São maus os homens dos toiros. E regozijam-se, ficam (assustadoramente) felizes, com o mal dos outros. Ricardo Levesinho, empresário dos da linha da frente desde 2008, passou por um mau bocado, financeiro e de saúde, no último Inverno - e foi um instante enquanto passou de bestial a besta. Crucificaram-no na praça pública, vaticinaram (e alguns até festejaram…) o seu “estoiro” empresarial. Mas Ricardo deu a volta por cima e acaba de anunciar duas “feiras taurinas de estrondo” na Moita (em Setembro) e em Vila Franca (em Outubro). Está de volta. Aliás, nunca esteve de partida. Tem arte, tem coragem, tem valor e é sério, empreendedor e imaginativo nos cartéis que monta, coisa que muitos “se esquecem” de ser. Vamos a uma entrevista, Ricardo? - desafiei-o. “O que queira e como queira!”, respondeu sem hesitar. Mas não vamos falar só das feiras da Moita e de Vila Franca. Vamos falar de tudo e, sobretudo, das muitas histórias que sobre si se falam por aí, certo? “Certíssimo!”, respondeu. E assim, aqui está a entrevista por que todos esperavam. Sem rodeios e sem entrelinhas. Tudo direito e sem linhas tortas. Ricardo Levesinho por ele próprio. No tempo da bonança, depois da tempestade.
Entrevista de Miguel Alvarenga
- Meio estranho, este ano, o facto de as corridas da Feira da Moita serem dia-sim, dia-não, a primeira na terça 10 de Setembro, a segunda na quinta 12 e a terceira no sábado 14, mais a novilhada no domingo 15. Creio que é a primeira vez que tem este formato. Alguma razão especial?
- No passado ano foi exactamente assim, com excepção da novilhada, que desta vez entendemos preferível de forma a cativar mais público no apoio e fomento aos jovens toureiros e ao trabalho fantástico da Escola de Toureio e Tauromaquia da Moita, que se realizasse no domingo, colocando assim ponto final as Festas!
- No primeiro dia, ou antes, na primeira noite, o regresso de Morante com o matador moitense “Cuqui” na Corrida do Município, com dois cavaleiros veteranos, António Telles e Luis Rouxinol. É o cartel sonhado para abrir a feira?
- Ter em Portugal e, em especial nas praças que temos a responsabilidade de gerir, a grande figura de Morante, desculpem a sensibilidade pessoal, mas é o máximo que podíamos alcançar. E ter ao seu lado dois fantásticos toureiros com uma carreira maravilhosa, no caso do António Ribeiro Telles e Luís Rouxinol, sinto que estamos a transbordar de categoria e de classe. A acompanhar está “Cuqui”, um caso de compromisso, profissionalismo e de uma incrível luta diária para conseguir chegar ao patamar que sempre sonhou e que entendemos ser obrigatório e de grande sensibilidade criar oportunidades para potencializar as hipóteses de se singrar no panorama mundial.
Não podia deixar de referir as ganadarias escolhidas. Veiga Teixeira, uma das mais destacadas do nosso país, sendo os seus exemplares lidados a cavalo; e de Paulo Caetano e Álvaro Nuñez, com resultados fantásticos nos últimos tempos, e aqui agradeço a Morante, que pediu desde sempre a existência de ganadarias portuguesas e nesta corrida lidará um exemplar de cada ganadaria, à semelhança de “Cuqui”.
Esta noite será de homenagem a “Toino de Sarilhos”, histórico cabo do Grupo de Forcados Amadores da Moita, que pega nesta primeira corrida; e também a Manuel Jacinto, pelo 50º aniversário de sua alternativa.
- E depois de uma muito bem montada “corrida dos cavaleiros” na quinta-feira com os dois primeiros da nova vaga, Moura Jr. e João Telles, e a nova estrela Duarte Fernandes (triunfador da feira do ano passado e triunfador no passado domingo em Madrid) na habitual noite de exaltação dos Forcados do Aposento, deixou de haver na sexta a Corrida do Fogareiro, mas teremos uma de seis cavaleiros, variada e com diversos estilos, no sábado. Entretanto, há algumas ausências notadas, por exemplo, as de Filipe Gonçalves, de Tristão Telles Queiroz (que até é apoderado pela vossa empresa)… quer comentar?
- Como se podia falar de muitos mais nomes, onde até destacaria desde logo Rui Salvador, que estava desde o início nos nosso planos, mas a indisponibilidade do toureiro não permitiu estar presente, com enorme pena nossa.
- Quem não contratou e gostava de ter contratado para a Feira da Moita?
