Francisco Palha por ele próprio em grande entrevista ao “Farpas” no final de uma temporada em que foi um dos cavaleiros mais destacados, dando finalmente o salto por que se esperava há algum tempo. Chegou a sua hora. Foi um triunfador nato e está para dar e durar. Sem hesitar, com a mesma verdade e a mesma frontalidade com que toureia, respondeu a todas as perguntas e confessou mesmo alguns segredos. Quer em 2018 tourear um mano-a-mano com o primo João Telles em Vila Franca com toiros Palha. Nem o apoderado Rafael Vilhais, que o será “para a vida”, ainda tem conhecimento desta sua intenção. Vamos ouvi-lo.
Entrevista de Miguel Alvarenga
- 2017 foi o ano do teu salto, Francisco?
- Não lhe consigo responder a isso Miguel, penso que a idade nos vai amadurecendo, nos vai dando tranquilidade, para pouco a pouco e dia a dia irmos conseguindo resolver os nossos problemas, os nossos medos, inseguranças e, acima de tudo, nos definir. Foi um ano que pude nalguns dias expressar o tipo de toureio que sinto, que me apaixona e que me tira o sono! Tive a sorte, graças a Deus, de poder tourear quatro ou cinco toiros que me ajudaram bastante nesse sentido. Penso que tourear a cavalo é o mais bonito que posso fazer na minha vida!
- Que balanço fazes?
- Considero que o balanço da temporada é bastante positivo. Graças a Deus e ao trabalho do Rafael, meu apoderado, fomos toureando em todas as feiras boas e as coisas foram resultando, uns dias melhor, outros dias não tão bem, mas penso que houve sempre alguma coisa, que nos (minha equipa e a mim) deixou contentes e satisfeitos! Ora fosse por cavalos estreados, ora fosse por uma bandarilha das tais, ora fosse uma lide completa, o balanço penso que é muito positivo! Mas é-me difícil falar de mim, sei o que gosto ou não gosto, mas falar de mim e avaliar-me não me compete a mim fazê-lo…
- Terminaste em Évora a temporada com uma actuação de que ainda hoje se fala. Que outros êxitos recordas deste ano?
- Houve bastantes corridas que recordo, recordo a da Ovibeja este ano, o Concurso de Ganadarias em Salvaterra, onde estive a ponto de perder a perna e mesmo assim toureei o segundo toiro, houve Vila Franca, a Feira da Moita, Alcochete e Lisboa, sem ser uma noite redonda! Penso que de cada uma se pode tirar tanto coisas boas, como coisas más… a minha preocupação é melhorar dia a dia.
- E que balanço fazes da tua trajectória, desde a aprendizagem de alguns anos com Ventura até aos dias de hoje?
- A minha aprendizagem! Que lhe digo, Miguel?… até me vêem as lágrimas aos olhos. Infelizmente, poucos acreditavam em mim como toureiro ou cavaleiro. Tornou-se tudo mais difícil, a época em que vivemos não ajuda, mas Deus Nosso Senhor ilumina a minha vida sempre e deu-me uma família que adoro! Pôs-me amigos de verdade ao lado (não falo em nomes) e pôs-me uma segunda família na minha vida, por mim fizeram muito e eu por eles. A Família Ventura, a forma como tudo fizeram, a forma como sempre me tratam, a forma mútua como nos adoramos. É algo que vai ficar sempre comigo! Deixei tudo em Portugal e iniciei uma aprendizagem em casa de Diego, foram dez anos que nunca vou esquecer. E este momento que vivo, a montar, a tourear, devo-o ao Diego e a seu pai. Hoje em dia, apesar de viver em Portugal, os ensinamentos continuam! Graças a esses ensinamentos tive a honra de tourear em Sevilla quatro anos seguidos, três em Madrid, Zaragoza, Ronda, Lisboa, etc. Muitas experiências que só quem as vive pode sentir. Tem sido um percurso passo a passo, sem pressa e penso que com boas bases. O caminhos faz-se caminhando e só espero ter a capacidade de ir aprendendo tudo o que me vão ensinando, pois de todos devemos tirar e aprender as coisas boas!
- Não há hoje ídolos para encher praças, como havia antigamente - é um facto, apesar de haver bons toureiros. O que te falta para ser um ídolo?
- Não sei o que me falta para ser um ídolo, sei que adorava um dia poder tourear em praça como toureio em casa, adorava poder transmitir algo para as bancadas que as faça vibrar não só de emoção, mas também de sentimentos. Penso que para se ser um ídolo não é só com emoção, tem de ser uma mistura de sentimentos e emoção! Não me preocupo muito em ser ídolo, preocupo-me, sim, que o público goste de me ver tourear e me vá ver, e que nunca os entristeça com o tipo de toureio que tento fazer.
- Há corridas a mais? Devia haver menos?
- Considero que existem corridas a mais, sim. Penso que deveriam existir menos e em datas propícias, pois hoje em dia, devido à época que vivemos, não é fácil a muitas famílias ir aos toiros. Defendo que deve haver mais união entre todos e tentar chegar-se a algo bom para a Festa, tarefa bastante complicada, pois todos querem o melhor para si. É um tema delicado onde não posso opinar muito, penso que nós, mais novos, temos é de estar preocupados em dar o melhor na praça!
- O que pensas da crítica? Costumas lê-la toda?
