Ricardo Relvas - "Ao 12 da Praça da Alegria, nunca mais!". Com este título, o já falecido bandarilheiro Rogério Valgode, através da escrita, manifestava o seu desencanto com as sistuações vividas no Sindicato dos Toureiros e que, mais tarde clarificadas, permitiram o seu pedido de desculpas. Eu acho oportuno o título e sinto que a maior parte dos toureiros também. Mas como tenho opinião e embora não sendo beneficiário do Fundo, fui contribuinte e sou solidário com aquela obra erguida por um grande Senhor, Diamantino Vizeu - a quem atiraram à cara o primeiro subsídio -, continuada por Amâncio Grilo e outros dorectores, após o falecimento do seu mentor (Manuel Jacinto, Albino Fernandes, José Bartissol, Nuno Pardal, entre outros, etc.), apoiada e incentivada pelo presidente do Sindicato dos Toureiros, na altura Francisco Núncio, e controlada com incomensorável carinho, amor e dedicação por Carlos Amorim, como todos reconhecem, o que permitia que o Fundo fosse uma obra respeitada em todo o mundo taurino.
E sa falo em tudo isto é porque a
corrida organizada no passado dia 9 de Agosto na praça de toiros do Campo
Pequeno, como comemoração dos 60 anos do Fundo de Assistência dos Toureiros,
permite uma leitura que se aproxima, não da incompetência de quem orienta o
Fundo, mas do "deixa andar" manifesto nesta iniciativa que, no meu
entender, devia ter sido antecedida de uma explicação ao público, jornais,
blog's, revistas e a todos os toureiros e outros intervenientes na Festa:
porque todos reconhecem o valor desta organização, que ganhou crédito e
privilegiou sempre o respeito por todos, mas que com a actual situação pode vir
a ter problemas, quando se descuram contribuições de toureiros, empresas, etc.,
porque a televisão não se afigura solução a longo prazo.
O Fundo de Assistência dos Toureiros é
uma obra maravilhosa, cuja organização social estabelecida ainda hoje não
encontra modelo paralelo em mais nenhum país taurino. Com efeito, os toureiros portugueses uniram-se há mais de 60
anos num belo movimento de auxílio mutual. Assim, tem-se assistido, ano após
ano, à nítida melhoria dos serviços de apoio aos toureiros. O toureiro encontra
nesta organização a assistência médica total sem custos, e ainda recebe o
equivalente a um bom salário durante o tempo em que permanece impossibilitado de
regressar à arena.
Também os filhos dos toureiros recebem
do Fundo ajudas importantes para os gastos com a educação escolar, desde a
pré-primária até à Faculdade, assim como os próprios profissionais que podem
estudar ajudados pelo Fundo, existindo casos de filhos de toureiros já
formados tendo beneficiado destas
ajudas.
Além de outros aspectos contidos no
programa do Fundo, como sejam os subsídios Educação, Funeral, Viuvez , Doença,
(independentemente do acidente ocorrido na praça), o toureiro não é abandonado
quando chega ao limite da sua carreira profissional: uma vez na situação de
reformado, o Fundo concede-lhe o direito a um suplemento de reforma que, na
grande maioria das situações actuais, é bem superior à pensão de reforma que o
Estado lhe concede. E que dizer
das condições médicas em hospital privado com a assistência gratuita e
desinteressado do Senhor Dr. Carlos Ferreira e também de um corpo disponível de
fisioterapeutas a toda a hora?
Mas a iniciativa levada a cabo, e bem,
pelo gerente taurino do Campo Pequeno não teve correspondência nos elementos e
funcionários do Fundo de Assistência, pois a maior parte dos toureiros, antigos
e actuais, não foi sensibilizada para o evento.
Por isso, pergunto: onde estavam os
elementos da Assembleia-Geral, os elementos do Conselho Fiscal, a direcção da
agora Associação (antes Sindicato), os antigos e actuais directores? Onde
estavam os cavaleiros, os matadores, os novilheiros, os bandarilheiros, os
moços de espadas, os emboladores? E não seria de sensibilizar as viúvas de
antigos toureiros beneficiários do Fundo, para viveram uma noite memorável,
algumas das quais, se não fosse o que auferem do Fundo, não poderiam viver?
Onde estavam os toureiros reformados beneficiários?
É que não chega passear nas trincheiras,
precisamos nestas iniciativas de trabalhar a sério se queremos ter êxito e por
isso recordo as homenagens ao Dr. José Cunha, a Diamantino Vizeu, ao Dr. Carlos
Ferreira e outras, bem como a primeira corrida com picadores do Fundo e a
quantidade de Festivais que se organizaram pelo país fora para angariar
receitas para o Fundo, recordando ainda o "assalto/ocupação" ao
Sindicato e os tempos difíceis vividos, mas que a abnegação sempre superou.
Na verdade, temos que nos convencer que
vivemos num país sem responsabilidades, nem responsáveis. Ninguém assume o que
quer que seja, porque é incómodo e desnecessário. Mas eu assumo, porque não
sendo beneficiário do Fundo, dei com ele os primeiros passos e fui
contribuinte.
Manifesto desta forma a minha mágoa, convicto
de que é o sentimento da maior parte dos toureiros, pois existia obrigação de
fazer melhor e encher a praça. Para cúmulo, foi um forcado que se lembrou de
brindar ao Fundo, para que a efeméride não passasse em branco. Que lástima...
com todo o carinho e respeito pelo forcado, pelo grupo, cujos elementos
principais conhecem bem o que é o Fundo.
Onde está, certamente Diamantino irá
perdoar-lhes. E tu, Amorim, que sempre viveste o Fundo como se fosse a melhor
coisa que tinhas, vai por ti e perdoa-lhes também.
E se querem um conselho, ele aqui vai:
para fazerem igual, deixem-se estar quietos. Os toureiros agradecem. Por isso o
lema: "O Fundo de Assistência é dos Toureiros; só aos Toureiros cabe
defendê-lo e melhorá-lo".
Fotos D.R. e M. Alvarenga/Arquivo