terça-feira, 26 de abril de 2022

Rui Fernandes: "O conto nunca acaba..."

Rui Fernandes construiu e consolidou a sua brilhante trajectória vindo "do nada", sem nome sonante nem antecedentes taurinos na família que não fossem, apenas e só, a grande aficion aos cavalos e ao toureio de seu pai. Em 24 anos de alternativa (para o ano, temos festa nos 25!), tornou-se um caso e é hoje uma das primeiríssimas figuras nacionais e o mais internacional dos nossos cavaleiros, com presença nas principais feiras taurinas de Espanha e de França. Esteve dois anos sem actuar em Portugal e no final da última temporada foi à Moita e marcou a diferença com um triunfo inolvidável. Preocupa-se agora com o lançamento de seu sobrinho, o jovem cavaleiro Duarte Fernandes, mas garante que vai continuar em frente, pelo menos até chegar aos 30 anos de alternativa. Esta temporada vai tourear mais em Portugal e arranca já no próximo domingo 1 de Maio no Cartaxo, na tarde de reaparição de João Salgueiro, que foi desde sempre um dos seus grandes ídolos. Vamos ouvi-lo.

Entrevista de Miguel Alvarenga

- Em anos anteriores, foste praticamente um ausente nas praças portuguesas. O grande triunfo em Setembro do ano passado na Moita aguçou o apetite aos empresários para te voltarem a chamar para as grandes corridas?

- Se toureei menos em Portugal nos últimos anos foi porque as coisas não se proporcionaram, não porque eu não quisesse. Adoro ser português, dou a vida pelo meu país, mas nem sempre as circunstâncias se proporcionam e eu só toureio quando sinto que as condições estão reunidas e posso ir...

- Estamos a falar de dinheiro, de cachet's, presumo...

- Não só, mas também. Criou-se entre os toureiros e os empresários um mau hábito de se fazerem contratos "pelo que há" e tanto eu, como o meu apoderado, não alinhamos nessa moda... Procuramos dignificar a profissão, só isso. Mais claro não posso ser.

- Pelo que vejo, e felizmente, alguma coisa mudou. Já estás anunciado no domingo no Cartaxo, depois em Coruche, em Santarém e no Montijo...

- Essas são as quatro corridas para que estou contratado este ano em Portugal, por enquanto. E todas elas são corridas importantes e diferentes, que penso vão ser benéficas para a Festa e vão marcar a temporada.

- Já no domingo, no Cartaxo, vais tourear na tarde de reaparição de João Salgueiro, com o filho dele, o João Salgueiro da Costa e o teu sobrinho Duarte. Que significado tem esta corrida para ti, Rui?

- É uma corrida diferente e que tem para mim um significado muito grande pelo facto de tourear ao lado do João Salgueiro na tarde do seu regresso às arenas. É um toureiro que já admirava imenso, mesmo antes de eu ter começado a tourear. E passados estes anos todos, é um orgulho enorme para mim estar a seu lado, do seu filho e do meu sobrinho, na corrida em que ele vai reaparecer. É uma grande satisfação poder estar nesta corrida e acho que os aficionados vão viver uma tarde bonita de toiros. Diferente, pelo menos.

- Com a particularidade de ser o teu debute na praça do Cartaxo, onde em 24 anos de alternativa e 30 de toureiro nunca actuaste...

- É verdade. É a primeira vez que vou tourear na praça do Cartaxo, onde nunca estive porque nunca se proporcionou. A nova associação de aficionados locais que a passou a gerir tem um projecto ambicioso para colocar a praça no topo e penso que é importante poder dar o meu contributo para isso. Tenho uma enorme ilusão nesta corrida e neste cartel e penso que pode ser uma daquelas corridas que vai marcar a temporada. Vamos enfrentar toiros de uma ganadaria que dá todas as garantias de sucesso, a de Passanha. Penso que estão reunidos os ingredientes necessários para que seja um êxito e para que os aficionados desfrutem..

- Depois toureias a 28 de Maio em Coruche mano-a-mano com João Ribeiro Telles e com toiros de Veiga Teixeira...

- Outra corrida diferente, com toiros sérios e que exigem e num mano-a-mano com um dos melhores cavaleiros da nova geração, creio que será outra tarde marcante. E também diferente. É uma corrida que mexe muito com os meus sentimentos, pelo que representa a Família Ribeiro Telles.

- Segue-se Santarém, a 5 de Junho, a Corrida da CAP, que marca a reaparição de António Ribeiro Telles e também com João Moura Júnior, frente a toiros de Murteira Grave...

- Sim, Santarém é outro desafio e mais uma grande corrida com a importância de nela reaparecer o António Telles, por quem tenho um grande carinho e uma enorme admiração, por ele e por toda a sua Família. O João Moura Jr. é o toureiro que todos sabemos e a corrida de Murteira Grave está grande e mete respeito, pode ser uma das maiores corridas da temporada.

- A depois vem a quarta, até surgirem outras, a 29 de Julho no Montijo, na celebração dos 35 anos de alternativa de Luis Rouxinol, mais um cartel de dinastias completado pelo filho de Rouxinol e pelo teu sobrinho. Mais uma corrida com um significado relevante?

- Com um significado e uma história importantes. O Luis Rouxinol é também um dos toureiros que muito admiro, pela carreira que construiu vindo "do nada" como eu, sem nome, sem toureiros na família, apoiado apenas, como eu, na grande aficion de seu pai, e que conseguiu chegar onde chegou, sendo hoje uma das nossas primeiríssimas figuras. Temos um percurso muito parecido, ambos conquistámos um mundo que "era dos outros" e por isso creio que esta será também uma corrida que vai marcar e sobretudo que vai mostrar aos jovens que querem ser toureiros e ambicionam um dia chegar onde nós chegámos, que, com vontade, com ambição, com muito trabalho e entrega e com sacrifício, nada é impossível de alcançar.

- Estas são as quatro corridas, para já, em arenas portuguesas. Outras virão certamente. E entretanto continuas a campanha em Espanha.

- Sim, embora algumas ainda estejam longe, são corridas que tenho permanentemente na cabeça e penso que outras hão-de surgir e que há mais praças importantes onde posso vir a actuar. Entretanto, continuo, sim, a minha temporada em Espanha, a próxima corrida será a 12 de Maio na Feira de Jerez.

- E vamos ter Rui Fernandes nas arenas por muitos mais anos?

- Muitos, também não. A minha meta é tourear até aos 30 anos de alternativa e faltam seis. Gostava de ver consolidada a posição do meu sobrinho Duarte, tem todas as condições para chegar longe. Depois retiro-me, quero ter mais tempo para a minha família, para desfrutar das minhas filhas ao lado da minha Mulher. É importante quando olho para trás e penso em tudo o que fiz e alcancei, mas a ambição é sempre maior. Fiz tudo com entusiasmo e acho que fiz a opção certa quando decidi ser toureiro. Mas ambiciono mais, todos os dias procuro cavalos melhores, procuro fazer coisas diferentes, procuro superar-me e estar melhor. Costumo dizer que o conto nunca acaba...

Fotos D.R.