quinta-feira, 30 de junho de 2016

Évora: São Pablo esgota em noite de São Pedro, Moura recua 30 anos e Telles assume liderança do pelotão

O tempo voltou para trás e João Moura ontem deu mais duas enormes lições
galvanizando o público como nos tempos de ouro
A classe, o nível e a arte de Pablo Hermoso de Mendoza continuam a marcar
a diferença. Ontem, o difícil pareceu fácil...
João Ribero Telles está a assumir esta temporada a liderança do pelotão e ontem
em Évora voltou a reafirmar a intenção de se manter na frente com duas lides
que em diversas ocasiões fizeram levantar o público das bancadas


Miguel Alvarenga - Não é preciso ser um génio para “salvar a Pátria”. As touradas, estou farto de o escrever e ainda me chamam nomes, estão como estão (mal) porque faltam ídolos, porque não há toureiros que arrastem público às praças, porque isto caíu numa maçadora e sempre igual monotonia onde nada se passa e onde é tudo sempre a mesmíssima coisa. Cartéis “mais-do-mesmo” não levam ninguém às praças - e o estranho é que, não se dando conta disso, os empresários (mais pseudo, que propriamente empresários) vêm depois queixar-se da crise (qual crise?) e procurar inventar mil justificações para justificar o que não tem, afinal, justificação.
Ontem em Évora, fosse ou não fosse a data tradicional do São Pedro (já vi muitas corridas destas sem ninguém na bancada…), era noite de São Pablo Hermoso de Mendoza e isso, doa lá a quem doer, é mais que suficiente para encher uma praça. Pablo é, ainda e sempre, o toureiro mais taquillero em Portugal, aquele que tem maior força de bilheteira e que mais gente arrasta a uma praça. Por mais caro que custe, será sempre o mais barato de todos os toureiros - porque enche. Ontem, esgotou. Como se vê, não é assim tão difícil encher uma praça. Aconteceu recentemente no Campo Pequeno. Voltou a acontecer ontem em Évora. A formula não é mágica e tem um nome: Pablo Hermoso de Mendoza.

"Nené" e a arte de fazer diferente...

Ontem, o empresário António Manuel Cardoso “Nené” excedeu-se. Montou um cartel altamente apelativo e competitivo, chamou a Évora a sabedoria e a maestria de João Moura para se vir bater de igual para igual com a genialidade de Hermoso; e chamou também o jovem Telles, João, que é, apenas e só, no momento actual, o cavaleiro que mais se está a destacar nesta temporada de 2016. Como ingredientes da emoção que todos querem e cada vez mais está a desaparecer, trouxe ainda os Forcados de Évora, ainda e sempre um dos grandes grupos, para que se encerrasse com os seis bonitos e bem apresentados toiros de Passanha. Resultado, volto a lembrar: lotação esgotada. Quando o elenco é bom, quando há diferença e as coisas são aquela chatice de “mais-do-mesmo”, o público, aficionado e não aficionado, vai à bilheteira, enche a praça. Caramba, é assim tão difícil entender como se devem fazer as coisas bem feitas e transformar num acontecimento um espectáculo tauromáquico?
Reafirmo o que digo há anos: se em vez de duzentos ou trezentos espectáculos por ano, houvesse vinte ou trinta, bem montados e com interesse (como o de ontem), todos seriam acontecimentos únicos, todos registariam praça cheia e a tauromaquia ganhava um outro impacto e uma outra importância. Muitos toureiros teriam que ir para casa, mas há tantos que não andam cá a fazer nada…

Moura eterno! E o resto...

Quem continua a fazer, e muito, é o grande João Moura, que ainda ontem abriu o livro e voltou a dizer-nos que continua a ser e vai ser por muitos e bons anos, o primeiro.
Galvanizou o público como nos tempos de ouro com duas lides magníficas, distintas, a primeira de um valor imenso, a segunda de uma maestria e arte incríveis, bregando como só ele sabe, cravando com emoção, dominando, mandando, colocando à tona o saber, a experiência, aquela chama única de fazer tudo bem feito e com uma arte e um temple que continuam sem ter igual.
Foram, apenas e só, duas lições de sabedoria - mas sobretudo de maestria. Atributos com que João Moura continua a ser o número-um e onde até aos dias de hoje jamais alguém ousou chegar... nem de longe.

