segunda-feira, 4 de julho de 2016

A reconquista de Vila Franca por Moura, o Grande

Patrícia Sardinha, a directora do site naturales.com, assistiu à corrida na bancada
e ninguém se lembrou de a brindar, de a saudar... numa tarde que se anunciava
comemorativa dos 15 anos da fundação daquele site... É pena que por aqui as
coisas se continuem a passar assim, não é?...
Por que é que não se valoriza o nosso Campino, o folclore, o fandango...
... em vez desta saloia espanholice das, ainda por cima falsas, sevilhanas?...
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António Ribeiro Telles é e será sempre o toureiro da "Palha Blanco". E ontem
uma vez mais o disse
O sentimento, a arte, a garra e a força de João Moura Júnior conquistaram por
fim os afectos de um público que nunca olhou com bons olhos para a arte
vinda das terras de Monforte. Mas desta vez foi, algum dia tinha que ser!
Bonitos e artísticos detalhes de Dias Gomes com o capote
Cláudio Miguel brilhou com as bandarilhas. Ele e João Ferreira
foram calorosamente aplaudidos de montera em mão
Manuel Dias Gomes bem quis, mas tourear bisarmas de 4 anos e 600 quilos
sem picadores não faz sentido nenhum...


Miguel Alvarenga - Deus põe, o homem compõe e o toiro descompõe. O toureio a pé não deu ontem nenhum passo em frente, antes pelo contrário, na tradicional corrida mista do Colete Encarnado, em Vila Franca de Xira, onde o nosso novo matador Manuel Dias Gomes se apresentava como tal na "Palha Blanco"... mas diante toiros impróprios para brilhar.
Já aqui referi hoje, mas repito: o toiro-bisarma com 600 quilos foi uma inovação criada nos anos 80 quando os forcados se tornaram empresários. Faz parte do espírito de "porrada p'ra diante" que norteia o critério empresarial de quem pegou toiros. Mas que não permite, à partida, um espectáculo aprazível e muito menos um sucesso para os toureiros, não apenas a cavalo, mas sobretudo a pé. Falta mobilidade aos toiros, sobra desconfiança aos toureiros.
Enfrentar a pé toiros com quatro anos (a idade pesa muito mais que o peso) e 600 quilos, sem serem picados, é quase o mesmo que andar de olhos vendados a atravessar a Avenida da Liberdade para cá e para lá, à espera que um autocarro nos passe a ferro. Não tem lógica, não faz sentido, chega a ser um disparate.
Manuel Dias Gomes é um toureiro de valor, com uma arte infinda e que ontem pouco pôde mostrar. Esteve valente e esteve decidido, demonstrou afirmação e muito querer, mas andou a tarde toda a defender-se de toiros que não lhe deram opções para nos encantar com a sua muleta habitualmente mágica. Sem ovos nunca na vida se fizeram omeletas...
Extraordinários pares de bandarilhas de Cláudio Miguel e João Ferreira, que agradeceram de montera na mão calorosas ovações do público.
O calor apertava ontem e a praça de Vila Franca registou pouco mais que meia casa. Acto heróico estar ao sol...

