"Manolete" no hotel, na tarde da cornada fatal em Linares |
"Manolete" no quarto de hotel, preparando-se para o encontro fatal com "Islero" |
Correram mundo as fotos de Cano da morte de "Manolete" em Linares (1947) |
Apesar da rivalidade que ao tempo protagonizavam "Manolete" e Dominguín, nenhum outro repórter fotográfico, à excepção de Francisco Cano (na foto à esquerda, que hoje completa 99 anos de vida), marcou presença na praça de toiros de Linares naquela fatídica tarde de 28 de Agosto de 1947, em que o "Monstro de Córdoba" foi morto pelo toiro "Islero", da ganadaria Miura. Nesta interessante entrevista ao jornalista Pepe Castillo, Paco Cano recorda esse dia em que se tornou famoso por conseguir as únicas fotos da morte de "Manolete" - que deram a volta ao mundo.
- Como viveu aquela tragédia?
- Tive a sorte e a desgraça de presenciar a morte de "Manolete". Naquela tarde, passei a visitá-lo no seu quarto de hotel. Era um encanto de pessoa, amável e respeitador, embora a verdade é que, animicamente, não andava bem porque estava com problemas familiares, a maior parte deles devido à sua relação amorosa com a actriz Lupe Sino, de a mãe do toureira, Dona Angustinas, não gostava nada...
- Que se passou naquela fatídica tarde?
- Tourevam "Manolete", Gitanillo de Triana e Luis Miguel Dominguín, em cuja casa eu tinha sido criado. Nessa tarde fui a Linares porque tinha que cobrar a Dominguín uma reportagem fotográfica, se não fosse por isso, eu não teria estado ali. "Manolete", em vez de entrar a matar pela sorte natural, entrou pela sorte contrária e muito devagar, o toiro agarrou-o pelo músculo da perna e quando ele caíu e abriu as pernas, sangrava abundantemente. Posteriormente, na enfermaria, ajudei o Maestro no que pude, mas havia demasiada gente, basta dizer que da primeira vez que o deitaram na marquesa, caíu ao chão, porque a cama não estava devidamente preparada e tiveram que o passar para outra. Eu tinha a roupa de "Manolete" nas mãos, a primeira transfusão que lhe fizeram foi de sangue do cabo da Polícia local, a seguir foi de González Parrao, que ia debutar com ele em Madrid. Tive que sair, porque me estava a sentir mal, disse a Jesús, moço de espadas de Domingo Ortega, que me chamasse caso "Manolete" morresse. O seu estado não fazia prever recuperação alguma. Dez minutos depois, chamaram-me. "Manolete" tinha morrido. Fotografei-o com pano a tapar o rosto e sem pano. Foi impressionante. Reparei que debaixo da cama havia sangue, que tinha passado pelo colchão.
- E as famosas fotos da colhida que tirou?
- Quando morreu "Manolete", falou-me Lupe Sino para me comprar as fotos, mas eu disse-lhe que não as vendia. Quando cheguei a Madrid, esperavam-me muitos jornalistas, pois eu era o único que tinha fotos da colhida mortal. Houve grande pressão do Regime, quiseram proibir a publicação das fotos. Entreguei o assunto nas mãos de um advogado, Berbell Cano, um dos melhores, mas que era demasiado "vermelho" e começou todo o mundo a dizer-me que se me metia com o Regime estava arruinado. Acabei por não fazer nada com o advogado... e só acabei por publicar as fotos já nos anos 70!
- Ainda guarda alguma foto inédita dessa tarde?
- Sinceramente, nem sei. De vez em quando, vou sacando fotos de uma caixa onde as guardo, para exposições e lá aparece uma ou outra de que não me lembrava. É possível que ainda tenha fotos da morte de "Manolete" que nunca foram divulgadas...
Fotos Paco Cano e D.R.