quinta-feira, 9 de abril de 2020

Preso em casa numa cidade sem vida



Outro dia, os mesmos lugares, uma Lisboa deserta, igual a ontem, a anteontem e aos dias que já ficaram para trás. Começam hoje as medidas restritivas mais severas que proibem que os cidadãos saiam do seu concelho de residência. As forças de segurança estão na rua para evitar "fugas de Páscoa"

Miguel Alvarenga - Começa a ser desgastante. Nunca ninguém imaginou uma vida assim, fechados em casa, sem um restaurante para ir almoçar ou jantar, sem um bar ou uma esplanada onde ir beber um copo e conviver. Nunca imaginei uma curtíssima volta matinal aqui pela minha zona, o nosso Campo Pequeno e depois voltar a correr para casa e aqui ficar trancado o resto do dia. Vou falando com os amigos por telefone, mas falta-nos o convívio, falta sentirmos a presença uns dos outros.
De hoje a quarta-feira não se pode circular - quem tiver mesmo uma necessidade absoluta de circular, em vez de ficar em casa - fora do concelho de residência. As forças de segurança estão nas ruas e sobretudo nas estradas para evitar "fugas de Páscoa".
O dia amanheceu chuvoso e triste pela morte do emblemático campino Orlando Vicente, pai do meu amigo Orlando, avô do meu amigo Nuno Casquinha, um homem que foi diferente e marcou toda a história das lezírias, dos campinos, do Ribatejo que ele amava e de que foi um dos mais destacados ícones.
Ontem, como aqui referi - hoje em dia, as coisas mais simples e triviais deste mundo são notícia, à falta de outras... - veio cá a casa o amigo Luis Gomes cortar-me o cabelo, sinto-me melhor. Depois de aqui ter publicado a notícia, imaginem, o telefone dele não parou... Querem todos ajeitar o "pintiado" também!
O arrastar desta "guerra invisível" (não me tiram da cabeça que isto é mesmo uma guerra), sem tiros, sem canhões, sem bombardeiros, antes com um inimigo (químico?) que ninguém vislumbra, vai ter consequências trágicas para todos. Agora é mau, mas depois pode ainda ser pior, quando todos acordarmos de novo para vida e ainda não avistarmos perspectivas de voltarmos a ser como éramos.
Já o tenho escrito aqui muita vez, podem até voltar a haver touradas ainda este ano e Deus queiram que hajam, mas teremos vontade - e teremos dinheiro - para ir vê-las? E os empresários terão arrojo para as organizar nos próximos tempos? Oxalá que sim, mas cada vez tenho maiores dúvidas.
Já não acredito que vá haver concurso do Campo Pequeno e muito menos que haja empresários com vontade de arriscar "um tiro no escuro".
Dizem que em Espanha já se vai começar a voltar à vida normal depois de 26 de Abril. Oxalá seja mesmo. Nós, por cá, talvez só depois do final de Maio. E mesmo assim...
Continua a haver uma cada vez mais descontrolada desinformação em relação a tudo isto, uns dizem uma coisa, outras dizem outra, ora se deve usar máscara, ora não é preciso usar máscara. Agora dizem que depois desta muitas outras epidemias virão, todas diferentes umas das outras. Já não percebo nada. Sempre houve epidemias disto e daquilo, pessoas que foram contaminadas, outras que o não foram.
Enfim, continuamos! Eu continuo aqui. Fiquem em casa - leiam o "Farpas"... mesmo sem notícias daquelas de que todos gostamos. Agora são só notícias de que ninguém costa, corridas suspensas, feiras canceladas.
Fiquem bem.

Fotos M. Alvarenga