Miguel Alvarenga - Os portugueses, como eu, que ontem votaram em André Ventura, expressaram acima de tudo um voto no projecto Chega, um voto de protesto pela mudança, muito mais que um desejo de ver o líder do partido no Palácio de Belém. O seu lugar não é aí.
Foi, acima de tudo, um voto de revolta contra mais de 40 anos de descalabro, contra este (des)Governo e também, um pouco, um voto dos decepcionados que viram Marcelo na segunda fase do seu mandato como um refém de Costa, um "yes, minister" do primeiro-ministro.
Mas mais do que um voto contra Marcelo - que, dos sete, reconheço que era o único com carisma para ser Presidente da República, contra factos não há argumentos - o voto em André Ventura significou ontem um voto, repito, no projecto Chega. E hoje é precisamente o primeiro dia do resto da vida do novo partido, rumo às legislativas.
Ventura é claramente um dos grandes vencedores das eleições de ontem. Ficou em terceiro lugar a um ponto de percentagem de Ana Gomes. A esquerda-caviar (Bloco de Esquerda) e a esquerda-que-já-não-se-usa (Partido Comunista) sofreram a maior derrota de todos os tempos, dir-se-à mesmo que foram pela pia abaixo.
Marisa Matias e o seu Bloco já não contam para o campeonato. João Ferreira foi, a meu ver, um bom candidato e perfila-se agora como futuro líder de um PC provavelmente mais moderno e mais adaptado aos tempos que correm. Não podemos esquecer que os autarcas comunistas foram sempre acérrimos defensores da tauromaquia.
Tiago Mayan, o candidato da Iniciativa Liberal, não conseguiu fazer passar a sua mensagem. Ana Gomes fica muito melhor e muito mais útil ao país na sua luta anti-corrupção, depois do amargo de boca que significou o facto de não ter conseguido levar Marcelo a uma segunda volta, como desejava. Tino de Rans é o retrato fiel do nosso povo, alegre e contente, homem de bem, ingénuo, mas sempre feliz.
André Ventura é o líder da mudança. Conseguiu fazer desabar o Partido Comunista em todas as suas históricas muralhas alentejanas. O próprio Rui Rio reconheceu que desde o 25 de Abril o PSD nunca conseguiu bater o PC no distrito de Setúbal - e Ventura bateu-o ontem.
A meu ver, o mais importante do discurso de Ventura foi ter mandado ao PSD o recado de que não haverá Governo sem o Chega e foi também ter tido a coragem (é coisa que não lhe falta) de ter posto em causa as empresas que fazem sondagens e quase nunca acertam.
Não me incomoda nada que Marcelo tenha sido reeleito. Antes pelo contrário. Era e é, de todos os candidatos, o único com perfil para ser Presidente da República, para representar Portugal além-fronteiras. Não superou as históricas vitórias de Mário Soares e de Ramalho Eanes, foi eleito com 60,7% (de menos de metade do país, com uma abstenção acima dos 60%) e todos esperamos agora que o segundo mandato seja melhor, que Marcelo não continue a reboque de Costa - e que finalmente arranje tempo para um dia assistir a uma corrida de toiros em Lisboa...
Fotos M. Alvarenga