sexta-feira, 20 de julho de 2012

Ontem no Campo Pequeno: noite memorável, a melhor da temporada!



Miguel Alvarenga - Esperava-se e aconteceu. A Monumental do Campo Pequeno registou ontem a maior enchente desta temporada. Fruto do cartel, sem dúvida alguma e como bem dizia Rui Bento esta semana, "o mais bem rematado" de todos os que forem montados este ano em Lisboa. O mais competitivo. E o que maiores garantias dava de uma grande noite de toiros. Assim aconteceu, apesar de, precisamente os toiros (Pinto Barreiros), terem ficado algo aquém das expectativas e não terem saído, também, tão bem como os "irmãos" lidados recentemente na corrida televisionada de Évora. Valeu o empenho e a entrega dos toureiros. E a valentia dos forcados, com seis intervenções à primeira tentativa.
João Salgueiro era ontem "a expectativa maior" do Campo Pequeno. Apesar do bom mote dado em Junho nos Açores, havia ainda quem tivesse dúvidas sobre o seu "estado", sobre os seus cavalos.
Abriu praça com aquela que se pode considerar a melhor lide da noite. Verdadeiramente extraordinário, "à antiga", dando toda a prioridade ao toiro, arrancando logo nos compridos em sortes de praça a praça carregadas de emoção e de verdade. Nos curtos e com o toiro a "vir a menos", foi Salgueiro "ao ataque", "a mais" quero dizer e em reuniões de parar corações trouxe de novo a alegria e a emoção dos seus melhores tempos.
O seu segundo toiro cedo procurou o refúgio nas tábuas. Mas para João Salgueiro nunca houve, e muito menos agora, toiros bons e toiros maus. Sacou-o ele da trincheira, aguentou as investidas perigosas, brilhou como brilhava nos tempos de ouro. Tinha razão quando "falou". Voltaria para marcar a diferença "quando as condições estivessem reunidas". E ontem marcou-a - com todos os adjectivos e mais alguns. Evitou "queimar cartuxos" e "andar por aí" a tourear "ao preço da uva mijona" e "em saldo". Estratégia brilhante e bem definida. Clara a transparente. Que ontem teve os seus frutos e o corolário triunfal de quem sabe o que quer e para onde vai.
Que se cuidem os toureiros: João Salgueiro voltou em força!
Outra "expectativa" tinha nome espanhol. Andy Cartagena, que há uns anos não vinha a Portugal e que esta temporada reapareceu, após lesão numa perna que o obrigou a travar a anterior, com sucessivas saídas em ombros e abrindo, inclusivé, a "porta grande" da glória mais importante do mundo, a de Las Ventas, em Madrid.
Chegou ao público sem precisar de "grande espalhafato", em duas actuações de enorme maestria, evidenciando excelente forma, bons cavalos, boa doma e um toureio de verdade. Ninguém "dormiu" enquanto ele esteve na arena. O público vibrou, levantou-se, pediu mais.
Em suma, chegou a Lisboa e deu duas lições enormes de como se toureia a cavalo e de como "se chega ao público" toureando bem a cavalo. Que se cuidem muitos dos "portuguesitos" que aí andam só por andar. A sorte deles é Cartagena - e muitos outros, como Hermoso, Ventura e demais rejoneadores espanhóis - vir poucas vezes a Portugal. Salvo raríssimas excepções - e ontem estavam duas no Campo Pequeno - "nuestros hermanos" são hoje os verdadeiros detentores daquilo que outrora foi glória nossa: o chamado "trono" do toureio equestre, a chamada "nobre arte de tourear e cavalgar em toda a sela" são atributos - e artes - que se passaram de armas e bagagens para o outro lado da fronteira. É uma triste verdade. Mas é uma verdade. E ontem, Cartagena bem o deixou patente.
João Moura Júnior chegava a Lisboa "embalado" por uma temporada de sucessivos e sonantes triunfos em Espanha, que começaram também pela saída em ombros de Madrid e o "atiraram" de repente para as primeiras filas das Figuras mundiais. É hoje uma estrela - e uma estrela que brilha ao mais alto nível. E, dos novos, é talvez o que tem o "selo" mais difícil - ser filho do Maestro Moura não é coisa fácil e afirmar-se como ele próprio se afirmou esta temporada, por si, "fugindo" dessa complicada "carga paterna", tem um valor notável.
Ontem, João Moura Jr. teve o azar de lhe tocar o pior dos lotes. Os toiros não ajudaram minimamente - mas também isso não fez falta. No momento em que está, o jovem Moura triunfa com que toiro for. E assim foi no Campo Pequeno. Duas lides brilhantes, contudo, sem o brilhantismo que certamente desejava. Mesmo assim, duas grandes actuações, onde ponderou a excelente brega, o enorme oficío e já alguma "maestria" visível num toureiro rodado e que tem pisado todos os importantes palcos do universo taurino mundial.
Foi uma grande corrida, uma grande noite. De praça cheia. A que faltou alguma raça aos toiros. Mas onde sobrou garra, querer e triunfalismo de um trio que esteve ali para "guerrear" e para não sair vencido. Uma palavra final, por que justíssima, para o desempenho brilhante de todos os bandarilheiros e em especial das quadrilhas dos dois cavaleiros lusos: Gonçalo Simões, Mário Figueiredo, Hugo Silva e Benito Moura. Muito bem a dirigir, como sempre, ajudando ao engrandecimento da festa que se viveu, também uma palavra de louvor ao competente Pedro Reinhardt.
Em suma, João Salgueiro empolgou e confirmou. Está de volta e em força. Cartagena ensinou e provou que o ceptro do toureio a cavalo está, de facto, em Espanha. E Moura explicou por que razão, e com que razão, chegou finalmente ao topo da escadaria só acessível aos eleitos, aos maiores.
Parabéns a todos. Parabéns, Rui Bento. Foi, até aqui, a noite grande da temporada.

Não perca, ainda hoje, a reportagem fotográfica de Emílio. E todas as fotos da "festa" a seguir à corrida. Estivemos lá - onde os toureiros comemoraram a sua noite triunfal.

Fotos Guilherme Alvarenga e Rita Barreiros

João Salgueiro festejou o triunfo com a sua equipa e amigos,
depois da corrida, num restaurante lisboeta