- Confesso que Diego Ventura e Pedrito de Portugal, mas não foi possível por razões diferentes.
- Que razões? Pode-se saber?
- O primeiro, porque entendeu que este ano a sua temporada não passaria por Portugal; e o segundo, por não conseguirmos reunir todas as novas condições que o seu representante impôs, após o acordo já anteriormente efectuado. Essas condições não estavam nas nossas mãos serem conseguidas e infelizmente, porque tivemos todo o interesse, desde o contacto inicial efectuado até ao limite das nossas forças, mas foi impossível!
- Lembro-me da sua chegada à Festa, na altura com um “padrinho” de grande gabarito, o nosso querido Manuel Gonçalves. Isso foi há quantos anos, Ricardo? Lembra-se da primeira corrida que montou?
- Em 2008, Manuel Gonçalves acarinhou-me desde o primeiro momento em que nos conhecemos e recordo-me bem desse momento, que foi patrocinado pelo António Lúcio. E olhe que na primeira reunião que tivemos fui colocado na rua de sua casa, porque ele achava que eu estava a aprender muito depressa a negociar, dizia ele (risos)… A partir daí, surgiu uma relação muito boa e de alguma aproximação, que eu precisei, porque me fez ver um pouco o negócio taurino, bem diferente de outras actividades que eu conhecia e por isso lhe serei sempre grato. A ele, ao Sr. Mário Freire e ao Mestre David.
A primeira corrida que organizei foi no dia 30 de Setembro de 2006. No Alandroal/Aldeia da Venda. Toiros de Falé Filipe para Joaquim Bastinhas, Luís Rouxinol e Marcos Bastinhas. Forcados de Portalegre e Alandroal.
- Nestes anos todos, ganhou amigos e também “ganhou” inimigos. Pensava que o meio taurino era assim uma coisa tão complicada?
- Se uma pessoa tem opinião e defende os ideais em que acredita, às vezes complica… mas decerto que o erro deve ser meu, que talvez devesse ter mais flexibilidade.
- Este ano surgiram à boca cheia nos corredores da Festa histórias que o Ricardo tinha “estoirado” como empresário taurino e que ia acabar a sua actividade…
- Olhe, Miguel, acho que não deveremos desperdiçar energias, mas sim nos focarmos no que é importante. Já viu bem as duas fantásticas feiras? Temos que ter a grandeza de sentirmos o toureio de grandes intérpretes que, felizmente, vão estar entre nós. Morante de la Puebla, o génio e toureio que marcará para sempre a tauromaquia, que vai estar na Moita; Daniel Luque, o grande triunfador de Sevilla e de tantas outras feiras, que estará em Vila Franca com “Juanito”; e o novo fenómeno Marco Perez, que ainda não se apresentou em Portugal e vamos ver finalmente na “Palha Blanco” em Outubro! Toureiros que irão estar ao lado da grande esperança do toureio a pé nacional dos últimos 30 anos e ainda das maiores figuras do toureio nacionais como António Ribeiro Telles, Luís Rouxinol, João Moura, João Ribeiro Telles, Francisco Palha e tantos outros de qualidade de destaque. É aqui que nos devemos focar e trabalhar ao máximo para que sejam grandes espectáculos e que o aficionado saia emocionado e feliz!
- Respondeu… sem responder, mas disse tudo! Na realidade, é preferível que estejamos centrados e focados no que é importante e que ignoremos as “bocas da reacção”…
- É forte dizer que uma pessoa “estoirou”. E eu, graças a Deus, não “estoirei”. Estou de pé e na luta, como sempre!
- O que mudava hoje na tauromaquia nacional?
- Profissionalismo, respeito e união! Para ser profissional não basta viver da tauromaquia a 100 por cento, porque isso não garante qualidade. Ser profissional é ser focado, dedicado, querer vencer, querer ser o melhor através das armas positivas ao seu alcance e temos felizmente exemplos tão bons como Santarém, Cartaxo e outras organizações que, não sendo profissionais no sentido da palavra da dedicação a 100 por dento, são associações que lutam pelo bem da tauromaquia.
Respeito pelo próximo e por si mesmo. Todos somos culpados pelo momento em que se encontra a Festa! Todos mesmo! Deveríamos concentrar-nos mais no foco e não no ego!
União porque, a existir e com um público fantástico e apaixonado que “atura” tanta coisa má e mesmo assim está sempre presente, nos tornaria uma força inatacável e com um futuro muito mais garantido do que o que temos no dia de hoje! Quero acreditar que ainda temos tempo! Luto por isso!
Fotos M. Alvarenga