Miguel Alvarenga - Três dias depois do Campo Pequeno cheio, foi agora a praça de Vila Franca igualmente cheia até às bandeiras, pouco terá faltado também para esgotar. Duas importantíssimas jornadas que muito engrandecem a Festa e dão a imagem verdadeira do enorme esplendor que se está a viver nesta temporada de muitos triunfos e casas cheias. Assim, sim!
As Festas do Colete Encarnado, o aguerrido mano-a-mano entre os primos rivais João Telles e Francisco Palha, a força do Grupo de Forcados de Vila Franca e a repetição nesta (sua) praça de Tomás Bastos, o novo ídolo da aficion vilafranquense, foram motivos de sobra para explicar a grande enchente que teve ontem a "Palha Blanco".
O empresário Ricardo Levesinho, finalmente recuperado de um problema de saúde que o manteve alguns dias retido em casa, merecia um triunfo destes. É um empresário com história e obra feita. Sofreu alguns desaires (financeiros, nomeadamente) no final da última temporada, de que se está finalmente a recompor - e, por tudo e por mais alguma coisa, mas sobretudo para calar os fala-baratos e os invejosos, foi muito bom este triunfo.
Mais: Ricardo é, há vários anos, o gestor ideal da praça de Vila Franca, a sua terra. Conhece como ninguém os desejos e os sentimentos da tão exigente aficion vilafranquense, sabe ir ao encontro do seu público e montar os cartéis que Vila Franca exige.
A corrida de ontem foi muito criticada pelos maldizentes do costume. Que não era uma corrida de toiros porque tinha dois cavaleiros profissionais e um novilheiro; que não se podia dar; que a IGAC a ia proibir; enfim, o bota-abaixo costumeiro.
Tomás Bastos toureou no fim dois novilhos-toiros de Paulo Caetano, com apresentação e trapio de toiros, muitíssimo superiores aos toiritos que muitos dos figurões de Espanha que às vezes nos visitam costumam por cá lidar. Digamos que as leis-sem-nexo que regem o espectáculo tauromáquico obrigaram a que fosse primeiro uma corrida de toiros (com dois cavaleiros de alternativa) e a seguir uma novilhada.
Não se entende. Tomás Bastos já debutou com picadores. É, por isso, novilheiro praticante. Se fosse cavaleiro praticante podia tourear com dois profissionais. Como não é cavaleiro, tem que ficar para "segundas núpcias" no cartel e tourear no final. Em terras de Portugal, as coisas são sempre ao contrário do normal...
Adiante.
Tomás Bastos assume desde o ano passado o estatuto de novo ídolo dos aficionados vilafranquenses. O público está com ele. Nem um espectador arrecadou pé da praça enquanto ele não acabou de tourear os dois novilhos.
Tem maneiras, tem garra, tem coração e tem cabeça de toureiro adulto. Os dois novilhos-toiros de Paulo Caetano foram "de bandeira", nem ninguém entendeu porque razão o ganadeiro (que estava representado por João Moura Caetano) não foi honrado com volta à arena no último.
Tomás Bastos esteve nos dois novilhos variado e bonito nos tércios de capote. Bandarilhou com poderio e emoção. E realizou duas brilhantes faenas de muleta com mando e temple, entrega e muito ofício. O público delirou com o jovem toureiro. Há muito que Vila Franca esperava um novo ídolo. Ele chegou finalmente!
Público de pé, entregue ao toureiro, a aclamá-lo nas voltas à arena que deu no final das duas faenas.
Podem ainda vê-lo no próximo dia 3 de Agosto na Nazaré (com Borja Jiménez, o triunfador de Madrid), a 10 de Setembro na Feira da Moita e em Outubro de novo em Vila Franca.
Na primeira parte actuaram os cavaleiros João Ribeiro Telles e Francisco Palha, que lidaram quatro toiros da ganadaria de Herdeiros de David Ribeiro Telles.
Mais bafejado pela sorte no seu lote, mas também a viver um momento altíssimo e de euforia permanente em todas as actuações, João Ribeiro Telles venceu ontem claramente o confronto com o primo Francisco Palha.
