Trinta anos depois da estreia de seu pai na Ilha Terceira, o novo Rouxinol reafirmou ontem nos Açores que é um caso e vai fazer História nesta arte! |
Pega monumental ao último toiro da corrida de ontem em Angra. Manuel Pires em noite de apoteose e a consagrar-se como um dos grandes Forcados da actualidade |
José Quintas e Pedro Fonseca (foto) foram os autores das duas excelentes pegas dos Amadores de S. Manços ontem em Angra do Heroísmo |
Os Amadores de Arronches executaram duas valentes pegas por intermédio de João Rosa e Luis Marques |
Miguel Alvarenga - A Festa de Toiros na Ilha Terceira, a Terra dos Bravos, tem um sabor diferente, especial. A aficion é imensa, exigente e entendida, aqui não há crise que valha, o público vai aos toiros e ontem encheu (três quartos fortes) a sua bem cuidada e bonita Monumental para assistir a uma grande (grande, mesmo!) corrida, a primeira celebrada por ocasião das tradicionais e portuguesíssimas Festas da Praia da Vitória.
Já aqui não vinha há uns anos. À “minha” Ilha, à Ilha de tantos e tão queridos Amigos, como o Carlos Alberto Moniz, o Silveirinha, o João Parreira, o Valdemar Barcelos, o António Pontes, o Carlos Ávila, o João Carlos Pamplona e outros mais - que ontem tive o gosto imenso de rever. Gente boa. Distinta.
A primeira vez que vim à Terceira foi exactamente há trinta anos, depois vim e voltei a vir imensas vezes. Há trinta anos, Luis Rouxinol apresentou-se aqui, pelas festas, numa praça portátil instalada na Praia da Vitória, poucos dias depois de ter tomado a alternativa em Santarém. Três décadas depois, assisti ontem à apresentação de seu filho Luis Rouxinol Jr. na Terra dos Bravos, também depois de ter recebido triunfalmente a sua alternativa no Campo Pequeno. A História cumpre-se de novo - e repete-se. Com a mesma glória.
A nocturna de ontem ficou marcada por dois triunfos memoráveis: o do cavaleiro João Moura Jr., que vive momento de enorme consagração e ganhou o troféu para a melhor lide pela sua primeira e extraordinária actuação frente a um bom toiro do Engº Luis Rocha; e o de um Forcado de eleição, Manuel Pires, que na segunda-feira vai assumir a liderança do Grupo do Ramo Bravo na tarde em que este comemora o seu 10º aniversário e se retira o cabo fundador Filipe Pires, seu primo.
Uma pega "do outrro mundo"!
Pega “do outro mundo”, que bem esteve Manuel Pires a citar, que elegância, que tranquilidade, que porte de toureiro bom. E que bem recuou depois, mandando e templando a investida do bravo toiro da Casa Agrícola José Albino Fernandes, fechando-se com decisão e não mais saindo da cara do oponente, a aguentar derrotes e mais derrotes, até os companheiros chegarem e confirmarem aquilo que já ele tinha confirmado e bem, que a pega estava consumada. Praça em loucura, aplaudindo de pé e uma volta deu com Rouxinol Jr. e outra sózinho, todos a aclamar em euforia, que ninguém o queria ver sair dali, todos insistiam em consagrar aquele momento e registá-lo para a posteridade como um dos mais emotivos que nos últimos tempos aqui se viveram na Monumental de Angra do Heroísmo. Grande Forcado! Não tenho dúvidas em afirmar: um dos grandes Forcados da actualidade!
Toiro de Albino Fernandes ganha os dois prémios
O Concurso de Ganadarias foi ganho "em duplicado" pelo quinto toiro da noite, da Casa Agrícola José Albino Fernandes, brilhantemente lidado por João Pamplona, que se chamou “Juanito”, tinha o nº 428 e pesou 528 quilos. O júri que atribuiu ontem os prémios, sem a mínima contestação, era formado por Francisco Parreira, pelo ganadero alentejano Diogo Passanha (que se encontra na Terceira a assistir às corridas das Festas da Praia) e pelo antigo cabo dos Amadores do Montijo, José Luis Figueiredo. O toiro de Albino Fernandes, saudoso e destacado ganadero terceirense, foi premiado com os troféus de bravura e de apresentação.
Foi também muito bom o sexto toiro, da mesma ganadaria; e o primeiro, de Luis Rocha. Destaque, ainda, para o quarto, de Silva Herculano. Lidavam-se dois de cada uma das referidas ganadarias.
João Moura Jr., a solidez de uma Figura
João Moura Jr. reafirmou ontem na Terceira o momento altíssimo que está a viver. Moral em alta, imparável, com uma quadra de nível elevadíssimo. Trouxe alguns craques aos Açores e deixou outros no continente. Depois de na segunda-feira aqui voltar a actuar, segue para a Graciosa, onde toureia nos próximos dias 12 e 14 e na manhã de dia 15 ruma a Lisboa para actuar nessa tarde em Reguengos e à noite na Messejana.
