quinta-feira, 9 de abril de 2020

Morreu o emblemático campino Orlando Vicente - que aos 7 anos já tratava os toiros por tu

Orlando Rocha Vicente: um campino que o Ribatejo não esquece 
Em Vila Franca, na "Palha Blanco", com o bandarilheiro Ernesto Manuel e o
empresário Rui Levesinho
O matador de toiros Nuno Casquinha com o avô, que ontem visitou pela última
vez no Hospital de Vila Franca. Em baixo, Orlando Rocha Vicente com a cavaleira
Ana Batista, de quem era sogro


O Ribatejo e os Campinos estão de luto. Morreu Orlando Rocha Vicente, um dos seus mais emblemáticos protagonistas - que começou aos sete anos de idade a tratar os toiros e os cavalos por tu

Se há Homens que o Ribatejo nunca mais vai esquecer, Orlando Rocha Vicente é um deles.
Histórico campino, homem de confiança de algumas das mais afamadas casas agrícolas da Lezíria, equitador "fora do normal" e que "fazia coisas incríveis" quando se montava a cavalo e enfrentava os toiros, homem franzino e simples, mas com um coração de leão, Orlando Vicente morreu hoje aos 84 anos, vítima de prolongada doença.
Tinha-lhe sido detectado em tempos um cancro na próstata, mais recentemente uma hérnia veio complicar tudo ainda mais, foi operado há quatro dias no Hospital de Vila Franca, mas acabou por não resistir aos males que o vinham debilitando há já alguns anos. Nuno Casquinha, matador de toiros, seu neto, visitou-o ontem no hospital. Foi o último, da família, a vê-lo com vida.
Começou a trabalhar no campo aos sete anos de idade, acompanhando o pai. Em 2013, quando o homenageaaram na Feira de Maio na Azambuja, recordou ao jornal "O Mirante" alguns dos muitos episódios que ilustraram toda a sua história de vida:
"Uma vez na Feira de Santarém cada campino tinha três cavalos, um para a corrida, outro para a gincana dos fardos e outro para a condução de cabrestos. Eu só tinha uma égua para fazer todas as provas e queriam deixar-me de fora. Afinal, participei na corrida. Quando rebenta o tiro, um tenta encostar-me às varolas mas reagi e com um “hei” a égua dispara em velocidade e só parou na linha de meta, onde ficou sentada. Nessa feira, fui primeiro lugar também na gincana com os fardos e segundo com os cabrestos".
Em miúdo, pegou em arame e cordel e fez a cabeçada e o freio para um cavalo. De uma saca com palha, recorda o mesmo jornal, fez o arreio e de uma vara de charrua o pampilho. "Tinha nove anos e o senho de ser um grande campino", recordou a "O Mirante". E contou mais uma história:
“Um dia peguei na montada e a vara prendeu no chão e apanhou-me a cara com a outra ponta, caí ao chão mesmo frente a um toiro. Deu-me uma tareia que chegou para 14. Ao meu tio, que chegou depois, disse que tinha caído de uma oliveira. Só que um guarda da herdade contou-lhe a verdade, o meu pai veio a saber, e voltei a apanhá-las”.
Ao longo da sua tão preenchida vida no campo passou por várias casas agrícolas, entre as quais as de Tomás da Costa, Jaime Herculano, Conde Cabral, Fernando Palha, Moreira Rato, Prudêncio e Pinto Barreiros, onde esteve mais anos.
Em novo e no tempo da tropa foi também um apaixonado pelo ciclismo, chegando a fazer várias vezes o trajecto entre Pancas, Alcochete e a Amadora. "Não fui como o Alves Barbosa, corria bem e a subir fugia de todos", contou a "O Mirante" e disse: "Não sei que futuro teria em cima de duas rodas".
Mas no seu futuro estava escrito que seria em cima dos cavalos que se destacaria na vida. Orlando Vicente não foi só um dos mais emblemáticos campinos da lezíria ribatejana. Foi, principalmente, um equitador genial e ainda montava há bem pouco tempo, depois de aos 70 anos se ter reformado da sua apaixonada vida de campino. Natural de Castanheira do Ribatejo, residida no Porto Alto (Benavente) com sua Mulher, Isabel.
Orlando Rocha Vicente era casado com Isabel Alves da Silva e pai de quatro filhos, Pedro, Filipa, Orlando (casado com a cavaleira Ana Batista) e Glória (mãe do matador Nuno Casquinha). Era também avô dos bandarilheiros Diogo e Pedo Vicente.
As cerimónias fúnebres, dadas as restrições agora impostas pela pandemia do Covid-19, serão restritas e reservadas apenas aos familiares mais próximos.
A toda a Família enlutada, muito particularmente aos nossos queridos amigos Orlando, seus filhos, Ana Batista, Glória e Nuno Casquinha, endereçamos as mais sentidas condolências.
Que em paz descanse.

Fotos Emílio de Jesus/Arquivo e D.R.