sábado, 6 de julho de 2019

Tomar: aquilo a que se chama uma grande noite de toiros!

Festa dos Tabuleiros "a abrir praça" honrando a tradição tomarense
Praça cheia e grande espectáculo ontem em Tomar


"Foi uma grande tourada, disse da mesa avinhada um campino que ali estava!". Nas redes sociais, proliferam desde ontem os comentários dos descontentes contra a Corrida TV de Tomar. Se é branco devia ser preto, se é preto é porque devia ser branco. É preciso pôr os pontos nos iis. Foi uma boa corrida e foi um bom espectáculo televisivo. O resto são as cantilenas do costume...

Miguel Alvarenga - Vi a Corrida TV de ontem em Tomar pacatamente em casa, que é como se devem ver as corridas televisionadas. Pela manhã visitei as redes sociais. E fiquei pasmado com tanta velhice do Restelo. Que a corrida não prestou para nada. Que o cartel devia ter outro nível. Que a praça devia ter sido outra. Que corrida foi transmitida em diferido, com meia-hora de atraso. E depois? Que mal tem isso?
Se não há corridas televisionadas - e qualquer dia os homens da RTP perdem a paciência com tanto disparate que depois se escreve e elas deixam mesmo de existir, depois queixem-se... - protestam todos (ou alguns). Se há corridas televisionadas, protestam ainda mais. Esta gente dos bois é preso por ter cão e preso por o não ter. Não há nunca satisfação com nada... que se há-de fazer?
Eu gostei. Diverti-me. Os toiros de Paulo Caetano, com pouca "cara", apresentação suficiente, sem quilos a mais ou a menos, serviram à excepção do primeiro, deram bom jogo, tiveram transmissão e foi perfeitamente justificada a volta que o ganadero deu à arena. Proporcionaram um bom espectáculo e quando isso acontece só temos que aplaudir.
Os cavaleiros estiveram todos bem e foram protagonistas triunfais de uma agradável noite de toiros. Se o primeiro toiro não tinha quase reacção e não investida, investiu Rui Fernandes e numa lide de suprema maestria até nos fez esquecer que o toiro não servia. Era a sua segunda corrida da temporada em Portugal (porque toureia tão pouco por cá?) e demonstrou a grande forma em que se encontra. Filipe Gonçalves teve uma das melhores actuações que lhe vi nos últimos tempos, amadureceu, está mais toureiro e bem montado, apesar de ontem ter a quadra dividada e alguns cavalos já nos Açores, onde hoje toureia (São Jorge). Moura Caetano está de novo "armado até aos dentes", os cavalos Baco e Campo Pequeno são fantásticos, ideais para o seu toureio de arte e bom gosto e ontem regressou em força aos grandes triunfos. Marcos Bastinhas vive uma temporada muito especial e de um significado enorme para a sua carreira. Vive (e veste) um luto que está a transformar, pelo seu desmedido valor, em triunfo - e essa será a melhor das atitudes que pode ter neste momento pra honrar e homenagear a figura de seu pai, o inesquecível Joaquim Bastinhas e manter viva essa chama que ele pôs a arder durante quarenta anos e agora o Marcos voltou a atear. Lide empolgante e "à Bastinhas", premiada com duas voltas à arena, mais um êxito arrebatador depois da marcante saída em ombros pela porta grande do Campo Pequeno. Francisco Palha é a ousadia e é o risco. É o toureio feito emoção e foram enormes os ferros que cravou, os terrenos que pisou, a forma como entrou pelo toiro dentro saindo num palmo de terreno, esse palmo que faz a verdade e com que ele, toureiro dos de cima, continua a marcar sempre a diferença. E Soraia Costa, jovem cavaleira praticante, com um toiro que exigia e não foi fácil, esteve desembaraçada e esteve, porque esteve mesmo, toureira. Com raça e com valor, sem deslizes a apontar, actuação vibrante e ferros de emoção.
Os forcados honraram essa arte única e tão portuguesa que interpretam com romantismo e amadorismo. Os toiros não complicaram, nem fizeram mal, foram com nobreza pelo seu caminho. O Grupo de Alcochete destacou-se com pegas por João Belmonte (com uma grande ajuda de João Rei), Gonçalo Catalão (ambos à primeira) e João Guerreiro à terceira. Diogo Toorn foi também "aquela máquina" a dar primeiras, como é sempre, o grupo - um grande grupo - esteve coeso e brilhante nas ajudas e na consolidação das pegas. Pelo Grupo de Tomar, pegaram Ricardo Silva (à terceira), João Oliveira (à segunda) e Hélder Parker, o futuro cabo. à segunda.
Sandra Strecht dirigiu bem a corrida, assesorada pelo médico veterinário Dr. Luis da Cruz. À transmissão da RTP não há nenhum reparo a fazer, os comentadores Vasco Lucas e José Cáceres estiveram à altura, Tiago Góis Ferreira foi o jornalista certo no lugar certo nas entrevistas entre barreiras, Luis Castro e a Casa do Pessoal da RTP estão uma vez mais de parabéns e a nós, aficionados, só nos fica bem aplaudi-los e agradecer-lhes. O contrário, meus senhores, é falta de bom senso.
Depois da corrida houve uma exibição de recortadores com um toiro também de Paulo Caetano, em hastes limpas, cheio de trapio. Sem tempos mortos, com notável actuação de todos os (brilhantes e valentes) recortadores, foi bom mostrar ao país esta tauromaquia popular que vai ganhando cada vez mais adeptos. E que é de valor.
Venha a próxima Corrida RTP - já no dia 19, na Nazaré. Da de ontem, gostei e não tenho nenhum comentário negativo a apontar. Não afino, felizmente, pelo diapasão do negativismo com que muitos dos nossos continuam a deitar tudo abaixo por dá cá aquela palha. Até porque ontem não houve razões nenhumas para isso. Houve toiros, houve toureiros, houve forcados e houve público. Não há nenhuma razão para dizer que não foi bom. Foi muito bom e constituiu, em termos de televisão, um belíssimo "cartaz" do que é, na realidade, a arte tauromáquica e esta festa tão enraizada nos nossos costumes e nas nossas tradições.
Uma palavra final para louvar o empresário João Pedro Bolota e a Santa Casa da Misericórdia de Tomar pela recuperação da praça de Tomar - que bem precisava que lhe lavassem a cara. E também pelo grande cartel que anunciam para Agosto, com Marcos Bastinhas, Luis Rouxinol Jr. e António Prates.

Fotos D.R. e RTP1