domingo, 25 de maio de 2025

Grande pega de João Camejo na festa dos 50 anos do Aposento da Moita

À antiga, como dantes: João Camejo outra vez!

Miguel Alvarenga - Podia ter eleito muitos títulos para encabeçar a história da tarde gloriosa dos Forcados do Aposento da Moita, na sua praça, que ontem quase encheram para comemorar meio século da sua brilhante trajectória, desde que aqui se estrearam, nesse dia 25 de Maio do ano revolucionário de 1975, comandados pelo emblemático José Manuel Pires da Costa, que nunca foi homem de esquerdas e nesse tempo decidiu formar novo grupo, já que o seu, o dos Amadores da Moita, andava de braço dado com essa rapaziada de Abril.

Podia ter eleito muitos títulos, pois podia, que motivos não faltaram ontem para enaltecer e aqui louvar, mas decidi homenagear os antigos, os que nos últimos cinquenta anos, e lembro-me de tantos, escreveram esta história de glória que Pires da Costa iniciou. 

Ontem estavam lá muitos. E muitos, também, estiveram na arena, a provar que quem sabe nunca esquece e que quem foi rei jamais perde a majestade. João Camejo foi um deles. Pegou com a raça e o valor de todos os tempos o segundo toiro da corrida, da ganadaria Conde de Murça, como sempre o fazia nos seus tempos, deu enorme lição - de arte, de valor, mas sobretudo de paixão e romantismo, que é isso que marca a diferença nos valentes que interpretam e defendem essa tão nobre e tão portuguesa arte de pegar toiros.

Brindou aos filhos, fez um pegão dos antigos e depois deu aplaudida volta à arena, com a simplicidade de sempre, acompanhado precisamente pela filha e pelo filho (foto de cima), e pelo cavaleiro Francisco Palha, que, como é um Senhor, teve no fim o bonito gesto de sair de cena e ainda bater as palmas a João Camejo, deixando-o no meio da praça, com os filhos, toda a gente de pé a aclamá-lo. Depois passou ali perto de mim, a sorrir, e perguntou aos mais novos: "Gostaram?".

Em tarde de muito calor e maiores emoções, a praça "Daniel do Nascimento", na Moita, registou ontem uma entrada de público superior à meia casa, a rondar os três quartos, na grande festa de comemoração do 50º aniversário dos Forcados do Aposento, grupo fundado há meio século e que ontem teve em praça 100 elementos, entre antigos e actuais, contando com muitos históricos que honraram e dignificaram aquela jaqueta de ramagens.

Leonardo Mathias, cabo nos últimos sete anos, fez ontem a sua última e grande pega, passando o testemunho ao novo "comandante" do Aposento, Luis Canto Moniz, que fez também uma pega brilhante a marcar a sua estreia como nono cabo desta histórica instituição de valentes, desde a sua fundação.

Momento alto foi, como acima referi, a grande pega ao segundo toiro da corrida, da ganadaria Conde de Murça, consumada pelo forcado retirado João Camejo à frente de uma formação composta quase toda por antigas glórias do grupo.

Destaque especial teve também o antigo cabo Tiago Ribeiro, que rabejou colossalmente quatro dos seis toiros e deu no quinto aplaudida volta à arena com André Silva (que dobrou Fernando Parente).

As seis pegas, cinco à primeira, menos a quinta, inicialmente tentada pelo veterano Fernando Parente (forcado retirado, que sofreu violento derrote e foi retirado da arena de maca, sendo, como acima se referiu, dobrado por André Silva, que consumou na sua primeira intervenção, segunda efectiva), foram momentos de grande emoção e provocaram verdadeiras explosões de aplausos nas bancadas.

João Freitas esteve brilhante na primeira pega, exibindo o grande poderio que lhe conhecemos; a segunda pega foi a de João Camejo, já acima referida; a terceira foi a última pega de Leonardo Mathias, brindada a todo o grupo e também a sua Mulher; a quarta foi a do novo cabo Luis Canto Moniz, que esteve enorme, como é seu costume; a quinta, também acima mencionada, foi consumada por André Silva a dobrar Fernando Parente; e a sexta foi executada, também com aplaudido brilhantismo, por António Ramalho, que se despediu e brindou esta última intervenção ao companheiro Nuno Mata.

Lidaram-se, por esta ordem, em concurso de ganadarias, toiros das divisas Murteira Grave (que ganhou o prémio de bravura), Conde de Murça, Herds. Varela Cujo, Mata-o-Demo, Veiga Teixeira (prémio de melhor apresentação) e Conde de la Corte.

Actuaram os cavaleiros Rui Fernandes, Francisco Palha e Tristão Ribeiro Telles Queiroz. Não houve propriamente um triunfador muito destacado que marcasse a diferença, estiveram os três em bom plano e a defender os seus respectivos estatutos.

