domingo, 17 de março de 2024

Santarém, praça cheia e tarde morna: toiros dos Telles deram poucas opções aos Telles para que fosse uma tarde rotunda de triunfo dos Telles

Tristão: raça, valor e atitude. Mas os toiros deixaram muito
a desejar...

Miguel Alvarenga - Três quartos fortíssimos da lotação preenchidos, um ambiente enorme ontem à tarde na Monumental "Celestino Graça" na primeira corrida de toiros da nova temporada - a confirmar, antes de mais, a força dos Ribeiro Telles, mas também a competência e o dinamismo da Associação "Sector 9", esse grupo ímpar de antigos forcados e grandes aficionados escalabitanos que levantaram e fizeram renascer das cinzas a praça de toiros de Santarém.

Pena que os toiros de Herdeiros de David Ribeiro Telles, bonitos e bem apresentados, mas sem transmissão nem emoção, quase todos a perder o fôlego a meio das lides e a evidenciar pouca força, em nada tivessem contribuído para o que se queria que fosse um sucesso e foi, afinal, uma corrida meio sonsa e morna. Onde se passou pouca coisa. Melhor dizendo: esperava-se muito e no fim soube a pouco. Acontece às vezes...

Tristão Ribeiro Telles de Queiroz recebeu o ferro da alternativa das mãos de seu primo João Ribeiro Telles, seu mestre desde a primeira hora. Vestiu, como todos os fizeram nas alternativas anteriores, a bonita e histórica casaca azul de veludo que foi em 1958 a mesma que utilizou seu avô, Mestre David, para receber a sua alternativa no Campo Pequeno.

A acusar algum nervosismo, o que é perfeitamente normal e aceitável, Tristão começou a meio gás e com alguma irregularidade, mas com decisão e atitude, recebendo o toiro com uma emotiva, mas pouco brilhante sorte de gaiola, acabando por se reencontrar na segunda fase da lide. Esteve, contudo, superior no último toiro da tarde, com 610 quilos, que praticamente lidou sózinho, tendo os outros Ribeiro Telles entrado em cena só mesmo no fim e para cravar um ferro cada. Lide animada, à moda da Torrinha, com Tristão a sobressair e a impôr-se, chegando muito mais ao público do que no toiro da alternativa.

António Ribeiro Telles, Mestre dos Mestres, lidou o segundo toiro, que pouca raça tinha e toda a raça da lide foi ele, António, quem a pôs, com a sua inesgotável maestria, dando a cara como se fosse um miúdo, a mostrar que ainda pode e que nunca esquece. 

Manuel Telles Bastos, como o primo e o tio nos toiros anteriores, falhou o primeiro comprido. Não estavam ontem com a melhor das pontarias os Ribeiro Telles... Depois, Manuel endireitou-se, recompôs-se e sem ter rubricado uma lide triunfal, transmitiu a classe e a dignidade com que sempre está numa arena. À antiga maneira.

A corrida seguiu sem intervalo - aplausos a quem tomou essa decisão - e para lidar o quarto toiro entrou em praça João Ribeiro Telles. Entrou com a raça e a garra do costume. Pôs emoção no que fez. Tinha o público com ele. Depois quis terminar com o brilhantismo e a emoção habitual "daqueles ferros" com o "Ilusionista", mas o cavalo preto desta vez não estava para aí virado. Três vezes se recusou a ir à luta mesmo na cara do toiro. Depois confiou-se e João acabou a lide com três bons ferros. Muita dignidade teve-a no final, entregando o tricórnio ao forcado e recusando dar a volta à arena. Olé, Toureiro!

António Telles Filho foi o quinto. Não há quinto mau, diziam os antigos. E cumpriu-se a profecia. O toiro era o "Sardinero", foi o que melhor serviu, mesmo sem evidenciar grande bravura, e António levou para a Torrinha o triunfo maior da tarde, foi ele quem pôs a praça de pé, quem se mostrou indiferente ao facto - que pode sempre ser usado como desculpa para a tónica pouco triunfal em que a corrida decorreu - de esta ter sido a primeira corrida da temporada, de os cavalos - e os cavaleiros - ainda não estarem rodados, etc. e tal. António até parecia que já tinha toureado um número elevado de corridas. Chegou ali e marcou a diferença. Bom prenúncio para a temporada do novo Telles.

A corrida terminou, como acima referi, com a lide do sexto toiro "à moda da Torrinha", mas desta vez mais "à moda de Tristão", que o recebeu com uma sorte de gaiola, emotiva e mais certeira que a do toiro da alternativa, que lhe cravou um segundo comprido de praça a praça e que ainda brilhou em mais três ferros curtos, entrando depois o tio e os primos para fecharem a lide com um ferro cada um. Praça de pé, final feliz.

Tarde grande dos Forcados, que acabaram por ser, é justo que se realce, os triunfadores maiores desta primeira corrida do ano, primeira também das três que se vão realizar em Santarém.

Ao longo do dia de domingo vamos aqui trazer todas as fotos das pegas, dos melhores momentos dos cavaleiros, de algumas intervenções brilhantes dos vários bandarilheiros que ontem coadjuvaram as lides, dos muitos Famosos que encheram a Monumental de Santarém.

Mas ficam as referências aos valentes forcados da cara: por Santarém, pegaram Joaquim Grave (à segunda), Francisco Paulos (à primeira) e Francisco Cabaço (também à primeira, naquela que foi a melhor e mais emotiva pega da tarde).

Pelo Aposento da Moita, foram caras João Freitas e Luis Canto Moniz (ambos ao primeiro intento) e o valente cabo Leonardo Mathias (numa pega imponente à segunda tentativa).

Direcção competente, com música para todos, de Manuel Gama, que esteve assessorado pelo médico veterinário José Luis da Cruz.

Os Telles brindaram as lides a Tristão, à excepção de Manuel T. Bastos, que o fez ao público. Também os dois grupos de forcados honraram o novo cavaleiro com os seus brindes, havendo a registar ainda um brinde dos Amadores de Santarém ao antigo cabo João Grave e outro dos Amadores do Aposento da Moita ao seu antigo forcado Rodrigo Castelo, afamado Chef que foi recentemente premiado e honrado com uma estrela Michelin.

Ao início da corrida, os cinco cavaleiros, e Tristão em especial, foram à arena receber as homenagens da Associação "Sector 9" e também da ainda deputada social-democrata Fernanda Velez - que deixará de o ser, infelizmente, na próxima legislatura - que quis marcar presença e render tributo ao novo cavaleiro e a todos os que continuam a honrar o legado deixado por Mestre David Ribeiro Telles.

Mais logo, ao longo do dia, acompanhe todas as reportagens desta corrida em Santarém.

Fotos M. Alvarenga


Praça cheia em Santarém por obra e graça da força dos Telles
e do dinamismo exemplar da Associação "Sector 9". Em baixo,
o momento solene, e carregado de emoção, da alternativa de
Tristão, o sétimo cavaleiro Ribeiro Telles da nossa História