Antigo forcado do Aposento da Moita, hoje reputado médico cirurgião, António Peças escreveu este emotivo artigo no jornal "Brados do Alentejo", de Estremoz (edição de 6 de Setembro), intitulado "Os bois pelos nomes", que já está amplamente divulgado nas redes sociais, pela sua pertinência e oportunidade, mas que não resistimos a aqui transcrever, com a devida vénia:
No passado dia 30 de Agosto desloquei-me
a Lisboa, à praça de toiros do Campo Pequeno, para observar "in loco"
o meu grupo de forcados a pegar na corrida da RTP.
Fui ao quarto do hotel desejar sorte a
todos, ajudar a fazer uns nós de gravata e fiz um pequeno discurso para
moralizar, ainda mais, o grupo.
Para pegar o 5º da noite foi o forcado
Nuno Mata. Não conseguiu ficar na cara do touro, caiu de costas e num movimento
tipo "cambalhota para trás" foi comprimido na região cervical pelo
touro e ficou imobilizado na arena...
Quem é médico e foi forcado percebe,
imediatamente, que algo de grave se passa... Aquele pescoço, aquela inércia
corporal, aquela posição dos braços e das mãos...
Passei pela enfermaria para confirmar
que o Nuno ia ser transportado para o Hospital de Santa Maria e fui para lá,
esperá-lo.
Conhecia bem os cirurgiões que estavam
de urgência, contei a história e permitiram-me que fosse eu a observá-lo:
ausência de sensibilidade e força a partir de uma linha horizontal um pouco
acima dos mamilos.
Gelei...!!
Balbuciei qualquer coisa quando o Nuno
me perguntou se ia ficar sem andar o resto da vida...
E não contive a emoção quando ele, o
mais consciente de todos, me disse que queria morrer.
Acompanhei-o à TAC e à RMN, porque ele
me pediu para não o deixar sózinho... Nesses exames confirmou-se a enorme
gravidade do quadro: a medula parecia não estar seccionada mas estava
garantidamente lesada.
Operado na 6ª feira, confirmaram-se os
piores receios: um rapaz de vinte e sete anos nunca mais na vida se vai
mexer...!
Esta história é, só por si, uma
tragédia.
Seja um forcado, um artista de circo ou
um motociclista!
A onda de solidariedade tem sido
impressionante!
No entanto, essa escumalha que se
intitula protectora dos animais tem feito questão de se vangloriar pelo
sucedido!
Tenho lido comentários que julgava
impossíveis, nos quais só acreditei depois de confirmar pessoalmente, vindos de
quem se diz tão moralmente avançado e civilizado!
Acho que os toiros, se pudessem, não
gostariam de ser defendidos por estes animais!
Penso que todos os toiros que peguei na
vida eram mais nobres do que esta gentalha!
Julgo que lhes deveremos responder fisicamente
da próxima vez que nos insultarem, como tradicionalmente fazem nos seus
"ajuntamentos" à porta das praças! O perigo vem deles, porque nunca
houve necessidade da presença de forças de intervenção em praças de toiros!
Estou farto dos direitos das minorias!
Enjoo quando vejo jovens terem tempo para participarem em manifestações
mesquinhas! Rejubilo quando ouço uma deputada dizer que o BE teve menos
votantes do que os espectadores televisivos de uma tourada!
Desejo, àqueles que ladraram felizes
pelo sucedido ao Nuno, que numa estrada qualquer um toiro bravo lhes entre pelo
vidro do carro e depois de os cobrir com a sua bosta lhes arranque as cabeças
com as suas hastes afiadas!
Eu seria um acérrimo defensor desses
animais!!!
António Peças
Foto D.R.