Miguel Alvarenga - A apoteótica explosão de Miguel Moura (foto de cima) no último toiro da noite, quando o desespero de termos estado ali a ver quase nada já se apoderava de todos nós, virou do avesso a pasmaceira que foi a corrida de ontem em Salvaterra de Magos - que estava, até ali, condenada a ser mais uma igual a tantas, por obra e (des)graça da mansidão e da falta de classe dos toiros (com bonito trapio, mas chatos até dizer chega!) da ganadaria Vale de Sorraia.
A primeira parte da corrida não teve história, exceptuando as excelentes actuações, nas pegas, dos forcados de Santarém e Ribatejo. Já lá iremos.
António Telles lidou com o saber de sempre um toiro manso e de estranhas investidas, distraído, como o foram os outros; impôs o Mestre a sua experiência, mas não tinha pela frente matéria prima para o êxito.
Luis Rouxinol teve igual sorte (azar). Enfrentou outro manso sem opções e que ainda para mais se adiantava. Valeu também a muita experiência do cavaleiro. No final, tentou por duas vezes cravar um ferro em sorte de violino, mas não conseguiu e pôr o ferro de frente. Não quis dar volta à arena.
Miguel Moura fechou a primeira parte da corrida cheio de vontade e boas intenções, mas também sem toiro. Até ali, exceptuando as pegas, foi uma chatice das antigas...
Os toiros até tinham trapio, impunham algum respeito exactamente pela presença que tinham, mas eram mansos perdidos, distraídos, sonsos, com vontade de ir embora, sem quererem luta. Para os forcados, investiram mal os viam, mas não derrotaram, não fizeram mal, foram - com força - pelo seu caminho, com nobreza.
Ao intervalo, a nova comissão gestora da praça de Salvaterra de Magos homenageou António Telles pelos seus 40 anos de alternativa. Ontem mesmo, dia 21 de Julho, passavam quatro décadas da noite histórica em que António tomou a alternativa no Campo Pequeno apadrinhado por seu Pai, o saudoso Mestre David Ribeiro Telles.
Os três Sorraias da segunda parte tiveram um pouco mais de empenho. E os toureiros também.
Boa lide, excelente brega e emotivos ferros com o selo de verdade do Mestre António Telles, assim se toureia! Também mais inspirado e cheio de raça, Luis Rouxinol empolgou neste seu segundo toiro, com mais transmissão e alguma qualidade, terminando com um brilhante par, a marca da casa.
E depois veio Miguel Moura. E deu-se por fim a explosão. A explosão porque esperámos a noite toda, com a corrida praticamente condenada a ter sido só mais uma. A explosão por que lutava há anos o Miguel, com a difícil tarefa às costas de ser "mais um Moura", num mundo onde já havia o Maestro e o irmão João, que, de todos, é o primeiro.
Miguel Moura vinha-se impondo nas últimas temporadas e sobretudo nesta, vinha rompendo de corrida em corrida, como que a dizer "estou aqui", mais que isso, "também estou aqui!".
E com o triunfo apoteótico de ontem neste sexto e último toiro, o melhor da corrida, afirmou-se de vez, indiscutivelmente, entre os do pelotão da frente. Deixou de ser o "segundo Moura", para passar agora a ser ele próprio, Miguel Moura, por fim Figura do Toureio!
Arriscou, pôs a carne no assador, arrepiou tudo e todos nos ladeios a um milímetro do toiro, virando-se de repente, cravando com batida ao píton contrário, espectacular, empolgando o público, que não o deixava ir embora.
Triunfo importante e decisivo - a consagrar finalmente Miguel Moura, depois de tantos anos de luta, como Figura entre os da frente e já nunca mais como o "outro Moura". Que suba agora aos primeiros patamares da temporada, aos grandes cartéis de alta competição - porque o merece. E está pronto para tudo!
Nota alta para o desempenho - e a arte - dos seis bons (belíssimos) bandarilheiros das quadrilhas dos três cavaleiros: João Ribeiro "Curro" e António Telles Bastos (de Telles), Manuel dos Santos "Becas" e João Bretes (de Rouxinol) e Nuno Silva "Rubio" e João Oliveira (de Moura).
Esta segunda corrida da temporada em Salvaterra de Magos, praça agora gerida por uma comissão de bons e empenhados aficionados locais - a que se juntou o dinâmico empresário Luis Pires dos Santos - registou uma agradável entrada de mais de meia casa, a rondar os dois terços da lotação preenchidos.
Nas pegas estiveram os Amadores de Santarém - a rodar novos valores - e os Amadores do Ribatejo, tendo estes pegado apenas dois toiros, porque o sexto se inutilizou (ou pareceu que se inutilizou...) e recolheu aos currais sem ser pegado. Já a seguir, vamos referi-las em pormenor e mostrar as sequências das cinco pegas. Fique por aqui.
A corrida foi bem dirigida por Manuel Gama, que esteve assessorado pelo médico veterinário José Luis da Cruz.
Ao início, guardou-se um minuto de silêncio em memória do antigo cavaleiro Rui Alexandre, que esta quarta-feira foi assassinado a tiro em Bogotá, na Colômbia, onde vivia desde 2016.
Fotos M. Alvarenga
António Telles e Luis Rouxinol |