Miguel Alvarenga - Já foram várias as tardes de lotação esgotada em Almeirim desde que Rui Bento, do alto do seu experiente profissionalismo, deitou mãos à gestão da renovada Monumental em parceria com a aficionadíssima Mesa da Santa Casa da Misericórdia, onde pontificam nomes como os de José Lobo de Vasconcelos (Provedor), Helena Ribeiro Telles e João Santos Andrade, entre muitos mais.
E ontem voltou a acontecer lotação esgotada naquela que era a primeira presença de Pablo Hermoso de Mendoza em Portugal depois de mais uma memorável campanha no México, na temporada do adeus às arenas, à beira de cumprir 60 anos de idade. Foi anunciado ao início da corrida que o lucro da bilheteira ultrapassava os 33 mil euros, destinados à louvável obra social da Santa Casa.
Também ao início da corrida, o Provedor José Lobo de Vasconcelos rendeu homenagem a Pablo Hermoso e à sua histórica trajectória, na arena, na presença dos restantes intervenientes na corrida de ontem - depois da tarde de praça cheia uma semana antes na enorme Monumental de Santarém, Almeirim foi ontem palco de mais uma corrida bem demonstrativa do enorme esplendor que vive a Festa Brava e que decorreu envolta num ambiente fantástico e com muitas caras conhecidas nas bancadas.
Lidaram-se seis toiros de distintas ganadarias, sem se tratar de um concurso. António Telles enfrentou os exemplares de Varela Crujo e Passanha; a Pablo Hermoso coube lidar os de António Raul Brito Paes e de Ribeiro Telles; e Luis Rouxinol Júnior toureou os de Ascensão Vaz e Romão Tenório.
A iniciar a sétima temporada como cavaleiro de alternativa (que recebeu em Lisboa em Julho de 2017), Luis Rouxinol Júnior chegou ontem a Almeirim com o peso e a responsabilidade acrescida de pela primeira vez se defrontar taco-a-taco com Pablo Hermoso numa corrida formal de três cavaleiros, depois de em Setembro do ano passado ter alternado já com o figurão de Navarra no Campo Pequeno, mas numa corrida de seis cavaleiros. E saíu de Almeirim com a cotação muito mais alta e com a consagração absoluta de ter sido o triunfador-maior da tarde.
Ontem, e como era de prever, Luis Rouxinol Júnior foi ali jogá-las todas, como se costuma dizer, com a atitude e a raça dos eleitos, com a alma dos toureiros que depressa se vão tornar figuras - e ninguém terá hoje dúvidas de que o jovem Luis é já uma das potenciais primeiríssimas figuras desta nova geração de cavaleiros tauromáquicos.
Recebeu o toiro de Ascensão Vaz - bravo e com teclas, a pedir contas, um toiro de nota altíssima que era merecedor de chamada à praça, no final, do representante da divisa, mas... ficou esquecido - à porta da gaiola e aguentou que nem um herói a carga brutal do oponente em três emotivas voltas à arena, começando logo ali a conquistar o público que não mais deixou de o aplaudir ao longo de toda a tarde.
Luis bregou, toureou e cravou com a garra dos eleitos, com a verdade dos que se afirmam sem martingalas, a deixar antever mais uma temporada de grande sucesso e que tem como próximos desafios o mano-a-mano com Miguel Moura em São Manços no próximo domingo (Páscoa) e o importante Concurso de Ganadarias de Évora em Maio.
O último toiro da tarde era o de Romão Tenório, bonito, voluntarioso, também com teclas e a pedir contas. Um toiro diferente do primeiro de Rouxinol, mas que o jovem cavaleiro entendeu também desde o primeiro momento, demonstrando enorme maturidade, muita tranquilidade e segurança, construindo uma lide variada e ousada, em que se destacaram os recortes de maravilha com o cavalo branco, a rematar ferros de grande emoção e excelente preparação.
