quarta-feira, 24 de abril de 2019

Há 45 anos: como ia a tauromaquia no ano da "revolução"

João Moura actuara como amador no Campo Pequeno
quatro dias antes do 25 de Abril, ao lado de Manuel Conde,
Mestre Batista e Luis Miguel da Veiga naquela que foi a
última corrida em Lisboa antes da "revolução"
O grande Manuel dos Santos morrera em acidente de
automóvel em Fevereiro do ano anterior (1973) e a empresa
do Campo Pequeno era então dirigida por seu filho
21 de Abril de 1974, domingo anterior ao 25 de Abril. A última corrida em
Lisboa no reinado do Estado Novo
Domingo de Páscoa de 1974, 14 de Abril, a primeira corrida da temporada
em Portugal, a apenas onze dias da "revolução"
Este anúncio, publicitando a primeira corrida do
ano na Monumental de Santarém, vinha publicado
na edição de 25 de Abril de 1974 do jornal "Diário
Popular" (capa em baixo)


Cumprem-se amanhã 45 anos sobre a "abrilada" de 1974. Vamos recordar como ia a tauromaquia em Portugal nesse tempo

Miguel Alvarenga - Há 45 anos, João Moura tinha 14 de idade e dava os primeiros passos naquela que viria a ser a mais gloriosa de todas as "revoluções" - a do toureio a cavalo... sem cravos.
Quatro dias antes do 25 de Abril (que foi numa quinta-feira), no domingo, dia 21, actuara como amador no Campo Pequeno ao lado de Manuel Conde, José Mestre Batista e Luis Miguel da Veiga. Pegaram os forcados de Santarém e de Montemor e lidaram-se sete toiros de Rio Frio - e esta foi a última corrida no Campo Pequeno antes do 25 de Abril. A última corrida do Estado Novo.
Uma semana antes desta corrida, a 14 de Abril, abrira oficialmente a temporada portuguesa com a tradicional corrida de Domingo de Páscoa no Campo Pequeno. Nesse tempo, era essa sempre a primeira corrida do ano, não se realizavam outras noutras praças. Os cavaleiros Manuel Conde e José Maldonado Cortes, os matadores de toiros Fernando dos Santos e Carnicerito de Úbeda (espanhol) e os Forcados Amadores do Ribatejo, comandados por Rui Souto Barreiros, compuseram o primeiro cartel da temporada de 1974, com oito toiros de Maria Ana Passanha.
Um ano antes, morrera Manuel dos Santos num acidente de automóvel (Fevereiro de 1973) e Mestre João Núncio comemorara 50 anos de alternativa em Março com praça cheia no Campo Pequeno. José João Zoio tomara a alternativa nessa tarde e no camarote presidencial assistiram à corrida o presidente da República, Almirante Américo Thomaz e o presidente do Conselho de Ministros, Prof. Marcello Caetano.
A praça de toiros de Lisboa era gerida pelo filho de Manuel dos Santos, Manuel Jorge Diez dos Santos, juntamente com José Cardal, Américo Pena e Paulo Venâncio Rodrigues, que fora secretário do Prof. Oliveira Salazar. Entre outros, eram também membros da equipa da primeira praça do país Alfredo Ovelha e José Agostinho dos Santos.
Os bilhetes para as touradas custavam entre 300 escudos (barreira) e 50 escudos (galeria), o equivalente a um euro e meio e 25 cêntimos e os cachet's das primeiras figuras de então rondavam (valor extraordinário) os 100 contos (500 euros). As primeiras figuras da época, além do eterno Mestre Núncio, eram, entre outros, Manuel Conde, David Ribeiro Telles, José Samuel Lupi, José Mestre Batista, José Maldonado Cortes, Alfredo Conde, Fernando Andrade Salgueiro, Luis Miguel da Veiga e entre os novos contavam-se Emídio Pinto, Frederico Cunha, Sommer d'Andrade, Vitor Ribeiro (pai), Gustavo Zenkl, D. Francisco Azarujinha e outros.
Havia uma nova fornada de jovens cavaleiros, entre os quais se destacavam Manuel Jorge de Oliveira, José Manuel Correia Lopes, Brito Limpo, Brito Paes, Moita da Cruz, José Varela Crujo, Paulo Caetano, João Ribeiro Telles, Rui Salvador e, obviamente, João António Romão de Moura.
O toureio a pé vivia ainda momentos de glória. Estavam ainda no activo figuras como José Júlio, Armando Soares, Amadeu dos Anjos, José Simões, Mário Coelho, Ricardo Chibanga, Júlio Gomes, José Manuel Pinto, Óscar Romano - e José Falcão era a maior promessa e aquele que nos fazia acreditar numa brilhante carreira além-fronteiras. Ninguém adivinharia que viria a morrer em Agosto desse ano de 1974 em Barcelona, vítima de cornada.
Também no toureio a pé, começavam a dar que falar alguns jovens diestros, como Vitor Mendes, António de Portugal e Parreirita Cigano, além do brasileiro Fernando Guarany e outros jovens que davam os primeiros passos, entre eles, Paco Duarte, António Poeira, Fernando Pessoa, Manuel Moreno e outros.
João Queiroz lançara um ano antes (1973) o jornal "Broncas & Olés", antecessor da revista "Burladero" e o jornalista da RTP Luis Alberto Ferreira dirigia um outro semanário taurino intitulado "Redondel". Cristovão Moreira "Solilóquio", cronista taurino e Comandante da Marinha, publicava anualmente com enorme sucesso as suas crónicas taurinas em livro e os jornais diários davam todos invejável relevo ao espectáculo tauromáquico. Andrade Guerra e José Sampaio eram as novas revelações da crítica nas páginas do "Diário de Notícias". A franja de prestigiados cronistas taurinos era composta, entre outros, por Mestre Leopoldo Nunes, Nizza da Silva, Rogério Pérez "El Terrible Pérez", Américo Saraiva Mendes, Saraiva Lima, Hernâni Saragoça, José António Lázaro, Quito Fernandes, Francisco Morgado e José Manuel Severino. Despontava Maurício Vale. Eu dava os primeiros passos nas páginas do semanário "Cidade do Tomar" e dois anos mais tarde (1976) iniciaria a minha carreira jornalística ao lado de Vera Lagoa no jornal "O Diabo".
A Sociedade Campo Pequeno geria muitas outras praças e dominava em termos empresariais, mas Nuno Salvação Barreto iniciava também uma destacada carreira como empresário que se viria a estender a várias praças de toiros do país e até de França, onde se tornaria o grande pioneiro da organização de corridas à portuguesa com forcados.
Na sua edição de 25 de Abril de 1974 (ao lado), o "Diário Popular" anunciava a primeira corrida da temporada em Santarém (28 de Abril), mista, com os cavaleiros Gustavo Zenkl e D. José João Zoio, os amadores Emídio Pinto e Manuel Jorge de Oliveira, o matador Ricardo Chibanga e o aspirante a novilheiro António Poeira, mais os grupos de forcados de Santarém e de Montemor.

Fotos D.R.