Praça à cunha! Assim dá gosto! |
Prémio de bravura para Joaquim Brito Paes e de apresentação para Passanha - e todos estiveram de acordo! |
Miguel Alvarenga - A Feira do Toiro-Toiro em Alcochete teve ontem a segunda corrida, o tradicional Concurso de Ganadarias, depois da noite mágica e verdadeiramente épica de Francisco Palha na sexta-feira com seis toiros (de verdade e emoção) da ganadaria Palha. E o ciclo prosseguiu em ritmo de muito nível e de um entusiasmo incrível por parte do público. Ontem foi mais uma grande tarde de toiros em Alcochete!
A praça registou uma enchente e um ambiente espectacular - esta é outra das praças, tenho tido sorte nos últimos tempos (Ilha Terceira, Paio Pires, Abiul e agora Alcochete), onde a Festa nunca acabará. Não só "porque sim", mas muito em particular pela seriedade dos promotores das corridas na cuidada e rigorosa montagem dos cartéis, apostando em elencos atractivos e em toiros de verdade, não naqueles que dão sono e retiram todo o perigo e todo o risco que uma corrida deve ter...
Se em todas as praças, até na que já foi primeira do país, as corridas fossem como estas duas de sexta-feira e de ontem em Alcochete, outro galo cantaria na nossa Festa. A Feira do Toiro-Toiro está a ser, esta semana, a grande capital do glamour e do esplendor da arte tauromáquica.
Arena emblemática e praça bastião do sempre lembrado "Nené", a bonita e acolhedora pracinha de Alcochete (pequena nas dimensões, gigante no significado que tem nos nosso panorama taurino, onde continua a ser um dos palcos mais importantes) é, desde a sua morte, gerida por seus filhos Margarida e António José, que não me canso de aplaudir porque tiveram valor e souberam continuar o trabalho e a história ali escrita por seu pai, honrando e enaltecendo todos os princípios que o nortearam em vida e dele fizeram, para todo o sempre, um dos mais prestigiados empresários taurinos de Portugal.
O Concurso de Ganadarias de ontem ficou marcado, como sempre acontece, pela seriedade e pela emoção transmitida pelos seis toiros que sairam à praça fazendo justo à designação desta feira taurina, a do Toiro-Toiro.
Lidaram-se, por esta ordem, exemplares de Conde de Murça (um toiro com pata e com transmissão, que evidenciou bravura), Fernandes de Castro (um toirão com... 700 quilos, jabonero, de apresentação notável, mas que, apesar dos quilos, não fez mal a ninguém, à semelhança do que acontecera já em Vila Franca com outro pesadíssimo irmão; andou com nobreza durante a lide e foi pelo seu caminho, sem maldade, para o forcado); de Ascensão Vaz (o toiro seleccionado partiu um corno nos currais e, em vez de ser substituído pelo sobrero, que era a solução lógica, foram ao campo buscar outro toiro da mesma divisa, acabou por vir um que não estava no programa, sem grande qualidade, era apena um toiro bonito, jabonero também); de Ribeiro Telles (este muito na linha dos manos que não assustaram ninguém na capital, andou certinho e pelo seu caminho, sem exigir, sem muito transmitir, servindo...); de Joaquim Brito Paes (um toiro de bandeira, bravo, de comportamento excepcional, a reafirmar o grande momento que atravessa esta ganadaria); e de Passanha (toiro muito na linha desta triunfadora ganadaria, com imenso trapio e apresentação aplaudida, que teve comportamento de bravo e transmitiu emoção).
O júri do concurso foram os próprios ganadeiros e os prémios foram atribuídos, com a total concordância do público, sem um único protesto, aos toiros de Joaquim Brito Paes (bravura) e de Passanha (apresentação). Fernando Pinto, Presidente da Câmara de Alcochete, desceu à arena para presidir à cerimónia de entrega dos prémios.
