Vitor Mendes foi ontem à tarde surpreendido em Fregenal de la Sierra, onde acompanhava "Juanito" (que apodera juntamente com Joaquín Domínguez) em mais uma tarde de grande apoteose, com a notícia da morte de Gonzalo Sánchez Conde "Gonzalito", aos 90 anos, o taurino que o descobriu, o levou para Espanha e o lançou.
O final da relação entre ambos, como alguns saberão, mas muitos talvez desconheçam, foi atribulado e complicado, depois de muitos anos lado-a-lado. Já a caminho de Madrid, onde vive, depois da corrida de ontem à tarde, o Maestro Mendes aceitou o convite do "Farpas" para prestar algumas declarações sobre a figura do seu ex-apoderado, esquecendo os momentos menos agradáveis que envolveram o fim de uma grande amizade e demonstrando, uma vez mais, o seu grande carácter, o sentido da gratidão e o reconhecimento pela personalidade daquele que considerou um dos últimos grandes representantes de uma época de taurinismo e de grande romantismo na Festa.
Fiquem com as palavras, sentidas e proferidas com alguma emoção e comoção, pelo Maestro Vitor Mendes:
“Foi uma notícia muito triste, a da morte de Gonzalo Sánchez ‘Gonzalito’. O que ele representou para mim, como profissional do toureio, foi o que ele representou para o mundo taurino em geral, essencialmente como representante de uma época de taurinismo, de grandes taurinos entendidos na matéria, relacionados com o grande ambiente desse tempo, foi uma época exclusiva, única, que se viveu no mundo dos toiros, essa época dos anos 60, 70, 80 e, comigo até 90, que foi quando ele terminou. O ‘Gonzalito’ estava já doente, tinha problemas cardíacos, fazia hemodiálise. Mas a verdade é que deixa enormes recordações. Pela sua graça, pelo seu carisma, pelo seu grande profissionalismo. Pela esperteza e grande capacidade, pela experiência que tinha para adiantar as opiniões e eventualmente adivinhar e profetizar o que ia acontecer, era um homem com uma capacidade imensa e a todo o lado onde ia tinha esse dom e essa particularidade de fazer amigos, de cativar e criar empatia com todo o mundo” - evoca o Maestro. E acrescenta:
"Tive a oportunidade de viver com ele uma época extraordinária. Ele, com o Maestro Curro Romero, era unha com carne, como se costuma dizer, e dedicou-se com alma e coração à minha pessoa quando me conheceu em Portugal e quando me convidou, já lá vão 45 anos, para vir para Espanha e tentar a sorte para ser matador de toiros, prometendo que me ajudaria e foi uma pessoa à parte na minha trajectória profissional".
"É uma pena, é todo um ciclo que se fecha, é toda uma época e uma geração que se vai secando pouco a pouco com o falecimento destes taurinos, agora com 80 e 90 anos, ainda perduram alguns, mas é, na realidade, o fechar de uma época de sonho, uma época romântica do toureiro, também. E o ‘Gonzalito’ era um exemplo de tudo isso e um grande profissional como moço de espadas, um homem carismático, com o seu talento, com a sua graça, cantador de rumblas flamencas e um apaixonado e um exemplo do sentir e do ser andaluz, ele era de Gibraleón, entre Cádiz e Huelva, e aportava isso, nunca prescindiu precisamente da sua vertente andaluza", recorda Vitor Mendes, sem deixar esconder alguma emoção nas suas palavras.
E, a terminar:
"Que descanse em paz. Para mim foi um homem importantíssimo, que me ajudou e muito, era um homem que me motivada e que me empurrava, que procurava que as coisas nunca falhassem e estivessem sempre ao melhor nível. Esses momentos que vivemos juntos, tanto nos êxitos, como nos fracassos, que também tive alguns, felizmente menos que os êxitos, ele esteve sempre a meu lado com o mesmo ânimo e dando-me o maior apoio e a maior motivação. Estava sempre ali, sempre com essa capacidade e com essa graciosidade que tinha como pessoa. A família taurina está de luto, essencialmente em Espanha, mas ele tinha amigos também no México, no Equador, no Peru, no Equador, era um homem muito querido em todo o lado. O mais que posso dizer é pedir a Deus que o receba em paz, que descanse em paz e que o mais bonito de tudo é passar pela vida deixando referências e o ‘Gonzalito’ deixou referências, como grande profissional e como pessoa também. Descanse em paz”.
Fotos M. Alvarenga e D.R.