Morante de la Puebla (na foto, fumando o seu puro no último sábado, na Quinta da Broa, de Manuel Veiga, na Golegã) falou ao "Farpas" depois da memorável tarde da Chamusca e no final da mais histórica e mais marcante de todas as temporadas da sua carreira, em que se consagrou como Rei absoluto do toureio actual
Entrevista de Miguel Alvarenga
27 anos depois do seu debute como novilheiro em Guillena, Sevilha (1994) e 24 depois da sua alternativa em Burgos (1997), apadrinhado por César Rincón com o testemunho de Fernando Cepeda, José António Morante Camacho (42 anos), que todos conhecem por Morante de la Puebla, referenciado como o maior génio do toureio actual, chega ao fim deste segundo ano da pandemia, pela primeira vez na sua carreira, como líder do escalafón e consagra-se, de uma vez por todas, como Rei do Toureio a Pé.
"Foi uma temporada especial e complicada também", considera o toureiro, falando deste ano histórico. O primeiro em que teve a seu lado, como apoderado e grande estratego desta campanha, aquele que era já há muitos anos o seu melhor amigo: o português Pedro Marques.
No último sábado, viveram ambos uma tarde feliz - e triunfal - pelo grande sucesso do festival taurino que os dois organizaram na Chamusca, juntamente com Nuno Castelão, provedor da Santa Casa, para homenagear a memória do eterno Ricardo Chibanga, que Morante conheceu um dia em Portugal e de quem se tornou amigo e admirador, como ele próprio hoje nos conta.
Morante regressou a La Puebla del Rio, onde nasceu e onde vive. Mas antes deu esta entrevista ao "Farpas". Depois seguirá para o México, onde a 12 de Dezembro se apresenta na Monumental. E para o ano promete voltar a Portugal, onde esta temporada e para lá do clamoroso triunfo de sábado na Chamusca, deixara já tudo e todos encantados com duas faenas de arte na Feira de Moita - onde, curiosamente, ficou deserto o prémio da Sociedade Moitense de Tauromaquia para a melhor faena do ciclo...
Uma das perguntas que fiz a Morante abordava precisamente essa estranha ocorrência. Pedi-lhe que comentasse. Mas José António preferiu não falar sobre o assunto. Encolheu os ombros e sorriu.
Vamos ouvir o génio.
- Maestro, começo pela distinção que lhe foi feita pelo Governo de Espanha (Ministério da Cultura) e que ontem mesmo foi conhecida. Ganhou o importante Prémio Nacional de Tauromaquia. Como recebeu a notícia?
- Recebi-a com muita alegria, pela importância que tem e porque me permite ajudar a Casa da Misericórdia de Pamplona, com a doação do valor do prémio (30 mil euros), já que esta instituição vive maioritariamente dos ingressos dos Sanfermines, festas que há dois anos não se celebram.
- E passamos à Chamusca. Obrigado, Maestro Morante, como já escrevi, pelo empenho, pelo carinho e pelo grande profissionalismo com que ajudou a levar por diante esta homenagem tão merecida à memória do nosso querido Ricardo Chibanga. Sentiu que o precisava de fazer pela grande admiração que tinha por ele, foi?
- Foi. Conheci Ricardo Chibanga numa das minhas visitas ao vosso país e fascinou-me a sua condição humana, a sua bondade. Contou-me a história da sua vida e pareceu-me interessantíssima. Falando com aficionados, apercebi-me que era um símbolo e um marco da história do toureio português e por isso a sua memória tinha que ser lembrada. A minha ligação a Portugal é cada vez mais forte, tenho um número enorme de partidários e amigos que vejo nas minhas corridas e é inevitável que este laço seja cada vez mais importante. Prova disso é a forma tão carinhosa com que me tratam sempre que piso Portugal e, em especial, no sábado passado, dia em que notei um agradecimento ainda maior pelo que tinha ajudado a concretizar.
- Foi um festival fantástico, uma tarde daquelas que fazem aficionados!
- Foi uma tarde muito bonita, com uma moldura humana magnífica, com aficionados que souberam responder aos momentos de bom toureiro e com uma organização que não poupou esforços para que tudo corresse da melhor maneira. Por parte da Misericórdia, o provedor Nuno Castelão foi incansável e realmente conseguiu que nos sentíssemos atendidos e respeitados. Tanto eu como os meus companheiros desfrutámos e ficámos com vontade de voltar. Sempre que se organizam eventos deste carácter é importante a mobilização da população e isso foi o que aconteceu. O empenho da Misericórdia, da Família Veiga, assim como dos demais toureiros, ganaderos e autoridades locais, foram a chave para o êxito.
- Esta foi a grande temporada de absoluta consagração de Morante como o nº 1 do toureio actual?
- Foi uma temporada especial e complicada. O tema das restrições e demais medidas de prevenção, a dificuldade dos aficionados se moverem e alojarem... tudo se via complicado. Acabei em primeiro lugar no escalafón pela primeira vez na minha carreira, o que me faz muita ilusão, mas realmente a regularidade foi o grande marco da minha temporada. Fiz apostas que sairam bem, umas melhores que outras, e o final com os marcos de Sevilha e Madrid deram ainda mais importância ao ano 2021.
- E para terminar, diga-me se já há algum contacto para voltar a Portugal na próxima temporada.
- Sempre tenho na minha cabeça tourear em Portugal, também para dar importância ao toureio num país tão irmão como o vosso. Ao longo da minha carreira vivi no vosso país actuações marcantes e que também ajudaram à festa dos toiros. Quanto ao próximo ano, é um assunto que leva Pedro, mas estou seguro que tanto eu como ele ajudaremos para que possa regressar.
Fotos Juanfran e D.R.