Os tempos mudam, as vontades também

Também com toiros de Ribeiro Telles para a lide a cavalo - Murubes com imenso trapio, que até permitiram boas actuações, mas que transmitiram pouca emoção - a tarde de ontem ficou marcada, sobretudo, pela entrega da aficion vilafranquense ao toureio mourista, depois de muiros anos, quase quarenta, de costas viradas uns para os outros. João Moura nunca teve "boa praça" em Vila Franca. A maior parte das vezes em que ali actuou, ainda vinha em Samora, costumava dizer-se, e já o estavam a assobiar na "Palha Blanco"...
Ontem, por obra e graça da maestria e do momento enorme que atravessa João Moura Júnior, o público de Vila Franca rendeu-se por fim ao toureio mourista. Um toureio genial, de temple, de ousadia e de bom gosto. De risco e de verdade, também - e em particular.
Mourinha trazia essa pedra no sapato e é natural que assim fosse. O pai nem ali estava, acompanhava ontem o Miguel numa corrida em Espanha. João estava só, com os amigos, a quadrilha, o apoderado Rui Bento - e com um público qaue tinha os olhos postos nele. Tudo podia acontecer. Valeu o seu valor, as suas ganas, a sua garra. Ao terceiro ferro, tinha Vila Franca na mão, rendida, a seus pés. Acontece aos bons toureiros. Nunca aconteceu em tantos anos com João Moura, contra o qual houve sempre, à partida, uma má vontade. Mas os tempos mudam - e as vontades também, já dizia o grande Camões.
Ontem, João Moura Júnior conquistou Vila Franca, onde se apresentava pela primeira vez desde que decidiu fazer história nas arenas, pelo seu tremendo velor, pelo seu conceito de lidar, pela excelente qualidade da sua quadra de cavalos, pelo modo como toureou, como foi de frente aos toiros, como arrepiou tudo e todos, como se recriou em remates de uma arte sem fim. Já era sem tempo! Brindou o primeiro toiro à memória de Mestre David R. Telles e ao público e o segundo ao matador Luis Vital "Procuna".
António Ribeiro Telles é, indiscutivelmente, o toureiro da "Palha Blanco" - e ontem voltou a reafirmar esse estatuto único com duas lides de muita alma, de total entrega e que resultaram em cheio. Boas preparações, o saber eterno na escolha de terrenos e na forma de lidar, nos ferros ao estribo como ensinam os livros e ele sempre executou da mais clássica das formas.
Os Forcados de Vila Franca tiveram uma tarde de triunfo (ver reportagem anterior) marcada pela despedida de Ricardo Patusco, que pegou à primeira o quarto toiro da corrida com a técnica e o brilhantismo que sempre estiveram a seu lado em quase vinte anos de gloriosa carreira. As restantes pegas foram executadas por Rui Godinho (à segunda), Gonçalo Filipe (à primeira) e David Moreira (à segunda), sendo de inteira justiça destacar a eficiência com que Carlos Silva rabejou.
Rogério Jóia foi o director da corrida, assessorado pelo médido veterinário Dr. José Manuel Lourenço. Mandou recolher o terceiro toiro, mal visto, já depois de ter levado uma bandarilha - e devia ter-se decidido antes a fazê-lo. Depois, deu música a Dias Gomes, o público protestou e mandou calar a banda, voltando mais tarde a ordenar que tocasse. Enfim. O público de Vila Franca é diferente, às vezes conflituoso e há que ter muito saco para lidar com ele...
Ao início da corrida guardou-se um minuto de silêncio em memória dos cavaleiros Mestre David Ribeiro Telles e José Zúquete, recentemente desaparecidos.

Ninguém se lembrou do site...

Ao intervalo, gramámos (é o termo, façam a fineza de me desculpar) a actuação das sevilhanas vilafranquenses, que até se deram ao luxo de bailar, como primeira música, um bonito fado, como se uma coisa tivesse alguma coisa a ver com a outra... E porquê sevilhanas, falsas ainda por cima? Porque raio continuamos eternamente a defender a estúpida (irracional, pelo menos) tese de que "a galinha do vizinho é sempre melhor que a nossa"? Em vez deste triste espírito espanholista, não seria muito melhor, para mais numa festa tão portuguesa dedicada ao emblemático homem da lezíria, valorizar os nossos Campinos em vez das bailadoras espanholadas, trazendo por exemplo um momento de fandango e de folclore? Para a próxima, Paulo Pessoa de Carvalho, aqui fica a sugestão.
Ah, faltava esta nota: a corrida de ontem, assim o anunciavam os cartazes, era também para assinalar o aniversário (15º) do site naturales.com. A directora do mesmo, Patrícia Sardinha, assistiu à corrida numa quarta ou quinta fila do sector 1. Não houve ninguém, nem que fosse um varredor da arena, que se lembrasse de lhe acenar, de a brindar, de fazer lembrar a efeméride que ali se comemorava e de que ninguém se lembrou ou sequer deu por ela. É pena que as coisas aconteçam quase sempre assim...

Fotos Emílio de Jesus/fotojornalistaemilio@gmail.com