segunda-feira, 22 de setembro de 2014

Grande e emotiva tarde de toiros ontem em Elvas

Marcos Bastinhas (à esquerda, na foto, com Pedro Marques) ainda não recuperado
da lesão no nervo ocular provocada pelo cabo de uma bandarilha, foi ontem brindado
por seu Pai e pelos Forcados Académicos de Elvas. O regresso às arenas será só
na próxima temporada
João Moura parecia ontem, outra vez, o "niño prodígio" que um dia enlouqueceu
Madrid quando tinha apenas 16 anos...
Como o Vinho do Porto, ainda e sempre, Bastinhas! Duas grandes actuações ontem
em Elvas
Foto Manuel Ribeiro
Grandes e duras pegas dos Amadores de Montemor (foto de cima) e dos
Académicos de Elvas (foto de baixo) frente aos "comboios sem travões"
da ganadaria de Francisco Romão Tenório: em baixo, Sónia Matias, ainda e sempre
a Rainha do Toureio a Cavalo


Miguel Alvarenga - Com o Coliseu "Comendador Rondão de Almeida" praticamente cheio (três quartos fortes das bancadas bem preenchidos), viveu-se ontem uma tarde de grandes emoções em Elvas, na primeira das duas corridas da Feira de São Mateus, mercê não só das extraordinárias actuações dos veteranos João Moura e Joaquim Bastinhas e da irreverente Sónia Matias, mas também por obra e graça da valentia e da galhardia dos forcados de dois grandes grupos, os Amadores de Montemor e os Académicos de Elvas - e sobretudo pelo excelente jogo e comportamento dos muito bem apresentados toiros do prestigiado ganadeiro Francisco Romão Tenório. À excepção do segundo, manso e do último, que acabou por vir a menos, os exemplares da divisa de Arronches sairam nobres e com belíssimos sinais de bravura, proporcionando grandes lides e muita emoção nas pegas, já que pareciam "comboios sem travões" a atropelar os valentes forcados, que não tiveram ontem a vida facilitada.
A corrida teve ritmo, foi muito bem dirigida por Agostinho Borges, houve brindes ao ainda lesionado cavaleiro Marcos Bastinhas (que este ano já não vai tourear, depois de se ter ferido no nervo ocular com o cabo de uma bandarilha, no Verão em Albufeira) e também aos Forcados de Montemor pelos seus 75 anos (por parte dos companheiros do grupo de Elvas e do Maestro Bastinhas) e o público saíu satisfeito da praça e a comentar as incidências do espectáculo. Quando assim acontece, ganha a Festa.
O cartel, tal como outros a que já assistimos nesta fase final da temporada, trazia a mensagem de que "ainda são os antigos que levam gente às praças", o que, se por um lado, manifesta a continuidade da boa forma e do carisma de toureiros com mais de trinta anos de carreira, também é preocupante por significar que o futuro continua, salvo raras excepções, estagnado e em "banho maria", à espera que surja de repente uma figura, um ídolo que tarda em revelar-se.
Frente aos dois melhores toiros da tarde, o Maestro Moura recuou ontem no tempo e deu duas lições magistrais de bom toureiro, cheio de garra, de arte e de uma juventude que ainda marca e ainda faz lembrar o "niño prodígio" que mudou tudo na arte de tourear a cavalo. Em Elvas, ontem, o João Moura de cinquenta e picos anos parecia que tinha outra vez dezasseis, que renascera o "Ferrolho", que estávamos de novo em Las Ventas, em Santarém nos sete toiros, em Lisboa nas noites de glória e praça esgotada.
E o mesmo se pode dizer de outro Maestro, Joaquim Bastinhas, a cumprir trinta e um anos de alternativa, a tourear melhor que nunca, também ele a "virar o disco" para trás e a fazer-nos lembrar aqueles anos de ouro em que por cá apareceu para fazer a diferença e se tornar, com o passar dos anos, uma figura incontornável e insubstituível do mundo da tauromaquia. Os anos passam e a verdade é que os antigos estão como o Vinho do Porto, melhores e mais apurados. Bastinhas deu ontem a volta a um primeiro toiro mansote, obrigando-o a investir, sacando a faena impossível, com o saber e a experiência que fazem dele, ainda e sempre, um dos melhores e mais aplaudidos toureiros das nossas praças. No seu segundo, a música foi outra e assistimos a uma lide completa e perfeita, que não se descreve e se resumo com o facto de ter dado a volta à arena com o seu cavalo-craque- o que diz bem do triunfo que obteve.
Longe dos tempos-outros da sempre lembrada Conchita Cintrón, o toureio equestre no feminino terá sempre um antes e depois de Sónia Matias, que continua sendo o (a) expoente máximo (a) nesta arte. Já apareceram e desapareceram estrelas, mas Sónia mantém inalterável a sua permanência no trono das mulheres cavaleiras. A Rainha é ela. Ontem, voltou a triunfar - e com imensa força e enorme expressão - ao lado de suas máximas figuras, destacando-se pela ousadia, pela verdade, pelo risco e pela emoção que põe em todos os detalhes e em todas as sortes. Lidou os seus dois toiros com aprumo e tudo o que fez foi bem feito. O público esteve com ela do início ao fim, o que confirma o carisma e a popularidade da jovem toureira, um caso único na História da Tauromaquia, a viver este ano, sem margem para dúvidas, a grande temporada de absoluta consagração.
Enorme foi ontem o valor dos forcados de dois grandes grupos: Montemor e Académicos de Elvas. Os toiros de Romão Tenório mal os deixaram respirar, numa tarde duríssima para a valente rapaziada das jaquetas de ramagens. A nobre a tão portuguesa arte de pegar toiros teve ontem nas pegas dos dois grupos alentejanos a mais alta expressão da valentia e do heroísmo daqueles que são os últimos grandes românticos da Festa Brava.
Por Montemor, pegaram Manuel Dentinho (à segunda e que depois se viria a lesionar numa perna quando dava ajudas noutra pega, recolhendo ao hospital), Frederico Caldeira (numa intervenção verdadeiramente heróica, concretizando à quarta tentativa, depois de ter sido bem maltratado nas anteriores, mas como se nada se tivesse passado) e João Braga (à primeira, numa pega espectacular), havendo a destacar a intervenção pronta e oportuna de todos os elementos do grupo nas três brilhantes intervenções.
Pelos Académicos de Elvas, também grandes pegas por intermédio de André Bandeiras (com um par de braços do "outro mundo", à quarta). Tiago Caldeira (à segunda e que se despediu) e Afonso Martins (com um pegão à antiga, à primeira).
Tardes destas, toiros destes, toureiros e forcados como estes, fazem aficionados e mantêm acesa a chama da aficion num país e num meio onde vão sendo cada vez mais raras, infelizmente, tardes como a de ontem em Elvas. Olé para todos - sem esquecer as valiosas actuações de todos os bandarilheiros em praça!

Não perca: a grande fotoreportagem de Emílio de Jesus - os Momentos de Glória, as pegas uma a uma, os Famosos que ontem estiveram no Coliseu de Elvas e a festa, depois da corrida, na Herdade da Algramassa, da Família Bastinhas.

Fotos Hugo Teixeira/cortesia diariotaurino.blogspot.com