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Rui Salvador (que deu ontem lição de maestria) confirmou a alternativa a Emiliano Gamero, primeiro toureiro charro a protagonizar tal cerimónia em 130 anos de Campo Pequeno |
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Gonçalo Machado, dos Académicos de Elvas, ganhou ontem o Concurso de Pegas no Campo Pequeno |
Miguel Alvarenga - Vão longe os tempos em que a primeira corrida de Agosto, que era a da Imprensa, enchia o Campo Pequeno até às bandeiras. Mudaram-se os tempos, mudaram-se as vontades, como dizia Camões. Ontem à noite, a Catedral registou meia entrada forte para ver seis cavaleiros e três grupos de forcados que disputavam um concurso de pegas. A noite de homenagem aos Emigrantes e ao Turismo, segunda corrida da pequena temporada lisboeta, foi, mesmo assim, uma boa e diversificada noite de toiros, houve ambiente, o público aplaudiu seis estilos distintos e no fim saíu satisfeito. É o que faz falta.
Numa temporada com apenas quatro corridas, não faltou quem criticasse o elenco de ontem, alegando que Lisboa merecia mais e que as quatro noites de 2022 teriam que ser quatro grandes acontecimentos. Valha contudo a verdade que a corrida valeu a pena, ninguém saíu defraudado e acabou por ser uma boa noite de toiros. Contra factos, não há argumentos. Foi uma noite para todos os gostos. E sem desgostos.
Dois com pesos acima dos 600 quilos, os restantes todos com mais de 500, os toiros da ganadaria Vinhas não facilitaram a vida a ninguém. Sérios, a pedir contas e a "meter mudanças", foram sobretudo muito duros para os forcados. De melhor nota os lidados em segundo, quinto e sexto lugares. Complicado o primeiro, reservado o terceiro, perigoso o quarto. No último, o director de corrida João Cantinho premiou a ganadaria com volta à arena, que foi dada por Luis Vinhas.
O mexicano Emiliano Gamero confirmou a alternativa a abrir praça, como mandam as regras, sendo a primeira vez que um toureiro trajado de charro protagonizou tal cerimónia em 130 anos de História da primeira praça do país. Actuação digna, frente a um toiro complicado e matreiro a que Gamero deu a volta com habilidade e desenvoltura, chegando ao público. Teve direito a música só mesmo no fim, quando se apeou do cavalo...
No segundo toiro da corrida, de melhor nota, depois de ter sido presenteado pelo empresário Luis Miguel Pombeiro com uma lembrança (um boneco de Estremoz) pelos seus 38 anos de alternativa e pela Banda com os "Parabéns a Você", Rui Salvador deu uma lição de maestria, como se tivesse outra vez vinte anos. Lide primorosa, com brega arriscada e vistosa e ferros daqueles com que fez História em quase quatro décadas de carreira gloriosa. Salvador à antiga!
Manuel Telles Bastos enfrentou um toiro algo reservado e de investidas pouco francas. No início da lide e à saída de um ferro sofreu um ligeiro toque, o cavalo escorregou e caiu, assustando tudo e todos. Felizmente nada sofreu, nem o cavalo. Depressa se recompôs Manuel, impondo a sua arte e o seu valor frente a um toiro que dificultava. Terminou com dois belíssimos curtos com a marca do seu toureio clássico e de muito bom gosto.
Andrés Romero, rejoneador espanhol de méritos consagrados e já com muito cartel entre nós, teve pela frente o pior e mais perigoso toiro da corrida, também o mais pesado (650 quilos!). Valeu a sua muita raça, o bom toureio que pratica e os fantásticos cavalos que formam a sua quadra. Lide de esforço e de valor, a impor-se e a chegar ao público. Porque é bom. Um triunfo de casta.
Miguel Moura marcou a noite com uma arrojada sorte de gaiola, parando o toiro a dobrar-se "à Moura". O Vinhas teve qualidade e Miguel alcançou um êxito notável com brega muito bem executada e ferros que deixaram o público em alvoroço. Uma actuação marcante e a elevar bem alto a bandeira mourista - que será sempre diferente. De hoje a uma semana toureia em Madrid - e a expectativa é agora maior, depois deste sonante triunfo na Catedral Mundial do Toureio a Cavalo.
Fechou praça, frente a um toiro de nota alta, o sempre ousado António Prates, jovem cavaleiro que já deu provas do muito valor que tem. Lide brilhante, inteligente e bem desenhada em todas as sortes, com ferros de verdade, a entrar pelo toiro dentro, aproveitando ao máximo o excelente exemplar de Vinhas que tinha pela frente. Prates fechou a noite com chave de ouro e com um triunfo notável, a reafirmar neste regresso a Lisboa que é uma das estrelas mais cintilantes da nova vaga de cavaleiros nacionais. Muito bem, mesmo!
Estiveram bem todos os bandarilheiros, sem intervenções exageradas nas lides dos cavaleiros, com trabalho reforçado na colocação dos toiros para os forcados.
Gonçalo Machado, dos Académicos de Elvas, um forcado experiente e bom, fez ao sexto toiro da corrida a única pega da noite concretizada ao primeiro intento, com técnica e decisão, ganhando o prémio que estava em disputa para a melhor pega.
A decisão do júri, que era composto pelos cabos dos três grupos, foi recebida com alguma divisão de opiniões, depois da pega heróica de Rafael Pimenta, dos Amadores de Arronches, no toiro anterior. Há que reconhecer, contudo, que esta foi consumada à segunda, o que terá motivado o júri a premiar a de Gonçalo Machado, tecnicamente perfeita e executada à primeira.
Os Amadores da Moita pegaram o primeiro toiro por intermédio de David Solo (à segunda) e o quarto, com Fábio Silva na cara numa duríssima pega concretizada só à quinta e a sesgo.
Pelo Grupo de Arronches pegou Luis Marques (à quarta) e depois o já referido Rafael Pimenta, numa pega emotiva e de valor imenso, à segunda.
Os Académicos de Elvas, vencedores deste Concurso de Pegas, tinham pegado também o terceiro toiro da corrida, com uma aplaudida intervenção de Paulo Maurício ao segundo intento.
Assistiu à corrida numa barreira, acompanhado de sua Mulher e seus filhos, o matador Joselito Adame, primeiríssima figura do México, a quem Andrés Romero brindou a sua actuação.
João Cantinho dirigiu esta corrida com rigor e aficion, assessorado pelo médico veterinário Jorge Moreira da Silva.
A corrida teve ritmo, era escusado o intervalo (bons tempos da pandemia em que tudo era muito mais rápido) e como nota negativa há apenas a lamentar a caótica aparelhagem sonora da primeira praça do país, uma vergonha autêntica. Bem pregou António Lúcio, mas ninguém entendeu patavina do que ele disse...
Mais logo, ao longo do dia, vamos trazer-lhe as sequências das seis pegas, os melhores momentos dos seis cavaleiros e as fotos dos Famosos que ontem não terão dado por perdido o seu tempo no Campo Pequeno. A corrida foi animada, diversificada e divertida.
Venha a terceira!
Fotos M. Alvarenga
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O matador Joselito Adame, primeiríssima figura do México, esteve ontem no Campo Pequeno e foi brindado por Romero |