quarta-feira, 13 de maio de 2020

Há 116 anos: Fernando de Oliveira foi o primeiro toureiro a morrer na arena do Campo Pequeno

Há 116 anos a revista "O Século Ilustrado" retratou
assim o momento da colhida mortal do cavaleiro
Fernando de Oliveira no Campo Pequeno
No antigo (e desaparecido) Museu Taurino da
praça do Campo Pequeno estava exposto (vitrine
da esquerda) a casaca que Fernando de Oliveira
vestia na tarde da sua morte
Homenagem da empresa do Campo Pequeno
no ano das comemorações do 125º aniversário
da inauguração da praça


Na tarde de 12 de Maio de 1904, cumpriram-se ontem 116 anos, foi mortalmente colhido o cavaleiro Fernando de Oliveira na praça do Campo Pequeno, o primeiro toureiro a perder a vida na arena da praça de toiros de Lisboa, que fora inaugurada doze anos antes

"Ferrador", um toiro da ganadaria do Marquês de Castelo Melhor, atingiu o cavalo de Fernando de Oliveira, o "Azeitona", derrubando-o com estrépito. O cavaleiro, que tinha 45 anos e fora o primeiro a receber a alternativa na nova praça de toiros de Lisboa, em cuja corrida inaugural actuara a 18 de Agosto de 1892, bateu com a cabeça no solo, fracturando a base do crânio. A morte foi quase instantânea. 
O jornalista Norberto de Araújo descreveu assim na revista "O Século Ilustrado" a trágica colhida mortal de Fernando Oliveira, primeiro toureiro a perder a vítima na arena da Monumental de Lisboa:

"Fernando de Oliveira, que recebera a farpa da mão do espanhol Currinche, um bandarilheiro castelhano e medíocre, passa pelo sector 1, onde os amigos, debruçados sobre as capas, azul uma, branca outra, de Manuel dos Santos e Tomás da Rocha, o aplaudem; sorri vagamente a Bombita Chico, depois o famoso Ricardo Bombita, que da trincheira, ao lado de Chicuelo, segue a jornada do cavalo; saúda com mal disfarçado respeito as Majestades que olham o redondel distraidamente - e toma à esquerda o lugar para a gaiola. O Ferrador endireitou ao vulto do capote de Teodoro e a gaiola falhou para o cavaleiro. (...)
"E que lindo vai agora o Azeitona, numa meia volta que Fernando de Oliveira remata com o seu brilhantismo peculiar! Mas o toiro é tardo e difícil. Fernando já saiu em falso duas vezes... É preciso apertar. Das barreiras, dos sectores de sombra e sombra-sol incitam-no. Há um pequeno silêncio no circo. Vai outra meia volta, e adivinha-se perigosa.
"O toiro está nos tércios, em frente do sector 6, sombra-sol, e Morenito, um espanhol de Bombita, atira-lhe o capote. O toiro coloca-se, ainda que apertado. Fernando dá então uma sacudidela ao cavalo, que larga, enquanto a voz possante do cavaleiro incita o bicho - que se volta a sorte. O cavaleiro, corajosamente, remata, mas remata consentindo, isto é, deixando o toiro entrar muito. Cravou o ferro. Há um frémito, agora... O toiro colhera o ginete pela anca e, na violência da pancada, o Azeitona tombou, desequilibrou-se, foi ao solo. Já grita a praça em peso, aos capotes. Correm os espanhóis, porque tudo fora num segundo, pouco mais que num segundo. O cavaleiro saíra pela cabeça do cavalo, e está agora debaixo da montada, aquela montada gentil e donairosa, esperança do cavaleiro para breve, e que o toiro carrega, numa fúria, numa violência.
"Por momentos está tudo de pé, nos sectores. Os capotes são inúteis; quase é preciso puxar o bicho, que alfim deixa a presa, já quando Fernando de Oliveira, sangrando da cabeça, com as abas da casaca vermelha voltadas sobre as costas - não dava acordo de si. O cavalo, sem governo, corre desordenadamente a praça. Todos os capotes estão agora em cena. Fernando é levado para a enfermaria. Pela praça vai um frio de morte". 


Anos mais tarde, a 16 de Outubro de 1966, quase nas mesmas circunstâncias, perdeu também a vida no Campo Pequeno, no dia em que completava 21 anos, aquele que era um dos mais promissores cavaleiros da época: natural de Évora, chamava-se Joaquim José Correia e era anunciado nos cartéis como "Quim-Zé"
A 11 de Agosto de 1983, o cavaleiro José Francisco Varela Crujo , sofre impressionante queda também na arena lisboeta. Permanece quatro anos em coma vigil e acaba por morrer no dia de Natal de 1987.

Fotos D.R. e Frederico Henriques/Campo Pequeno