Muito bem a lidar, a pregar, a tourear e a cravar, esteve acima da média na lide do primeiro toiro, um bonito exemplar da ganadaria "da casa" muito bem apresentado (como os restantes), exigente e a transmitir emoção.
No segundo do seu lote, um toiro belíssimo, com teclas, a pedir contas, premiado com volta à arena do ganadeiro (deu-a Antonio Ribeiro Telles), João superou o êxito da primeira actuação, esteve verdadeiramente magistral, terminando com dois ferros de parar corações com o fantástico cavalo "Ilusionista". Um toureiro em momento altíssimo e a cavalgar em glória para o trono de grande triunfador desta temporada.
Francisco Palha, que vinha até aqui a cumprir campanha de alto gabarito e sucessivos triunfos, teve ontem azar com os toiros que lhe tocaram. Por outras palavras, bailou com as mais feias...
No segundo toiro da corrida andou uns furos abaixo do seu melhor, o toiro não era fácil, tinha complicações visíveis, mas Palhinha também complicou as coisas. Sofreu uma aparatosa queda, a música tocava, deixou de tocar e depois lá voltou a tocar, foi uma lide assim-assim, sem brilhantismo.
O quarto toiro era aquilo a que se pode chamar em gíria "um coirão". De investidas pouco claras, com perigo, meio manso, a querer refugiar-se em tábuas, a fugir à luta e a arrancar-se para "comer tudo".
Francisco Palha teve aqui uma actuação muito superior à primeira, pôs a carne no assador, foi à "guerra" para a vencer. Lide de muito esforço, de enorme entrega, de valor desmedido. Com os toiros maus se vêem os bons toureiros. E na lide deste quarto exemplar de Ribeiro Telles viu-se, de facto, um grande Toureiro! Olé, Palhinha!
Excelentes intervenções dos quatro bandarilheiros dos cavaleiros, Duarte Alegrete e António Telles Bastos (de Telles), Nuno Silva e Diogo Malafaia (de Palha), bem como da quadrilha de Tomás Bastos, composta por subalternos espanhóis, entre os quais o grande Fernando Sánchez.
Ou me engano muito, ou esta foi a primeira corrida da temporada do glorioso grupo de forcados Amadores de Vila Franca. Se o foi, não deixa de ser estranhíssimo que um grupo do calibre deste esteja até Julho sem pegar. É porque qualquer coisa não bate certa no Portugalzinho das Toiradas...
Seja como for, os Amadores de Vila Franca tiveram uma tarde de muita glória, à maneira antiga, à maneira de sempre. Mais logo, mostraremos, como de costume, as fotos todas das quatro pegas - todas elas à primeira tentativa, duras, emotivas e com o grupo a ajudar na perfeição.
Foram caras o cabo Vasco Pereira; João Maria Santos (que fez a última pega da sua carreira, sem contudo se despedir na forma tradicional de despir a jaqueta, etc., sendo muito justamente premiado com uma segunda volta à arena a sós); Lucas Gonçalves (com uma ajuda preciosa de Rodrigo Dotti, filho do antigo cabo Vasco Dotti, que o acompanhou na volta à arena); e Rodrigo Andrade, que fechou com chave de ouro com mais uma grande pega, com os companheiros a ajudarem coesos e em força. Grande Grupo em tarde enorme!
Dirigiu a corrida Tiago Tavares, com a competência, o rigor e a aficion de sempre, assessorado pelo médico veterinário Jorge Moreira da Silva, estando os toques a cargo de José Henriques.
No camarote presidencial assistiu Fernando Paulo Ferreira, presidente da Câmara de Vila Franca de Xira.
Fotos M. Alvarenga
Simplesmente magistral esteve João Telles ontem em V. Franca |
Terceiro toiro de R. Telles premiado com volta à arena do ganadeiro António com seu sobrinho João e os forcados vilafranquenses Lucas Gonçalves e Rodrigo Dotti (ajuda) |
Francisco Palha sofreu aparatosa colhida no segundo toiro da tarde. Felizmente, nem ele, nem o cavalo tiveram qualquer lesão. No quarto toiro, um manso perigoso, Palha esteve enorme |
Novo ídolo da aficion vilafranquense. triunfo grande e marcante de Tomás Bastos na sua primeira apresentação do ano em Portugal |