João Moura, ladeado por Miguel Alvarenga e pelo presidente da tertúlia, João Quintella |
Miguel Alvarenga, João Moura, João Quintella e Nico Mexia de Almeida |
Francisco Mira, João Quintella, Manuel Athayde, Manuel da Câmara, Miguel Alvarenga, João Moura e Paulo Vacas de Carvalho |
Raul Telles de Carvalho e João Cortes |
João Cortes, João Perdigão e Miguel Dentinho |
João Afra Rosa (Balé) e António Mendo Teixeira |
João Moura ainda experimentou a casaca que a Tertúlia "Valores e Tradições" ontem lhe ofereceu, por estrear... mas que fica para a alternativa do filho Tomás |
João Moura deu ontem, em animada e selecta tertúlia ao jantar com os membros da "Valores e Tradições", uma importante lição de cátedra, revisitando os melhores momentos da sua gloriosa carreira de meio século nas arenas. "O meu estilo baseou-se num misto entre o toureio de Mestre Batista e o do Senhor David Ribeiro Telles, que foram as minhas grandes referências", confessou
Os jantares mensais da Tertúlia "Valores e Tradições", no restaurante do Jockey Clube de Lisboa (Sociedade Hípica) caracterizam-se, há muitos anos, pela solenidade, boa disposição e informalidade com que decorrem, em ambiente de amizade e, na maior dos casos, com a tauromaquia por tema principal. Mas por lá têm passado muitas outras figuras do meio social, artístico e político, todas elas com o elo comum da defesa dos nossos valores e nas nossas mais enraizadas tradições.
Conchita Cintrón, D. Vicente da Câmara, o antigo inspector da PIDE Óscar Cardoso, o mais condecorado militar português, Marcelino da Mata e, por exemplo, o recém falecido matador de toiros Ricardo Chibanga, foram alguns dos mais notáveis convidados dos jantares desta tertúlia, por onde têm passado também outras grandes figuras do meio tauromáquico e não apenas de Portugal, casos dos ganadeiros Miura e do matador de toiros espanhol Eduardo Dávila Miura, entre muitos mais.
A presidência da Tertúlia "Valores e Tradições" vai rodando todos os anos e, neste, o líder é João Quintella, conceituado pintor, escultor e antigo forcado dos Amadores de Alcochete.
O convidado de honra ontem foi o Maestro João Moura, que a todos proporcionou um serão super agradável e de grande importância - por tudo o que disse e recordou, pela enorme lição de cátedra que ali deixou.
Lembrou, por exemplo, que nas três actividades em que se destacou e foi rei - galgos, raides hípicos e toureio a cavalo - os momentos mais importantes que viveu foram, respectivamente, a vitória no Campeonato de Espanha (galgos), o dia em que venceu o raide hípico do "Expresso" e as marcantes corridas dos sete toiros e a da alternativa em Santarém, os triunfos em Lisboa e as nove saídas em ombros da Monumental de Madrid que, gracejou, "teriam sido muitas mais se tenho acertado com o rojão de morte... mas falhava quase sempre".
Questionado sobre que cavalo elege como o seu melhor de sempre, João Moura respondeu sem pestanejar: "O 'Ferrolho'! Foi o grande cavalo da minha vida e dos meus inícios, estávamos os dois a aprender...".
Quanto às suas praças de eleição, também foi bem claro: "Lisboa, Santarém e Madrid".
E quando lhe perguntaram quem foram os toureiros antigos que constituiram as suas maiores referências, disse: "Mestre João Núncio, com quem cheguei ainda a tourear, mas que não vi muitas vezes. Mas era o primeiro. Aqueles que mais me marcaram foram Mestre Batista e o Senhor David Ribeiro Telles e acho que o meu toureio foi mesmo um misto dos dois. Admirava a forma como o Batista entrava de frente pelos toiros dentro e punha aqueles ferros 'do outro mundo' e admirava a forma e a postura com que o Senhor David lidava os toiros. Também gostei sempre muito de ver tourear o Luis Miguel da Veiga, pela ligação cavalo-toiro que ele impunha nas suas lides".