- Em relação à crítica, costumo ler e tentar pôr-me do outro lado para tentar perceber o que não gostaram ou gostaram. Muitas vezes lemos coisas que não gostamos, mas temos de estar preparados para ouvir todos os tipos de crítica, seja boa ou menos boa. Penso que a crítica, muitas vezes, pode ter várias interpretações e daí haver muitos pontos de vista diferentes. E gostava de aproveitar para convidar toda a crítica, imprensa taurina, a virem este inverno cá a casa e experimentar tourearem a cavalo! Eu tenho imenso gosto nisso! Para poderem sentir algumas sensações diferentes…
- Quem foram ou são os teus ídolos no toureio a cavalo?
- Tenho tantos ídolos! O meu maior ídolo da actualidade é o Diego Ventura! Mas tenho vários ídolos mais, João Moura, António Telles, João Salgueiro, Pablo Hermoso, Rui Fernandes, a classe de Ana Batista. Como lhe disse antes, penso que de todos devemos tirar as coisas boas que cada um tem.
- Rafael Vilhais é o apoderado para a vida?
- Rafael é o meu primeiro e único apoderado até aos dias de hoje. Acima de ser meu apoderado, é meu amigo, às vezes não é muito presente, mas é um grande amigo para a vida e apoderado espero que também o seja. E espero que ele ande sempre ilusionado comigo e que acredite mais ainda naquilo que podemos fazer juntos. O caminho faz-se caminhando e com altos e baixos, o Rafael tem-me acompanhado sempre, espero que assim continue.
- Espanha já não está nos teus horizontes?
- Espanha claro que está nos meus horizontes, mas estes dois anos anteriores optei por não ir, pois só toureei com cavalos novos todos postos por mim e quero primeiro confirmar os cavalos e depois então ir lá com a mesma categoria que deixei quando vim.
- Tens a quadra ideal?
- Não tenho a quadra ideal, nem pensar, tenho a quadra que posso, que num ano consegui pôr a tourear, batalho todos os dias para ir melhorando os cavalos e preparar cavalos novos, para todos os anos sair em quatro ou cinco cavalos novos. Graças a Deus tenho conseguido, penso que nunca existe uma quadra ideal, pois queremos sempre mais e melhor! Tanto de nós, como dos cavalos, seja em cavalos novos, seja em cavalos mais veteranos. Nunca descansamos a pensar em mais cavalos…
- Que sonhos por alcançar?
- Muitos sonhos por alcançar! A minha vida tem sido feita em prol de um sonho que é ser toureiro! Todas as metas e objectivos são sonhos diários, até um dia os atingir.
- Se mandasses, o que mudavas na Festa?
- Se mandasse na Festa tentaria pôr todos os que estamos dentro dela de acordo, de modo a haver união… e não esta desunião que existe…
- O toiro-toiro ou o toiro Murube?…
- Penso que o toiro ou é bom ou é mau, seja ele toiro-toiro ou seja ele Murube! Quando são bons, dá igual que seja Murube ou seja toiro-toiro, desde que transmita emoção para a bancada, que é o importante para a Festa. É lógico que existem muitos toiros de encaste Murube que não transmitem o mesmo que o dito toiro-toiro, mas muitas vezes pode-se fazer um tipo de toureio ao Murube que não se faz ao toiro-toiro, daí dizer que seja de que forma for, ou pelo toiro ou pelo tipo de toureio, o importante é existir emoção.
- Perspectivas para a campanha de 2018…
- As perspectivas para 2018 estão a ser delineadas com o Rafael e penso que pode ser uma temporada marcante. E digo-lhe já em primeira mão e nem com o Rafael falei sobre isso, que adorava tourear um mano-a-mano com o meu primo João Telles Júnior em Vila Franca com uma corrida de Palha! Sei lá, temos tanto para falar, para delinear, existem muitas coisas faladas, muitas coisas por falar, vamos ver…
- O que te levou a ser toureiro? Tiveste o apoio de teus pais?
- O que me levou a ser toureiro foi, em primeiro lugar, ter nascido no campo e ter o privilégio de privar desde pequeno da vida de campo, toiros, cavalos, o meu pai foi forcado no grupo de Santarém, os primos Telles toureiros, penso que não foi difícil ter enveredado por este caminho! Desde pequeno que toureio, o caminho tem sido duro e os pais apoiam! E penso que com trabalho e constância no trabalho tudo chega um dia, assim tenhamos fé e a sorte nos acompanhe.
- Ser toureiro é…
- Ser toureiro é o que me faz feliz!
- Que figura pública convidavas para jantar? Porquê?
- Convidaria o Professor Marcelo Rebelo de Sousa, nosso presidente da República, porque gostava de perceber um pouco mais sobre o que realmente poderia ser mudado no nosso país para sermos um país melhor!
- Quem é e como é o Francisco Palha no dia a dia?
- Sou um lutador, um homem de fé,um homem amigo do seu amigo e que sonha fazer as pessoas felizes com o seu tipo de toureio! Como sou no dia-a-dia?… Tenho péssimo acordar, tenho mau feitio, sou um perfeccionista, sou alguém que adora a verdade e os meus amigos. Penso que isto é o básico, Miguel, não posso ser eu a avaliar-me a mim mesmo… sou uma pessoa espontânea, é normal com qualquer pessoa! Tenho milhares de defeitos… e rezo todos os dias para ser melhor!
Fotos D.R., Pedro Batalha e Tiago Caeiro/@Francisco Palha