Artisticamente, os três cavaleiros estiveram razoáveis, sem grandes espaventos, nas lides dos três primeiros toiros: bem andou Rui Fernandes com o bom toiro de Conde de Murça; artista e poderoso esteve João Moura Jr. com o pesadíssimo toiro de Castro; e João Ribeiro Telles deu o melhor de si perante o toiro trocado de Ascensão Vaz, mas não teve pela frente matéria prima para brilhar, não chegando sequer a dar volta à arena, reservando-se para a segunda parte.
A segunda parte foi outra corrida.
Rui Fernandes agigantou-se e fez alarde da sua muita maestria na lide fantástica ao toiro de Ribeiro Telles e muito por obra e graça da sua extraordinária actuação, com brega adequada, recortes de muita arte e ferros de tremenda emoção, obrigou os meninos Moura e Telles a puxaram também dos seus galões e a superarem-se nos toiros que se seguiram, não fosse o diabo (do Fernandes!) tecê-las e sairem por baixo na tarde de tão aguerrida competição com a figura consagrada.
Com o quinto bravo toiro de Joaquim Brito Paes, João Moura Júnior protagonizou uma lide memorável, colossal, daquelas com que costuma marcar a diferença e afirmar a liderança. O toiro arrancava-se com alegria e emoção e Mourinha deu-lha a prioridade, esperou, cravou depois num palmo de terreno ferros que levantaram as pessoas da bancada, como que impelidas por uma mola. Fantástico, seguro, mandão.
João Ribeiro Telles não é toureiro de perder, nem a feijões. Não lhe tinham corrido de feição as coisas no primeiro toiro. Entrou em praça no último decidido a também fazer a diferença e empolgou tudo e todos, pôs toda a gente de pé também, com a brilhante lide ao bom toiro de Passanha, que transmitiu e impôs emoção. João Telles está num momento imparável de consagrada maturidade e de classe superior. Emocionou, pisou a linha de risco, deixou ferros de uma verdade sem fim. Terminou com a sorte habitual de praça a praça com o fantástico cavalo "Ilusionista". Simplesmente espantoso.
Aplausos para os seis bandarilheiros: Hugo Silva e João Santos (de Rui Fernandes); Benito Moura e José Maria Maldonado Cortes (de Moura Jr.); Duarte Alegrete e António Telles Bastos (de João Telles).
À saída da praça, um velho amigo dizia-me, com alguma ironia e a graça com que analisa todas as situações: "A culpa de ter sido uma corrida fantástica foi só tua... foste escrever que o Palha era o número-um do toureio a cavalo e eles vieram hoje aqui os três afirmar-se e mostrar que também são números-um!"... A picardia sempre fez falta!
Tarde de apoteose, como também é habitual nesta data, para o glorioso Grupo de Forcados Amadores de Alcochete, cujas seis pegas já aqui mostraremos a seguir. Pegaram Pedro Dias (à primeira), Vitor Marques (à primeira), Afonso Caprichoso (à segunda), o cabo António José Cardoso (à segunda), Miguel Direito (à primeira, com uma grande primeira ajuda de Gonçalo Catalão, que o acompanhou, com todo o merecimento, na volta à arena) e João Dinis (à primeira).
Ao início da corrida foi guardado um minuto de silêncio em memória de Mariana Palha, filha do saudoso Zézinho Palha, que morreu anteontem; e no corredor da praça foi descerrado um painel de azulejos de homenagem ao saudoso forcado Aníbal Pinto, dos Amadores de Alcochete.
A corrida foi bem dirigida, com aficion e rigor, como é seu costume, por Ricardo Dias, que esteve assessorado pelo médico veterinário Jorge Moreira da Silva.
Alcochete voltou a marcar a temporada. E amanhã há mais.
Fotos M. Alvarenga
Praça cheia, ambiente espectacular. Alcochete tem outro sabor |
Rui Fernandes deu o mote do triunfo e "puxou" pelos "meninos"! |
Moura Jr. com o pesadíssimo toiro (700 quilos!) de Castro |
João Telles com o toiro de Passanha (prémio de apresentação) |