À semelhança do que já aconteceu no Sabugal (Capeia Arraiana), em Vila Franca de Xira e Barrancos, Alcochete também pretende decretar a Tauromaquia como Património Cultural Imaterial das suas gentes. A iniciativa está a ser desenvolvida pelo Clube Taurino de Alcochete, que enviou nesse sentido à autarquia a carta que a seguir se publica:
"Em 1545, Garcia de Resende escreve
o 'que El-Rey fez yndo com a Raynha a ver correr touros em Alcouchete'. Saindo
a pé, com D.Leonor e a corte, para ver correr toiros no terreiro frente à
Igreja, um toiro fugiu. Veio, este,pela rua principal, a mesma por onde ia
El-Rei. Muita gente fugia e gritava diante do toiro. Aqueles que iam com ele,
fugiram também, metendo-se por casas e travessas. D. João II tomou a Raínha
pela mão e, diante dela, de capa no braço e espada "apunhada", com
enorme valentia, esperou pelo toiro de frente! "Quis Deos que [otoiro]
passou sem entender nelle".Ficaram muito envergonhados os fidalgos e os
outros homens.
Mostrava-se, assim, Alcochete, uma terra
onde se ia ver correr touros, no último quartel do século XV (esta crónica é
posterior a essa data). Aliás, a Dinastia Joanina, ainda no século XIV, na
pessoa do seu fundador, El-Rei D._João I, Mestre de Avis, permanecia frequentes
vezes nesta terra, graças aos seus bons ares e abundante caça. O Rei relata no
seu Tratado de Montaria, as caçadas aos veados, aos javalis e aos Toiros, muito
provavelmente nestas mesmas terras de Alcochete. Tais relatos, são o que mais
próximo se julga estar da tauromaquia actual: do exercício_físico, militar e de
lazer, até ao espectáculo organizado que hoje vemos.
Seu filho, El Rei Dom Duarte, Rei de
Portugal e do Algarve e Senhor de Ceuta, escreve o "Livro da Enssynança de
Bem Caualgar toda Sela", cujo conteúdo reforça e complementa os escritos
de seu pai.
Passados três séculos, no reinado de D.
Maria II, Passos Manuel, Ministro do Reino, decreta o fim das corridas de
toiros em Portugal, a 19 de Setembro de 1836. No entanto, em Alcochete, até
1843, continuaram a ser oferecidos, ao Orago São João Baptista, os toiros para
serem corridos no terreiro diante da Igreja Matriz. Chamavam-se a estes toiros
os "Toiros do Santo" que, depois de corridos, eram soltos na lezíria
onde pastavam livremente. Tudo indica que, se esta data é posterior à
promulgação do tal decreto, os Alcochetanos de então ousaram sobrepôr aos
ditâmes de um qualquer ministro do Reino as suas ancestrais tradições, isto é,
aquilo que no presente mais os identificava. A provar a justeza de tal acto, o
dito decreto é revogado por outro, nove meses depois, a 27 de Junho de 1837.
Alcochete é, sobretudo, uma terra de
forcados."
Foto D.R.