sexta-feira, 26 de junho de 2015

"Dei o melhor de mim!" - 1ª parte da grande entrevista ao Maestro Paulo Caetano

Esta é a primeira parte da grande entrevista que fiz a Paulo Caetano, a poucos dias de voltar a tourear em Portalegre (4 de Julho) para comemorar os seus 35 anos de alternativa - e de que se publicará a segunda parte ao longo da próxima semana. Por ele próprio e através das suas palavras, o que aqui fica nesta conversa é o retrato de um grande toureiro que ao longo de duas décadas esteve entre os primeiros, foi por diversas vezes proclamado triunfador de várias temporadas e travou nas arenas recordadas competições com todas as grandes figuras do seu tempo. Paulo Caetano é uma referência do toureio a cavalo - e a sua trajectória uma história. Que aqui nos conta e aqui nos recorda.

Entrevista de Miguel Alvarenga

- Que recordações, Paulo, daquele dia 15 de Junho, há 35 anos, quando tomaste a alternativa em Santarém?
- Do dia da minha alternativa tenho tantas e tão belas recordações. Lembro-me da Monumental "Celestino Graça" completamente esgotada horas antes do início do espectáculo. Nas ruas, aquele ambiente único das grandes corridas, expectativa e entusiasmo ao rubro. Recordo o António Badajoz ao comando das operações, recordo a força que me deram os meus pais e a minha irmã, recordo o apoio dos meus amigos de Santarém, do Francisco Morgado, do Celso dos Santos, do Edgar Nunes, do Joaquim Nunes, do José Brás, recordo a confiança que sentia ao tourear ao lado do Zé João Zoio, meu padrinho de alternativa, um homem e um toureiro de elite. Recordo a responsabilidade de um cartel de figuras: Zoio, Manuel Jorge de Oliveira, ganadaria Palha, Forcados Amadores de Santarém e Montemor numa Corrida RTP, corridas que o João Moreira de Almeida tinha transformado no mais importante acontecimento de cada temporada.
Recordo a presença de Sá Carneiro, de artistas das mais variadas áreas e da nata da afición portuguesa. Recordo que foi um grande momento mas, acima de tudo, que foi aquele que abriu a possibilidade de viver muitos outros que fazem de mim um homem profundamente grato por ter tido a oportunidade de fazer aquilo de que gosta.
- Alcançaste em 35 anos todas as metas a que te propunhas? O que ficou por fazer?
- Na carreira de um toureiro, o sonho de glória, marca a partida mas as metas não se determinam de forma estanque e calculista. Vão surgindo a cada um dos degraus de uma longa escadaria. No meu caso, fui alcançando objetivos que me pareciam no início inalcançáveis. Depois, uma vez atingida cada uma das etapas, a minha ambição profissional fazia-me sonhar com um novo salto e a minha responsabilidade profissional exigia-me mais e mais trabalho e assim, assumindo riscos, aprendendo permanentemente, treinando sem parar, lá fui chegando.
Eu sou uma pessoa inquieta e intrinsecamente perfeccionista. Quando olho para trás, tenho a certeza de que poderia ter feito melhor e ter ido mais longe. O que me deixa feliz é ter a consciência de que sempre encarei esta arte, que é a minha profissão, com seriedade e dedicação. Dei o melhor de mim, trabalhei sempre incessantemente e procurei fazer o melhor que podia. Respeitei os meus colegas e dediquei-me totalmente a uma paixão da qual consegui ganhar a vida. Sinto-me grato e feliz por isso. Neste momento, não procuro superações, procuro honrar o meu trabalho aperfeiçoando o meu conhecimento e a minha técnica, pois é essa a minha principal motivação, tenho os pés bem assentes na terra.

O momento histórico da alternativa, há 35 anos em Santarém,
apadrinhado pelo saudoso D. José João Zoio, com o
testemunho de Manuel Jorge de Oliveira
Por detrás de um grande Homem, estará sempre uma grande Mulher: Dita Moura
Caetano tem sido a companheira de uma vida, a primeira e maior apoiante do
Maestro Paulo Caetano
Paulo Caetano e seu Pai, João Caetano, o primeiro grande pilar da sua carreira

- Quem foram os grandes pilares da tua carreira, para além, obviamente, de teu Pai, que sempre esteve a teu lado?
- O meu pai tem sido o meu maior pilar de apoio e o meu grande exemplo, a minha mãe a minha alegria e inspiração. Dos dois tenho recebido uma verdadeira preparação para a vida através de princípios tais como: nada se conquista sem trabalho, não há acções sem consequências, o mais importante é o amor e a união da família, nada é realmente nosso a não ser os sentimentos e o conhecimento, de cada amanhecer devemos colher a força que necessitamos para seguir em frente e ser felizes. A família foi sempre o meu grande apoio, a minha irmã, a minha mulher, os meus sogros e cunhados, os meus filhos e sobrinhos. Depois tive o privilégio de ter bons mestres que tiveram a paciência de me ensinar. Nos cavalos e na equitação, de entre outros, o meu tio Fernando Metzner Serra, o Sr. Visconde da Corte e o Eng. João Diogo Parreira Cano; no conhecimento do toiro e do toureio, um sábio, o Maestro António Badajoz; como apoderado, um grande amigo e um homem de corpo inteiro, o inesquecível Raul Nascimento.
A sorte de ter tido amigos verdadeiros como elementos da minha quadrilha também foi extremamente importante para a minha carreira. Tive a sorte de ter conhecido grandes empresários, grandes jornalistas e escritores, grandes artistas, grandes aficionados. Não tenho dúvida de que as pessoas são o património mais importante da minha vida.
Paulo Caetano e seu filho João Moura Caetano, que com ele alternará, ao lado de Rui
Fernandes e João R. Telles (filho) na corrida nocturna do próximo dia 4 de Julho 
em Portalegre

- Há já alguns anos que não te encontras em actividade, pelo menos com a regularidade de outros tempos. Mesmo assim, tens toureado e vamos ver-te dia 4 de Julho em Portalegre. Mais algumas corridas este ano, Paulo?
- É costume ouvir-se os toureiros dizerem que nunca deixam de ser toureiros. É verdade em relação áquilo que sentimos dentro de nós, aquela paixão, aquele apelo por expressar no ruedo o que nos vai na cabeça e no coração. No entanto, sei o que custa estar no activo, tourear 30 ou 40 corridas por ano e lutar todos os dias pelo posto de figura do toureio. Sinto uma admiração tão grande pela preparação e pelo estofo que um toureiro tem de assumir para estar nesse plano que, apesar da minha vida profissional continuar a exigir que monte a cavalo tantas horas por dia como há 30 anos atrás, não posso deixar de aceitar que estou retirado e esse facto, aumenta o meu respeito por todos aqueles que andam na luta todos os fim-de-semanas. Apesar de a minha vida continuar totalmente ligada aos cavalos, pisar de novo uma praça de toiros com a consciência de que a falta de rodagem pode ser limitativa, constitui uma enorme responsabilidade mas procurarei fazê-lo com dignidade. Toureio em Portalegre porque é o Distrito onde tenho vivido a maior parte da minha vida, onde constitui a minha família, onde criei os meus filhos. Adoro esta terra e sinto-me entre a minha gente. Não sei se tourearei mais alguma corrida durante esta temporada.

Fotos Emílio de Jesus, Figueiredo, Hugo Teixeira e D.R.