segunda-feira, 30 de agosto de 2021

O sonho comanda a vida: Gilberto Filipe esta 6ª feira no Montijo pela primeira vez com Pablo Hermoso


Gilberto Filipe não necessita propriamente de apresentações. Equitador de primeira, sagrou-se campeão mundial de Equitação de Trabalho e como toureiro é há muitos anos um lutador cujo mérito e o valor todos reconhecemos. Tomou a alternativa em 2004 na Monumental do Montijo, apadrinhado pelo eterno Joaquim Bastinhas e quatro anos antes fizera a prova de praticante numa corrida realizada em Loures. Foi muitos anos apoderado pelo histórico Carlos Amorim, desde há uns anos que tem a seu lado a dirigir-lhe a carreira um amigo de infância, Leandro Flores. Na próxima sexta-feira na Monumental do Montijo vai pela primeira vez actuar ao lado de Pablo Hermoso de Mendoza, número um do rejoneio mundial, naquele que será o grande cartel da sua vida, encabeçado pelo valoroso Luis Rouxinol. Considera que não é propriamente “a corrida da sua vida”, mas que é, isso sim, um sonho que vai finalmente realizar. Quando lhe perguntei se haverá um antes e um depois desta corrida na sua carreira, respondeu que “o toureiro é o mesmo”, mas considerou que os aficionados talvez o passem a olhar de outra forma. “O meu foco é dar o meu melhor e estar bem e desejo que a corrida seja um êxito para nós todos, mas se conseguir ser eu o melhor ficaria muito contente, ninguém gosta de perder!”, afirma. Vamos ouvi-lo, a poucos dias do grande desafio

Entrevista de Miguel Alvarenga


- Vamos andar para trás no tempo, recuar até a sua prova de praticante em 2000, à sua alternativa em 2004…

- Já lá vão uns anos… Fiz a prova de praticante em 29 de Julho de 2000 numa corrida realizada numa praça portátil em Loures…


- Em que alternou com…

- A cavalo tourearam o saudoso Joaquim Bastinhas, o Rui Salvador e o Miguel Fernandes e a pé o Vitor Mendes, o Rui Bento e o espanhol Álvaro de la Calle e pegavam os Amadores de Loures, grupo que já não existe.


- E a alternativa foi em 2004 no Montijo…

- Sim, a 28 de Junho, na tradicional corrida das festas de São Pedro. Foi meu padrinho o saudoso Joaquim Bastinhas e tourearam também o Rui Salvador, o Luis Rouxinol, a Sónia Matias e o João Pedro Cerejo. Pegaram os dois grupos de forcados do Montijo, Tertúlia e Amadores e os toiros eram de Rio Frio, do Maestro José Lupi.


- Ao longo destes anos, alcançou muitos êxitos e, mesmo não toureando muito, manteve sempre uma regularidade e marcou a sua posição na Festa. Pergunto-lhe: houve muitas corridas, mas esta de sexta-feira no Montijo é a corrida da sua vida?

- A corrida da minha vida não direi, mas é um sonho que vou concretizar. Tourear ao lado de Pablo Hermoso de Mendoza, uma figura máxima, numa praça tão importante como a Monumental do Montijo, que tanto me diz e tanto significado tem para mim, é, de facto, um sonho que sempre tive e que vou finalmente poder concretizar. Tive muitas corridas boas, vivi grandes momentos, mas penso que na minha carreira ainda não fiz tudo o que queria, nem alcancei todos os objectivos que se podem ter. Penso que o melhor ainda está para vir. Mas posso dizer que tenho orgulho em tudo o que fiz. Esta corrida de sexta-feira é um sonho realizado, espero que as coisas corram como desejo.


- O sonho comanda a vida?

- Claro que sim!


- O que é que sentiu no dia em que o empresário Abel Correia lhe telefonou a convidá-lo para estar neste cartel?