Luis Rouxinol Júnior viveu ontem, muito provavelmente, uma das mais importantes e aclamadas tardes da sua ainda jovem carreira. Destacou-se, deu importantes passos em frente, saíu de Almeirim como máximo e incontestado triunfador de um pesado desafio ao lado de dois consagrados. Mais importante que isso: protagonizou um dos primeiros grande triunfos de 2024 no que aos cavaleiros diz respeito, fugindo a alta velocidade à regra instalado do sempre mais do mesmo. Foi diferente.
Pablo Hermoso lidou em primeiro lugar o toiro de Brito Paes, bonito e que para muitos era, dos seis, o que mais expectativa criara nos dias anteriores pelas fotos que foram divulgadas, mas que acabou por se revelar reservado, com pouca casta e sem grande transmissão, e sem dar grandes opções ao toureiro. Mas para Pablo não há toiros bons nem toiros maus e tudo parece tão fácil! Lide perfeita, em crescendo, como se tivesse pela frente um toiro fantástico.
O quinto da ordem era o toiro de Ribeiro Telles, da linha espanhola, com o qual Pablo Hermoso voltou a estar enorme, dando a cara, arriscando, marcando com mais um triunfo esta sua última actuação na Monumental de Almeirim. O público tributou-lhe calorosa ovação e aclamou-o na volta à arena. Como era a despedida, podia e merecia ter dado duas voltas. Mas ficou algo abafado pela grande pega de Vasco Coelho dos Reis, para quem foram as maiores ovações, incluindo as do próprio Pablo, que o deixou na arena e o aplaudiu enquanto regressava à trincheira.
Ontem o menos brilhante foi António Ribeiro Telles, a acusar mesmo algum desgaste da sua quadra, com cavalos a negarem-se e a dificultarem a vida ao Mestre. António deu um bonito ar da sua graça no primeiro toiro da tarde, um bom exemplar da ganadaria Varela Crujo, mas depois no quarto, um Passanha "dos antigos", sem facilitar, a impor seriedade, andou muitos pontos abaixo do seu melhor, recusando mesmo dar a volta à arena.
Há tardes assim, há momentos de menor brilhantismo na carreira de todos os toureiros. Todos acreditamos piamente que António vai dar a volta e que muito em breve o teremos de novo no topo da escadaria, como sempre nos habituou. Por morrer uma andorinha nunca acabou a Primavera e ontem também não morreu andorinha nenhuma, digamos apenas que voou mais baixinho e sem a graça do costume... Força, António!
Muito bem todos os seis bandarilheiros que ontem coadjuvaram as lides dos seus cavaleiros: João Ribeiro "Curro" e António Telles Bastos, da equipa de António; José Franco "Grenho" e Benito Moura com Pablo Hermoso; Ricardo Alves e João Martins às ordens de Rouxinol Júnior. Todos eles bem a lidar, sem excesso de capotazos; e muito bem, também, a colocar os toiros para os forcados.
Pegaram os grupos de forcados Amadores da Chamusca, Amadores do Aposento da Chamusca e Amadores do Cartaxo, havendo a registar seis rijas intervenções - de que a seguir vamos mostrar todas as fotos em pormenor -, tendo cabido o maior destaque ao valoroso Vasco Coelho dos Reis, do Aposento da Chamusca, na quinta pega da tarde, a melhor, mais dura e mais emotiva da corrida.
Houve brindes a registar: o de Pablo Hermoso, no seu primeiro toiro, a D. Francisco de Mascarenhas; os dos forcados a José Lobo de Carvalho, Provedor da Santa Casa; o de Rouxinol Júnior também ao Provedor e ao presidente da Câmara, Pedro Ribeiro; e dois dos forcados a Paula Borrego, da empresa patrocinadora desta e de muitas outras corridas de toiros.
Bem dirigida por Marco Cardoso, assessorado pelo médico veterinário José Luis da Cruz, a corrida de ontem em Almeirim é das que ficam a marcar esta temporada.
Rui Bento sai duplamente triunfador desta jornada: pelo êxito enorme da organização, pela lotação esgotada, pelo ambiente que uma vez mais conseguiu atrair às bancadas de Almeirim; e pela tarde de grande sucesso com que o seu cavaleiro Luis Rouxinol Júnior marcou esta passagem pela carismática praça ribatejana.
Fotos M. Alvarenga