Esteve enorme na lide do primeiro toiro, de Luis Rocha. Enorme a bregar, a ladear na cara do toiro, a cravar em terrenos de compromisso, a rematar as sortes com maestria e o temple que é apanágio do toureio mourista. A transmitir segurança, uma solidez admirável, a tranquilidade serena de quem vive um momento de absoluta afirmação e de solene consagração. Incontestavelmente o primeiro da nova vaga.
O seu segundo toiro, da ganadaria Silva Herculano, também não destoou. João Moura Jr. voltou a estar em grande nível, entusiasmando o público que se foi levantando de ferro em ferro, como que impelido por uma mola, a aplaudir, a consagrar tanta arte e tamanho Toureiro. Triunfo grande, a deixar justificada expectativa para a repetição, depois de amanhã, aqui em Angra.
A classe de João Pamplona
João Pamplona, o mais jovem de uma histórica e respeitada Dinastia terceirense de bons cavaleiros, tem, desde que se iniciou, demonstrado valor e classe para poder ir longe. Toureia pouco, mas parece que está muito toureado. Tem presença, é excelente equitador e possui, desde muito novo, uma rara intuição que sempre deixou antever um futuro brilhante.
O seu primeiro toiro, segundo da noite, de Silva Herculano, investia com alegria, mas parava-se no momento da reunião e isso não permitiu a João Pamplona o triunfo que se antevia, obrigando-o a passar demasiadas vezes em falso, sem deixar o ferro por “não ter toiro”. Mesmo assim, pelo seu esforçado labor e pela seriedade com que soube ultrapassar as dificuldades do toiro, merecia ter tido música, mas o director de corrida não lha concedeu e no final veio apenas ao centro da arena, recusando dar a volta - com a dignidade que marca quem é bem nascido. E ele é.
No quinto toiro da corrida, um bom exemplar de Albino Fernandes que exigia, pedia contas e transmitia (vencedor do Concurso de Ganadarias), João Pamplona esteve por fim em grande nível e pôde aqui demonstrar todas as suas potencialidades e aptidões numa lide bem desenhada, em que sobressaiu a ousadia e a verdade toureira em cites de praça a praça, com ferros cravados em sortes frontais, vencendo o piton esquerdo, que resultaram emotivos. Teve música e deu aplaudida volta à praça.
30 anos depois, o novo Rouxinol brilha na Terceira
Luis Rouxinol Jr. é, disse-o sempre, um caso e está a afirmar-se por si próprio, distanciando-se do selo de ser filho de Luis Rouxinol. Toureiro de um valor acentuado e de uma raça desmedida. Sabe o que faz e faz bem. Lide redonda no terceiro toiro, de Luis Rocha (de boa nota também) e uma actuação de grande fulgor no no último, de Albino Fernandes, onde superou, encastando-se, uma aparatosa queda logo de início, por o cavalo ter escorregado e que podia ter tido consequências graves.
Recompôs-se o jovem Rouxinol e foi como se não se tivesse passado nada. Casta, muito casta e uma lide brilhante, em crescendo. Trinta anos depois da estreia de Luis Rouxinol na Terra dos Bravos, nota alta para o debute do novo Rouxinol, a seguir com brilhantismo e uma raça tão própria os passos de glória que marcaram três décadas de carreira notável de seu pai.
Aplausos para a brega desenvolvida, quer a lidar, quer a colocar os toiros para as pegas, pelos seis bandarilheiros que ontem coadjuvaram as lides: Benito Moura e Diogo Malafaia, Diogo Coelho e Gonçalo Toste, David Antunes e Sérgio Silva.
Noite triunfal para os Forcados
As pegas estiveram a cargo dos forcados continentais de S. Manços e de Arronches e dos terceirenses do Ramo Grande.
João Quintas, à primeira e Pedro Fonseca, ao segundo intento, foram os forcados de cara nas pegas do Grupo S. Manços, tendo estado bem e com os companheiros a ajudar com coesão.
Pelos Amadores de Arronches pegaram João Rosa (muito bem, à primeira) e Luis Marques, à segunda tentativa. Bem, também, todo o grupo nas ajudas.
Os Amadores do Ramo Grande executaram brilhantemente as duas pegas à primeira. André Lourenço foi o forcado de cara no terceiro toiro da noite e o já referido Manuel Pires fez a grande pega da corrida ao último.
Ao início do espectáculo e com a presença na arena do antigo cabo dos Forcados Amadores do Montijo, José Luis Figueiredo e de Óscar Romão, antigo elemento do grupo, foi prestada homenagem à memória do forcado António Gouveia, falecido nesta praça há exactamente vinte anos, vítima de colhida. Ao intervalo descerrou-se nos corredores da Monumental uma placa alusiva a esta trágica efeméride na presença dos cavaleiros e forcados e de muito público.
A corrida foi bem dirigida por Mário Manteigas, que foi recordado empresário desta praça, há anos, em sociedade com António Pontes e com os empresários continentais Rogério Amaro e António Manuel Cardoso “Nené”.
Noite para a História na Monumental da Ilha Terceira. Uma corrida das que fazem aficionados. Das que fazem falta à Festa! E venha a segunda, na próxima segunda-feira! Que aqui vale a pena ir aos toiros.
Fotos Simão Fonseca