Por mais "mal amado" que seja, João Dinis deu um elevado exemplo de profissionalismo... que falta a muitos |
A célebre foto de A. Martins da colhida mortal do cavaleiro Joaquim José Correia "Quim-Zé" no Campo Pequeno a 16 de Outubro de 1966. Não deveria ter sido capa de todos os jornais da época, como o foi? |
Em 30 de Agosto de 1985 um toiro partiu ao meio o coração do jovem matador José Cubero "El Yiyo" na praça de Colmenar Viejo. As imagens da tragédia deviam ter sido ocultadas? |
As fotos da colhida mortal do matador português José Falcão em Barcelona em Agosto de 1974. Nunca deviam ter sido mostradas? |
A foto impressionante da cornada que tirou ao matador Juan José Padilla o olho direito na arena de Zaragoza. Devia também ter sido apagada? |
O matador Victor Barrio morto na arena de Teruel em 2016. Estas imagens deviam ter sido escondidas e nunca publicadas? |
Instalou-se a polémica no meio taurino, muito para lá dos dividendos que, como é óbvio e natural, os anti estão a colher desta tragédia de Coruche. E até houve fotógrafos que vieram defender nas redes sociais que as fotos das tragédias não se devem publicar... "por profissionalismo". João Dinis deu um exemplo maior do grande profissional que é, mas é, por culpa sua, um repórter "mal amado" e só por isso lhe estão todos a cair em cima. Quanto ao não publicar fotos de tragédias, meus senhores, vamos a ser profissionais! A tragédia e o drama fazem parte da Festa. Esconder isso é tentar tapar o sol com uma peneira. E como muito bem escreveu Joaquim Grave, são acontecimentos como este que engrandecem a Festa. Qualquer dia ainda diziam que isto era uma brincadeira de meninos, sem perigo, sem emoção, sem risco. E sem tragédia. Mas isso não é verdade
Miguel Alvarenga - Francisco Cano foi um dos maiores repórteres fotográficos da história da tauromaquia. Morreu com cem anos há poucos anos e a sua glória maior foi ter sido o único fotógrafo que naquela fatídica tarde do dia 28 de Agosto de 1947 estava na praça de Linares, sendo suas as únicas fotos da colhida que vitimou o mais famoso toureiro do último século, o mítico Manolete. As fotos correram mundo. Paco Cano nunca as devia ter publicado?... As tragédias são para apagar?
Não. As memórias nunca se apagam. E as tragédias muito menos.
As fotos de João Dinis dos momentos trágicos que marcaram a corrida de toiros do último sábado na arena de Coruche, que ultrapassaram as fronteiras do seu site e foram capa do "Correio da Manhã" e pano de fundo das notícias dos telejornais de várias estações, estão a dar brado e o repórter está a ser alvo dos maiores impropérios, sobretudo por parte de outros fotógrafos, havendo mesmo os que defenderam nas redes sociais que (pasme-se!), "por profissionalismo", não se devem publicar imagens de tragédias. Só de triunfos...
Esses ataques e a defesa ridícula desse "profissionalismo" (é precisamente o contrário) acontecem única e simplesmente porque João Dinis é um fotógrafo "mal amado" no meio taurino. Mas isso é um problema que ele próprio causou, criando demasiados anti-corpos no meio. Quase nenhum colega lhe fala nas trincheiras e já são pouquíssimas as trincheiras a que tem acesso, tal o cerco que os empresários lhe estão a fazer. Mas isso, repito, é culpa dele. Se as fotos fossem de outro, não estaria a acontecer todo ests sururu.
Mas uma coisa é verdade: Dinis foi o repórter certo no lugar e na hora certa, assim como Cano o foi na praça de Linares em 1947. Por acaso fiquei em Lisboa a cumprir os meus deveres de Avô. Não estive em Coruche. Mas se tivesse estado, teria feito igual - ou tentaria ainda fazer mellhor - ao que João Dinis fez. Sou jornalista primeiro que tudo. Aficionado vem a seguir.
João Dinis mostrou o grande profissional que é. Deu uma lição que eu adorava ter dado também, mas infelizmente não estive em Coruche. Os outros, os que se dizem "profissionais" (da treta) e defendem que se devem apagar as máquinas e assobiar para o lado quando acontece uma tragédia, esses que aprendam com ele.
Já agora, questiono: e os repórteres de guerra? Para não impressionar a sensisibilidade das pessoas, deviam ficam no hotel a beber copos e não ir retratar os cenários de terror?
