sábado, 24 de agosto de 2019

Toureio a pé: futuro não tem, mas que temos grandes matadores, lá isso temos!

Estava assim ontem o Campo Pequeno... Onde estavam os "aficionados" que em
Março se costumam pavonear de casaquinhos verdes e chapéus com penas de
pato em Olivença para serem fotografados e "dizerem" que gostam muito de
toureio a pé?...
António João Ferreira com o capote no primeiro toiro da noite. Foi o qaue valeu.
De muleta, fez os possíveis e os impossíveis, mas faltou-lhe toiro...
A suavidade e o temple do capote "desmaiado" de Manuel Dias Gomes. Que
toureirão!
Houve "pica" entre os toureiros. E assim respondeu "Juanito" num quite ao
toiro de Manuel Dias Gomes
Pedro Noronha: classe e arte
Poderio e valor: Joaquim Oliveira no seu melhor
Com que arte e com que temple toureou Manuel Dias Gomes o seu primeiro
toiro!
Arte e classe no capote do nosso novo matador
O único par de valor de um dos bandarilheiros espanhóis de "Juanito"
"Juanito" chegou e disse "estou aqui!" - e esteve
Irmão e pai de "Juanito", atentos e nervosos
Ana Marujo, mãe de "Juanito", assistiu emocionada ao debute do filho como
matador em Lisboa
"Juanito" tem tudo para ser um grande toureiro
João Ferreira e João Oliveira, dois ases de Portugal na arte de bem bandarilhar
António João Ferreira, brutalmente colhido, foi ontem um herói
Um toiro-toiro, o quinto de Calejo Pires
Pés parados, arte e temple. O capote mágico de Manuel Dias Gomes
Cláudio Miguel: é assim que se bandarilha!
Pedro Noronha, um toureiro sério
Cláudio Miguel fazia anos ontem: 30. E deu-nos esta prenda, bandarilhando
com esta verdade
O segundo toiro de Manuel Dias Gomes era um "tio" com quase 600 quilos. E o
que era difícil, Manuel fez parecer fácil
Pena de quem não viu. "Juanito" toureou assim ontem no Campo Pequeno!


Faltou público, sobrou arte, valor e afirmação dos nossos toureiros a pé. A empresa ganhou a aposta. Difícil, ousada, de quem quer relançar a arte de Montes em Portugal. Os (ditos) aficionados, que correm excitadíssimos a Olivença, só para presumir e serem fotografados, com casaquinhos verdes e chapéus com penas de pato, deviam ter enchido o Campo Pequeno - e não o encheram. António João Ferreira teve o pior lote e ainda por cima foi brutalmente colhido no seu segundo toiro, recolhendo ao hospital. Manuel Dias Gomes reafirmou o duende da sua arte e do seu temple sevilhanos. E "Juanito" deu o grito do Ipiranga em Lisboa: é toureiro e vai chegar longe!

Miguel Alvarenga - Há 51 anos, quando tourearam os três em Lisboa, José Júlio, Mário Coelho e José Falcão tinham uma força doida - que António João Ferreira, Manuel Dias Gomes e "Juanito" não têm. O toureio a pé tinha um esplendor que nunca mais voltou a ter. E as corridas semanais eram todas mistas. Tudo mudou. Por isso, era complicado este desafio da empresa do Campo Pequeno de apresentar, ainda por cima numa sexta-feira - os tempos mudaram e as vontades também, hoje as pessoas vão para fim-de-semana e estão-se nas tintas para o toureio a pé... -, três matadores nacionais sózinhos, sem cavaleiros e sem forcados, os pratos-fortes da nossa Festa. Valeu a intenção. Valeu a aposta no toureio a pé. Valeu a atitude arriscada. mas sobretudo louvável - da empresa. Mas o público não correspondeu e não encheu mais que meia casa "envergonhada". E foi pena - porque o espectáculo valeu.
Os toiros de Manuel Calejo Pires, que fazia a estreia da ganadaria em Lisboa - e trouxe atrás de si uma legião de amigos e admiradores - sairam duros, exigentes, muito sérios e a pedir contas. Coisa complicada numa Festa onde não se picam os toiros, mas onde o público exige, mesmo assim, que os lidem um pouco a fingir que estamos em Espanha... sem estarmos. Foi uma corrida para assustar e isso ficou patente nos tércios de bandarilhas da quadrilha espanhola de "Juanito", pouco habituada ao andamento dos nossos toiros sem varas... Joaquim Oliveira, Pedro Noronha, João Ferreira e Cláudio Miguel, os nossos, deram-lhes uma banhada das antigas. Temos grandes matadores. E temos os melhores bandarilheiros do mundo!
O público, pouco mas bom, esteve pendente do que na arena se passava, com a verdade e a emoção que os toiros de Calejo Pires transmitiram. E isso foi importante. Houve seriedade no espectáculo. Houve respeito pelo toiro e pela arte. E houve uma entrega desmedida dos três matadores.
O toureio a pé saíu vencedor e a certeza de que temos matadores à altura dos melhores de Espanha foi a melhor coisa que se passou na noite de ontem. Se vai adiantar alguma coisa, não sei e duvido que vá. Mas que foi importante, foi.
António João Ferreira teve o azar de lhe tocarem os dois piores toiros. Fez tudo o que pôde, até ser violentamente colhido pelo quarto da noite. Não deu volta no primeiro, nem teve música - mas esteve valente e artista. Voltou a não ter música no segundo - custava assim tanto dar-lha?... - mas entregou-se, porfiou e arrimou-se que nem um herói, apesar de não ter matéria prima para brilhar.
Manuel Dias Gomes reafirmou a sua arte, o seu duende, aquele perfume sevilhano que dá um toque de diferença às suas faenas. Lidou dois toiros distintos. Melhor o primeiro, duríssimo e complicado o segundo, mas deu-lhe a volta, esteve "em toureiro" e em plano de figura. Venceu todos os obstáculos e fez parecer fácil o que era difícil. Está um toureirão, maduro, consistente e com uma plástica que mete respeito. Grande Toureiro!
João Silva "Juanito" há muito que vem provando que tem "qualquer coisa" para conseguir ir longe. Estreava-se em Portugal como matador de toiros, o mais novo de todos, e mexeu com todos nós. Também tem duende, também tem arte e também tem, acima de tudo, atitude e vontade de se afirmar. Muito bem no primeiro toiro, que exigia, iniciou de joelhos a faena do segundo, no meio da arena, assim como que diz "estou aqui"-  e esteve.
Nenhum dos três tem um apoderado chamado Camacho (que saudades!) para ser o que Pedrito foi. Ferreira e Gomes não andam por Espanha a deitar cartas. "Juanito" é o único que ainda por lá está à procura da consagração. Vitor Mendes só houve um. E por isso não sei vaticinar o que vai ser o futuro destes três matadores e muito menos o que será o futuro do nosso toureio a pé. Mas de uma coisa não tenho a menor dúvida: são os três muito bons.
E se o tempo voltasse atrás, tínhamos aqui três novos Josés Júlios, Mários Coelhos e Josés Falcões. Mas a realidade é que o tempo não anda para trás e o toureio a pé, como ontem se viu, tem a força e a importância que (não) tem.
É triste e é pena - porque temos grandes matadores, não precisamos dos espanhóis (que são sempre benvindos) para dar brilho ao toureio a pé. Mas o público está-se nas tintas para isso. Quer é cavaleiros e forcados. E se não fosse assim, meus amigos, o Campo Pequeno ontem tinha esgotado.
Pode doer. Mas é a verdade.

Fotos M. Alvarenga