- Senti uma enorme vontade de começar a tourear e começar a treinar para me preparar para corresponder às expectativas… Acho até que nunca toureei tanta vaca na minha vida como agora! Esse telefonema foi no princípio do ano, salvo erro, logo ali em Fevereiro ou Março. Como sabe, a corrida já foi adiada duas vezes. Desde aí até agora tenho feito tudo a pensar na corrida, a preparar-me. A treinar, para conseguir estar à altura deste grande desafio e para corresponder às expectativas do empresário, que acreditou em mim, e dos aficionados e amigos que na sexta-feira ali estarão para me apoiar.


- Olhando para trás, para estes dezassete anos de alternativa, valeu a pena, Gilberto?

- Sem dúvida! Tenho, como o Miguel sabe, uma carreira paralela na Equitação de Trabalho, onde os resultados, graças a Deus, são enormes, fui Campeão do Mundo, mas tourear também me faz muito feliz, é uma parte daquilo que eu sou, sinto coisas diferentes, inexplicáveis. Nunca dei por perdido o meu tempo dedicado à tauromaquia, todos os minutos foram importantes e sinto-me hoje mais preparado que nunca e com a ilusão igual aos tempos em que comecei.


- Acha que ainda não lhe deram o devido valor, que tanto o público como a crítica ainda não reconheceram o seu real valor? 

- Sinceramente não acho isso. Mas a maneira como os outros olham para mim eu não posso nem devo comentar, e nem me influencia. Aquilo em que acredito e o que penso que sou capaz de fazer são as únicas coisas que verdadeiramente me influenciam.


- Vai tudo mudar depois de sexta-feira?

- Numa corrida tão importante como esta, é lógico que o público me vai olhar de uma outra forma e é lógico que muita coisa pode mudar. Vão, talvez, dar mais ênfase ao que eu fizer, mas não penso nisso, a única coisa em que penso neste momento é dar o meu melhor na próxima sexta-feira no Montijo. Mas isso é sempre aquilo em que eu penso. Triunfar. A ideia é essa mesmo!


- Vamos poder dizer que há na sua carreira um antes e um depois desta corrida no Montijo?

- Na minha cabeça vai ser igual e eu sou o mesmo! Mas claro que se as coisas correrem bem, com a importância que tem tourear ao lado do Luis Rouxinol e do Pablo Hermoso num cartel destes, é natural que os aficionados depois me vejam com outros olhos, me dêem mais crédito, isso acredito que pode acontecer… é esse o meu desejo!


- Alguma vez, nos últimos tempos, pensou que poderia chegar ao Montijo e “dar um banho” ao Pablo Hermoso?…

- Não, de maneira nenhuma! Não penso dessa maneira. Nem posso pensar. O Pablo é uma figura máxima! O que seria bom é que a corrida fosse um grande êxito e que os três triunfássemos com muita força, que estivéssemos todos num nível elevado. Se eu estiver bem, a um nível elevado, já fico bastante satisfeito. Não é por estar melhor que os meus companheiros de cartel que serei mais ou menos que os outros toureiros, a minha ideia principal e onde eu me foco é nas minhas actuações e em tentar estar o melhor possível. É lógico que desejo que todos os meus companheiros estejam bem em todas as corridas, mas se puder ser eu a estar melhor, claro que fico contente, ninguém gosta de perder! Neste momento o meu foco é trabalhar, treinar e chegar na sexta-feira ao Montijo e dar o meu máximo.


- Depois destes anos de toureio e também na sua outra actividade na Equitação de Trabalho, pode dizer-se que é neste momento um artista realizado?

- Realizado, mas não satisfeito. Tenho muito para melhorar e tenho ainda muito para mostrar. A ambição continua e trabalho todos os dias para que o futuro seja ainda melhor. Como disse há pouco, acho que o melhor ainda está para vir. O passado está feito, já nada podemos alterar. Quanto ao futuro, temos ainda muito que fazer e que dar.


- Vamos ainda tê-lo muitos mais anos nas arenas?

- Espero que sim, pelo menos o meu desejo é esse.


Fotos D.R. e Emílio de Jesus/Arquivo