sexta-feira, 8 de agosto de 2014

Gilberto Filipe: ontem, foi dele a noite!

No que respeita aos cavaleiros, ontem os Momentos de Glória foram exclusivos
de Gilberto Filipe. Espera-se, pelo menos, que a empresa o coloque agora na
corrida de gala de Outubro onde se encerra a temporada. É o mínimo... não acham?
Era o cartel mais fraquito e mais mal rematado desta "temporada única", mas a
verdade é que a praça estava muito mais composta do que se pensava. O Grupo de
Forcados de Lisboa merecia uma festa diferente para assinalar os seus 70 anos.
Mesmo assim, registou-se uma excelente entrada de público, maioritariamente
composto por emigrantes, estrangeiros e antigos forcados do GFA de Lisboa
O toiro de Gilberto Filipe foi recolhido por se ter inutilizado ao entrada na arena
O toiro não via bem, mas Ana Batista também andou longe do seu melhor
Valente como as armas, Sónia cravou ferros de muito arrojo
O par de bandarilhas foi o momento grande da lide de Filipe Gonçalves
Sónia e Filipe abriram a noite com um dueto marcado por algumas trapalhadas
Viu-se melhor e houve mais hamonia e maior sintonia no duo de Ana com Gilberto


Miguel Alvarenga - Lembrei-me ontem no Campo Pequeno das sábias e sempre tão acertadas palavras com que o saudoso Fernando Camacho, ainda não houve apoderado ou taurino que lhe chegasse por cá aos calcanhares, se referiu um dia ao Gilberto Filipe quando lhe perguntei, numa das nossas tantas e tão divertidas conversas (aprendi tanto!), quem iria ser, dos novos que ao tempo estavam a surgir, o melhor, já que desde o aparecimento do João Salgueiro (que ele lançara e eu acompanhara desde a primeira corrida a sério, uma noite em Vila Franca) nunca mais viera um toureiro que marcasse e todos continuávamos pacientemente à espera de um, qual D. Sebastião que nunca chegou a vir na tal manhã de nevoeiro, e já houve tantas.
Respondeu-me na altura o tio Fernando, com a certeza de quem não tinha dúvida alguma, mesmo nenhuma: "O único que pode andar e mexer com isto é o toureiro do Amorim!". Gilberto Filipe era ao tempo apoderado por José Carlos Amorim, ainda o último grande senhor dos apoderamentos, que há mais de vinte anos está ao lado de Rui Salvador e hoje mesmo lá há-de estar, em Tomar, onde o Rui se encerra com seis Graves.
Os anos passaram e "o toureiro do Amorim" não houve meio de dar aquele salto que Camacho previa e preconizava com tantas certezas. Por isto ou por aquilo, mas sempre dando notas de que um dia haveria de ser, Gilberto Filipe foi subindo sem pressa (mas os toureiros têm sempre que ter pressa) a escadaria que leva à glória, mas foi também adiando a sua hora. Este ano, as coisas mudaram de figura. Onde apareceu, triunfou. E ontem no Campo Pequeno triunfou, meteu tudo e todos no bolso e o mal mesmo é Portugal não ser Espanha e Lisboa não ser, por consequência, Madrid, o que faria de Gilberto, já hoje, um toureiro rico e famoso, com contratos a choverem e empresários à estalada para terem a primazia de o anunciar.
Infelizmente, Portugal é demasiado pequenino para dar andamento a um êxito como o de Gilberto Filipe no toiro a sós ontem em Lisboa, que era o "sobrero", já que o seu se aleijou depois de entrar, e depois também no que enfrentou a duo com Ana Batista.
Tudo o que fez, foi bem feito. Assim se toureia. E os entendidos estavam todos de pé a aplaudir. Não houve um toque, um ferro a cilhas passadas (como os costumam espetar as vedetas), um deslize a apontar. Aquele último ferro, em terrenos de enorme compromisso, onde um milímetro mal calculado pode ser a morte do artista, foi dos melhores que este ano se viram no Campo Pequeno.
Sónia Matias teve no seu toiro uma lide em crescendo, onde colocou raça e decisão, houve dois ferros que se aplaudiram de pé e o público, estrangeiros e emigrantes na maioria, esteve com ela do princípio ao fim.
Ana Batista foi como se não tivesse passado ontem por Lisboa, exceptuando um ou outro ferro no toiro a duo com Gilberto, a verdade é que a sós alternou o mau com o muito mau, mas também teve por diante um toiro que parecia precisar de óculos e Filipe Gonçalves, por muitas palmas que lhe tenham batido, e bateram, voltou a chegar ao Campo Pequeno com os "quiebros" estudados em casa, desperdiçando aquele que foi o melhor dos toiros de Canas Vigouroux nesta noite, todos muito bem apresentados e muito toiros, mas com comportamentos desiguais e longe daquele "terror" que costuma ser característica destes toiros. Valeu um valente par de bandarilhas, em que aguentou uma barbaridade. No toiro a duo com Sónia, houve trapalhada a mais, por pouco chocavam os cavalos um com o outro, não sou adepto dessas lides a meias, delas recordo apenas e só as dos manos Telles no seu tempo e o resto são cantigas.
Dos forcados já aqui falei, foi deles a noite, pena só que o Pedro Maria não tenha estado a corrida toda para assistir ao triunfo da sua rapaziada. Pena também que os cavaleiros, à excepção de Ana Batista, se tenham esquecido de brindar ao 70º aniversário do grupo. João Cantinho foi um diligente e paciente director de corridas, teve a assessorá-lo o médico veterinário Jorge Moreira da Silva e a verdade é que a corrida teve gente, mais que outras que este ano ali se realizaram, apesar de termos que reconhecer que este era o mais fraquito e o mais mal rematado dos elencos desta temporada que, na verdade, tem sido mesmo única e promete continuar a sê-lo.

Fotos Maria João Mil-Homens