Rui Fernandes toureou com maestria o bravo toiro de Murteira Grave, vencedor do concurso, exibindo a sua arte e a sua classe, mas acima de tudo a sua experiência e saber. Brega correcta, ferros emotivos, remates e adornos de bom gosto. O seu segundo toiro, da ganadaria Mata-o-Demo, com pouca força e sem grande transmissão, parado, distraído, não permitiu a Rui Fernandes repetir o brilhantismo da sua primeira actuação. Escutou música já na fase final, foi autorizado a dar a volta à arena, mas ficou, com toda a dignidade, entre tábuas, consciente de que sem ovos nunca foi possível fazer omeletas...

Francisco Palha lidou com primor e muita entrega o segundo toiro da tarde, da ganadaria Conde de Murça, bem apresentado, mas de jogo irregular, algo reservado. No quinto, um exigente e sério toiro de Veiga Teixeira (vencedor do prémio de apresentação), Palha emocionou o conclave com ferros de muita verdade, a pisar a linha de fogo, para mim os melhores ferros da corrida. Lide acima da média. Francisco Palha peca, às vezes, por alguma irregularidade, mas quando está bem, e ontem esteve, está bem a sério!

Tristão Ribeiro Telles Queiroz lidou os toiros de Herds. Varela Crujo e de Conde de la Corte. O primeiro, terceiro da ordem, foi um toiro que pediu contas e que dava "arreões", indo lá acima à procura do toureiro. Tristão esteve valente e ousado, emocionando o público pela sua entrega e pelo risco que coloca nas suas actuações. A fechar a corrida, lidou o toiro espanhol de Conde de la Corte, que foi dos seis o mais pequeno (455 quilos), mas teve comportamento de bravo, arrancando-se com alegria de todos os terrenos. O jovem Telles aproveitou a genica do toiro espanhol e rubricou uma lide emotiva e que chegou bem ao público, triunfando.

O júri que elegeu os toiros vencedores dos prémios bravura (Murteira Grave) e apresentação (Veiga Teixeira) esteve formado por elementos do Grupo de Forcados Amadores do Aposento da Moita, da Sociedade Moitense de Tauromaquia e do Clube Taurino da Moita.

Bem estiveram os seis bandarilheiros das quadrilhas dos cavaleiros: Hugo Silva e J. Paulo "Sevilhita" (de Rui Fernandes), Diogo Malafaia e João Oliveira (de Palha), o estilista Duarte Alegrete e Benito Moura (de Tristão).

Direcção de corrida muito acertada de Tiago Tavares, que esteve assessorado pelo médico veterinário Jorge Moreira da Silva, sendo José Henriques o cornetim de serviço.

Não acontecia há vinte anos na praça da Moita e foi também, é sempre, motivo de chamariz para levar público às bancadas, o cortejo de gala à antiga portuguesa, que começou no Largo da Câmara e subiu depois a avenida até à praça "Daniel do Nascimento", desfilando pela arena como acontecia antigamente nas Touradas Reais.

Tarde grande para os Forcados do Aposento da Moita, mas também para os três cavaleiros em praça, representantes de três distintas gerações, com toiros de respeito e muita emoção nas bancadas - em temporada, também, de comemoração do aniversário da inauguração desta praça, que aconteceu há 75 anos e vai ser celebrado com uma corrida especial no mês de Julho. Guardou-se ao início da corrida um respeitoso minuto de silêncio em memória dos forcados do grupo já falecidos.

Ainda que, ao que se sabe, sem responsabilidade total e absoluta na organização da corrida (repartida com os Forcados do Aposento), foi bom rever na trincheira o empresário Ricardo Levesinho, depois da tempestade de Outubro passado em Vila Franca. Foi sempre um empresário válido e que muitas vezes marcou a diferença. É na Moita, como o era em Vila Franca, o homem certo no lugar certo. Por morrer uma andorinha nunca acabou a Primavera. E Levesinho, felizmente, voltou ontem a voar.

Fotos M. Alvarenga

Cortejo de gala a evocar as Touradas Reais
100 forcados em praça no momento inicial da homenagem aos
50 anos do Aposento da Moita
O bravo toiro de Murteira Grave investindo no capote de Hugo Silva

A última grande pega de Leonardo Mathias...
... e o momento de emoção da passagem de testemunho ao novo
cabo Luis Canto Moniz
Ex-cabo Tiago Ribeiro deu show a rabejar quatro dos seis toiros
Maestria de Rui Fernandes na lide do toiro de Grave
Francisco Palha esteve imponente com o toiro de Veiga Teixeira
Tristão Telles Queiroz em mais uma tarde de grande afirmação