Miguel Alvarenga - Quando em praça estão dois grupos do calibre dos de Montemor e Lisboa, a nobre e portuguesíssima arte de pegar toiros sai sempre valorizada, engrandecida, enaltecida. Como ontem aconteceu no Campo Pequeno. E está tudo dito!
Vivemos momentos estranhos - em que grupos consagrados, como é o caso do de Lisboa (e de outros), como ontem mesmo aqui referi, estão a pegar muito poucas corridas e os empresários insistem em valorizar, vá lá saber-se porquê, ou se calhar até sabemos todos, grupos menos importantes e com muito menos História. E sem as mesmas garantias de triunfarem, como estes dois de ontem.
Ontem em Lisboa, na primeira grande noite de glamour do Campo Pequeno (um mote fantástico para as restantes três corridas desta curta temporada na primeira praça do país), estiveram dois grandes Grupos de Forcados para pegar toiros sérios, exigentes e com teclas, dos que pedem contas, da ganadaria Brito Paes (de António Raul) e foram feitas cinco pegas à primeira, fabulosas, havendo apenas a lamentar a última, que só ficou concretizada à quinta. Uma noite de glória para os Forcados, que são e continuam a ser ainda o maior cartaz da nossa Festa.
Os dois grupos deram vantagens aos toiros, tiveram como protagonistas muitos dos seus melhores forcados de cara e estiveram muito bem a ajudar, contribuindo para uma noite de sucesso.
Vasco Carolino, consagrado e portentoso forcado do Grupo de Montemor, fez a primeira pega da noite, ao toiro da alternativa de Joaquim Brito Paes (a quem a brindou), provocando-lhe a investida nos seus terrenos, recuando com técnica e saber, reunindo e fechando-se com enorme decisão, aguentando a força bruta do oponente (582 quilos) sem pestanejar. Foi muito bem ajudado, "à Montemor", pelos companheiros e a pronta intervenção do fantástico rabejador Francisco Godinho, que viria a brilhar nas outras duas pegas do grupo, fez o resto. Grande pega e grande grupo!
Nuno Fitas, dos Amadores de Lisboa, fez a segunda pega da noite ao mais complicado dos seis toiros de Brito Paes (com 610 quilos), que foi superiormente lidado pelo Maestro António Telles. Bonito a citar, templou com saber a investida, fechou-se com braços de ferro e foi prontamente - e bem - ajudado pelos companheiros, concretizando uma vistosa pega.
Para a cara do terceiro toiro foi o experiente Vasco Ponce, da formação montemorense, um forcado de grande técnica e enorme poderio, um daqueles que podem com todos os toiros. Este tinha 628 quilos e Vasco fechou-se com a raça costumeira, aguentando violentos derrotes, com uma extraordinária primeira ajuda do cabo António Pena Monteiro e com todos os companheiros, outra vez, a ajudarem em peso e "à Montemor". Outra grande pega!
A quarta pega da noite, a um Brito Paes com 652 quilos, foi um monumento! Consumou-a o valoroso Daniel Batalha, um forcadão e pêras do Grupo de Lisboa. Citou com arte, recuou toureando e templando a investida do toiro, fechou-se com muito querer, o toiro levou-o até às tábuas com violência e depois fugiu ao grupo, mas Daniel nunca saíu, jamais desarmou, colado que nem uma lapa veio até ao centro da arena, sempre com a mão de Gonçalo Segão a ajudá-lo, consumando uma pega emotiva e de raça. Forcado de alma e de valor! No final o público exigiu a presença na arena do ajuda Gonçalo Segão, filho do célebre forcado Luis Segão (Bombeiro) deste mesmo grupo, deram ambos volta com Salgueiro da Costa e ainda outra sózinhos, com o público de pé, em euforia. Pergunto: Daniel Batalha não merecia ter saído em ombros?...
José Maria Vacas de Carvalho, uma das novas estrelas do Grupo de Montemor (quem sai aos seus...) fez a quinta pega da corrida a outro poderoso toiro com 618 quilos, aguentando fortíssimos derrotes com uma raça e um valor tremendos e de novo com o cabo Pena Monteiro a dar uma valente e decisiva primeira ajuda, que deveria ter também merecido uma volta à arena. Noite grande para os Amadores de Montemor.
A última pega, ao toiro mais pesado da corrida (660 quilos) com que triunfou forte o jovem cavaleiro António Telles (filho), foi a mais complicada da noite e a única que não foi concretizada ao primeiro intento, mas sim ao quinto. Poderia ter sido feita à primeira tentativa, não fosse o valoroso Duarte Mira ter escorregado na cara do toiro. Depois, o toiro não mais permitiu que o pegassem. Mira foi cinco vezes à cara do complicado Brito Paes, com estoicismo e quase heroísmo, sofrendo violentos "despejos", felizmente sem nunca se magoar. À quinta foi de fez, com as ajudas carregadas.
Fique agora com as sequências das seis pegas na primeira grande noite da temporada lisboeta, em que ao início foi guardado um minuto de silêncio em memória de Carlos Serra, histórico forcado dos Amadores de Lisboa recentemente falecido.
Fotos M. Alvarenga
Vasco Carolino (Montemor) na primeira grande pega da noite |
Nuno Fitas (Lisboa) pegou com galhardia o segundo toiro |
Pegão "à Montemor" de Vasco Ponce ao terceiro toiro |
Daniel Batalha (Lisboa) no quarto toiro: um monumento! |
José Maria Vacas de Carvalho fechou com chave de ouro a noite de grande triunfo do Grupo de Montemor |
Última pega, a mais complicada: Duarte Mira (Lisboa). À quinta foi de vez! |