E quanto aos da sua geração e aos novos, falou e disse: "O que mais 'apertou' comigo foi sempre o João Salgueiro. Gosto muito também de ver tourear o António Ribeiro Telles, sempre gostei, é um grande toureiro e um grande cavaleiro. Dos novos, e digo novos porque já vieram depois de mim, os melhores são, sem dúvida, o Pablo Hermoso e o Diego Ventura. Da nova geração, destaco, sem estar a puxar a brasa à minha sardinha, o meu filho João, que já conquistou um lugar importante. O Miguel está a afirmar-se e o Tomás há-de ser também um bom cavaleiro. Gosta muito de tourear a pé, mas eu digo-lhe sempre para se deixar disso e para vir, mas é, para cima do cavalo... Mas destes novos destaco também o Margaça (Francisco Palha). Ainda em Março toureei com ele em Santarém e esteve fantástico".
Os forcados, numa tertúlia composta na sua maioria por muitas glórias dessa tão portuguesíssima arte, foram também tema de algumas perguntas. E quando questionaram o Maestro sobre o que sente e como reage quando uma pega se sobrepõe à sua faena a cavalo, confessou: "Vou à praça, entrego o tricórnio ao forcado e as ovações são para ele. Tenho e tive sempre o maior respeito pelos forcados, o trabalho deles é bem mais difícil que o meu...".
E no início de uma temporada em que João Moura vai marcar pelo gesto e pela atitude de fazer frente a toiros de ganadarias duras que muitos dos "meninos" rejeitam (os Vale do Sorraia dia 1 de Maio em Almeirim, os Palhas a 26 desse mês na Moita, os Veiga Teixeira em Agosto no Campo Pequeno), esse foi também o tema de uma das perguntas: porquê isso, quando já não tem nada a provar a ninguém, quando não tem qualquer necessidade de se sujeitar a tais "sacrifícios"? Resposta do Maestro:
"Se muitos dos mais novos não querem ver esses toiros pela frente, eu sinto que tenho que lhes dar o exemplo e toureá-los. Ainda me sinto em forma para o fazer. Sempre toureei todos os encastes, houve tempos em que escolhi ganadarias, sim senhor. Mas se às vezes toureava toiros com os quais não podia satisfazer a cem por cento os aficionados que iam para me ver, porque razão haveria de voltar a fazer o mesmo, se à partida esses toiros não davam garantias de êxito? Mas toda a vida toureei todas as ganadarias, lidei, por exemplo, seis ou sete Miuras e ao último, em Évora, recebi-o com uma sorte de gaiola".
Quantos toiros lidou Moura na sua vida?
"Não sei, não tenho nada disso escrito, sou mau para datas e para estatísticas. Mas em quarenta e um anos de alternativa, mais os outros em que toureei como praticante e os dois em que arranquei em Espanha, havendo épocas em que toureei 80 e 90 corridas, a uma média de dois toiros por tarde, sou capaz de já ter enfrentado uns quatro mil toiros, não sei...".
Com 58 anos de idade, 41 de alternativa e 50 de toureio, quantos mais anos vamos ver o Maestro Moura nas arenas? E ele não hesitou:
"Ainda me sinto bem. Confesso que preciso de fazer uma dietazinha... mas gostava ainda de dar a alternativa ao meu filho Tomás".
E quando isso acontecer, Tomás já tem uma lindíssima casaca azul bordada a ouro que foi feita pelo falecido Augustus e está por estrear. A casaca, que foi uma das que Augustos desenhou para a corrida de seis toiros de João Moura em Lisboa (anos 90), nunca chegou a ser utilizada pelo cavaleiro e foi doada para uma instituição de beneficência e agora adquirida num leilão por João Abreu Lopes, membro da Tertúlia "Valores e Tradições", que ontem a ofereceu a João Moura no final do agradável jantar.
O repasto iniciou-se com uma oração, uma Avé Maria, em homenagem à memória de Ricardo Chibanga, que ontem mesmo foi a sepultar na Golegã - "um grande toureiro e um homem muito bom", recordou João Moura.
Fotos João Perdigão, Francisco Mira e D.R.