Em Coruche houve triunfos importantes dos cavaleiros Luis Rouxinol e Manuel Ribeiro Telles Bastos e do matador Nuno Casquinha e do novilheiro Diogo Peseiro. E homenageou-se a memória de um grande toureiro, Manuel Cipriano (Badajoz). Mas poucos ou nenhuns falaram disso. E eu entendo. Jornalisticamente (e não só), o que marcou a corrida e foi notícia foi a tragédia. Foram as colhidas dos cavaleiros Ana Batista e João Moura Júnior, dos forcados João Ventura e Luis Fera e a morte do cavalo Xeque-Mate.
Não acontecem tantas tragédias num só dia numa praça de toiros. Mas são realidades que acontecem e que os que são verdadeiros profissionais não podem - e sobretudo não devem - ignorar. Não morre um cavalo todos os dias (felizmente) vítima de um toiro. Mas quando morre, é notícia. Doa a quem doer. E é mais notícia que um triunfo. Lá está. É a velha máxima do jornalismo que diz que se um cão morder um homem não é notícia (é um lugar comum), mas se um homem morder um cão já é notícia.
Todos lamentamos - como é óbvio. Mas não podemos ignorar. Não podemos apagar, da mesma forma que ninguém apagou muitas das fotos que hoje aqui publico, e tantas outras, que retrataram momentos de tragédia, de drama e de morte vividos nas arenas.
Não critico - antes aplaudo - o trabalho brilhante do João Dinis. Também não critico o trabalho jornalístico - bom jornalismo, digam lá o que disserem - do "Correio da Manhã". Lamento e condeno apenas o facto de este jornal, que em tempos foi dos que maior apoio e relevo deu à tauromaquia, apenas dar destaque à Festa quando acontece uma tragédia. Deu agora à tragédia de Coruche um destaque que não deu, por exemplo, à sua corrida no Campo Pequeno. Lamento e condeno - mas como jornalista, entendo. Uma tragédia vende muito mais que um triunfo.
E pela ordem de ideias que alguns fotógrafos e aficionados têm defendido nas redes sociais, então não se publicavam nunca fotos de acidentes mortais na Fórmula 1, de crianças estropiadas pelas guerras e de outras tragédias.
A Festa Brava tem tragédia. E mal dela se a não tivesse. Mal dela se os anti tivessem todos os dias argumentos para nos acusar de só "torturar" os animais num espectáculo em que estávamos sempre em vantagem. Infelizmente para quem sofre na pele as consequências destes acidentes, mas felizmente para a Festa, estas coisas também têm que acontecer de vez em quando. Às vezes, é o toiro quem sai vencedor. Como aconteceu em Coruche. Este espectáculo foi toda a vida um misto de emoção, de glória, de risco e de tragédia. No dia em que for apenas e só uma "coisa de meninos", sem risco algum, morre de vez a sua essência. E os que defendem o contrário não sabem do que estão a falar.
Um repórter tem que ser profissional. As tragédias não se apagam. Fazem parte da Festa. São para noticiar. Acontecem. E o que acontece é notícia.
Não podemos ignorar. E não podemos andar a vida todo acagaçados com o PAN e com os anti-taurinos. Era de esperar que viessem a terreiro valer-se agora desta tragédia, destas fotos e de todo este sururu. O deputado André Silva chegou mesmo a interpelar o ministro da Agricultura para que "se apurem as circunstâncias" em que morreu o cavalo de João Moura Júnior. Será uma coisa assim tão misteriosa como o atentado de Camarate? Vão criar uma Comissão Parlamentar de Inquérito, ouvir em São Bento o toureiro, os bandarilheiros, o ganadero para apurar quem teve a culpa? Que disparate. O cavalo morreu porque foi vítima de colhida, partiu uma mata e quando os cavalos partem as patas não há mais nada a fazer, abatem-se para não sofrerem mais. Os cavalos também se abatem.
Era prefeível, em nome do "profissionalismo", ignorar o que aconteceu? Apagar as fotos para o PAN não se servir delas? Claro que não.
Umas vezes, ganha-se, outras perde-se. Desta vez perdemos em relação aos PAN's e quejandos. Demos-lhes de mão beijada e de bandeja uma desgraça que aconteceu na arena. Mas não a podíamos apagar. As memória - e as tragédias -, repito, não se apagam.
O que é notícia não se apaga. Nunca. E a Festa de Toiros também é tragédia. Já nos anos 60 os famosos fotógrafos espanhóis Botán publicaram este livro de que aqui reproduzo a capa ao lado. "A Tragédia da Festa" com 512 fotos de colhidas. Também não o deviam ter feito? Não foram profissionais?...
Estamos entendidos?
Ou precisam que explique ainda melhor?
Fotos D.R.