Meu Caro Rui Salvador,
Admiro-te, respeito-te, és diferente, há muitos anos, tantos. A terra dos nossos Pais é a mesma. Tomar das nossas vidas. Hoje apetecia-me escrever tanta coisa - e acredita que não consigo. Tenho pena que te vás embora. Mas tudo na vida tem um tempo e tu achaste que este era o teu para partires deste meio onde foste, em quarenta anos, indiscutivelmente, um dos primeiros.
A tua carreira é uma caminhada de glória, de profissionalismo, de entrega, de verdade sem histórias e sem mentiras, acima de tudo, Rui, de uma dignidade tremenda.
Hoje toureiam todos da mesma maneira, é tudo sempre igual e não há figuras com o interesse, a importância e o nível que Vocês tinham no teu tempo.
Não cortei de vez, mas cortei quase relações com o mundo actual da tauromaquia, que não tem nada a ver com o nosso, Rui, depois da aldrabice e da pouca vergonha que se passou no domingo em Vila Franca. Jurei para nunca mais. Não tenho a mínima das pachorras para ir ver touradas. Para o ano, posso ir às quatro do Campo Pequeno, que estão mesmo à minha porta, mas não sei se irei a mais.
Isto está tudo diferente. Falta dignidade. Falta classe. E há amadorismo a mais. O que aconteceu no domingo em Vila Franca mais parecia uma brincadeira de crianças. Imaturas, sem experiência, sem profissionalismo e, pior que tudo, sem o mínimo dos respeitos pelo público.
Há dias, foram 24 ou 25 almas fazer uma triste figura às galerias da Assembleia da República, preocupadíssimos com a investida do PAN contra as touradas, mas estando-se nas tintas para as investidas dos taurinos contra a Festa... Resultado: demonstraram a pouquíssima ou nenhuma força e a quase nula expressão que tem a tauromaquia. 24 almas sentadas lá em cima a olhar pró boneco. E os políticos lá em baixo a rir imenso. São só 24 os tipos dos bois?...
Hoje não vou a Vila Franca. Deus me livre de voltar. Vou antes ao jantar do 6º aniversário do meu neto. Mas não quis deixar de vir aqui dar-te um abraço, Rui. Dizer-te que foste diferente e foste um dos primeiros. E sais num momento altíssimo, em que podias cá andar mais dez ou vinte anos, não tenho dúvida em declarar que és, dos cavaleiros, o único e mais destacado grande triunfador desta temporada, assim como Marco Pérez e Tomás Bastos são os grandes triunfadores do toureio a pé, aqui de resto não se passou mais nada - sais, como eu saio mais depressa do que pensam, nem sei se o "Farpas" não acaba já no final do ano, assim que acabe o 15º aniversário da sua fundação, acho bem que é o melhor que faço, isto (esta Festa) já não interessa a ninguém e já não faz qualquer sentido que ainda exista.
Vamos embora, Rui, que isto já não interessa mesmo a ninguém. Mas saímos com o dever cumprido. E isso é o que importa. Saímos a tempo, que isto, não tarda, vai desmoronar tudo...
Obrigado por 40 anos de tanta glória, de tão elevado profissionalismo, de tantos exemplos e de tantas lições!
Fotos Luis Azevedo/Estúdio Z e M. Alvarenga