filhos.
Agradecendo a solidariedade manifestada por todos os teus amigos, um
abraço bem apertado do
Pai
Foto D.R.