A classe e o alto nível de Pablo

Pablo Hermoso continua a desfrutar do carinho e da admiração do público português, como poucas vezes acontece com um toureiro estrangeiro, mas aconteceu muitos anos com Álvarito Domecq. Hoje é Pablo a vedeta, o ídolo. E não me venham os velhotes do Restelo com as estórias de que toureia toiros assim e assado, de que faz um espectáculo de enorme brilhantismo equestre, mas pouca tauromaquia, mais isto e mais aquilo.
Ontem, com o pior lote, um primeiro Passanha agressivo e sem transmissão, um segundo manso e a que deu a volta, demonstrou todo o seu poderio, toda a sua classe e toda a sua casta - atributos que fazem parecer o difícil fácil, que tornam mágicos os momentos que protagoniza num arena e que o reafirmam como a maior vedeta da actualidade em arenas lusas. Pena que não seja um português - mas não é, ponto final.

João Telles distancia-se do pelotão

Pode vir a sê-lo João Ribeiro Telles - pode, sim senhor. Está a ser nesta temporada o cavaleiro mais destacado do pelotão e ontem em Évora teve um importante e significativo triunfo, memorável, gigantesco, ao lado dos dois maiores do toureio equestre mundial. Não tinha a vida facilitada, depois de Moura e Hermoso terem deixado a parada tão alta. Mas não se deixou intimidar, fez-se à luta - e venceu.
Manteve a tónica triunfal das suas últimas actuações, cravou ferros de um incrível impacto, levantando o público das bancadas. Esteve magistral nos dois toiros, pôs Évora de pé, as suas lides foram em crescendo e a conquistar tudo e todos de ferro em ferro, de sorte em sorte, elegendo terrenos de compromisso, cravando com emoção e verdade, de frente, arrepiando, parando corações. João Telles segue em ritmo verdadeiramente alucinante aquela que está a ser a temporada da sua absoluta e plena consagração.

Noite brilhante dos Amadores de Évora

Os toiros de Passanha eram seis estampas. Não primaram pela bravura, o último foi o melhor, os outros impuseram respeito e emoção, não foram fáceis, bateram forte nos forcados, deram apertos os cavaleiros, não foram toiros “de corda” nem andaram a trote, antes pelo contrário, arrearam, não tiveram doçura alguma. Deram emoção a uma noite que decorreu em muito bom ritmo e que acabou por ser uma daquelas (poucas) corridas que fazem aficionados, de onde todos saem satisfeitos, cheia de glamour, cheia de ambiente e de gente do toiro. Estava a fina-flor. Évora ontem teve outro sabor.
Os Forcados Amadores de Évora foram protagonistas de uma noite de muito valor, como anteriormente já aqui se referiu, com três pegas à primeira (pelo cabo António Alfacinha, por Gonçalo Pires e Manuel Rovisco), uma à quarta do valente Dinis Caeiro, outra de João Madeira à terceira e por fim a de João Pedro Oliveira à segunda.
Os toiros foram todos bem recolhidos a cavalos pelos campinos Mário Gordo (Quinta da Silveira) e João Carvalho (Agribrotas) e na direcção da corrida, impecável como sempre, esteve Agostinho Borges com decisões acertadas e com o bom senso que o caracteriza, imprimindo um belíssimo ritmo ao espectáculo.
A destacar o emotivo brinde de Pablo Hermoso, no seu segundo toiro, aos Ribeiro Telles e à memória de Mestre David - a marcar, como sempre marca, a diferença. Quem sabe e quem tem classe… sabe sempre e terá sempre nível e classe. E o resto são cantigas…

Fotos Emílio de Jesus/fotojornalistaemilio@gmail.com