Jacobo Botero no ano passado em Alcochete com o Maestro João Moura |
Está anunciada para depois de amanhã,
quinta-feira, no Campo Pequeno, na Corrida da "Flash", segunda da
temporada lisboeta - que se espera venha também a esgotar a lotação da praça,
como sucedeu na primeira corrida do ano - a alternativa (que o próprio afirmou
já ser de rejoneador e não de cavaleiro tauromáquico) do jovem colombiano
Jacobo Botero. O assunto tem sido alvo de grande polémica e discussão e hoje
mesmo Botero vai tourear dois toiros na praça de Alcochete para completar o número
legal de dez espectáculos que, por lei, têm que decorrer entre a prova de
praticante (a que não se submeteu, mas a que está, para todos os efeitos,
equiparado) e a cerimónia da alternativa. Por forma a esclarecer tudo e acabar
de vez com a polémica, investigámos, consultámos documentação, ouvimos
autoridades e contamos finalmente toda a verdade - em jeito de pergunta e
resposta, aqui vão os factos de que ninguém ainda falou e que todo o mundo
deseja saber.
Porque razão Jacobo Botero vai esta
tarde tourear dois toiros em Alcochete?
Depois de um cavaleiro prestar prova
para praticante, é exigido por lei que participe em dez espectáculos e só
depois de os cumprir pode, ao 11º, tomar a alternativa. Botero tem oito
espectáculos feitos e por isso faltam-lhe dois. Esta tarde, toureia dois toiros
em Alcochete, como se fossem duas corridas de toiros. Foram pagas como tal,
legalizadas na Inspecção-Geral de Actividades Culturais (IGAC), têm director de
corrida nomeado, médico veterinário, tudo de acordo com a lei. Ao cumprir hoje
essas duas corridas, passar a somar as dez que lhe vão permitir tomar a
alternativa na próxima quinta-feira em Lisboa, no Campo Pequeno.
Mas Botero não fez a prova de
praticante, pelo menos a mesma não foi anunciada em nenhum dos espectáculos em
que ele participou nas últimas temporadas em Portugal...
Jacobo Botero não prestou prova para
cavaleiro praticante em Portugal, pela simples razão de que nunca teve a
intenção de receber a alternativa de cavaleiro tauromáquico, mas sim de
rejoneador, visto ser colombiano. Acontece que em Portugal não existe
legalmente a profissão de rejoneador, mas sim a de cavaleiro tauromáquico. Por
isso, não existe entre nós, de forma legalizada, a alternativa de rejoneador.
De qualquer da formas, Botero está devidamente equiparado a cavaleiro
praticante, mesmo sem ter feito essa prova, porque se creditou em Espanha, no
Ministério do Interior, como rejoneador de novilhos, que é o equivalente ao
nosso cavaleiro praticante. Em Espanha, pode ascender a rejoneador de novilhos
quem tenha participado em vinte espectáculos. Botero entregou no início deste
ano no Ministério do Interior em Espanha o comprovativo da participação, nos
últimos anos, em vinte espectáculos taurinos em Portugal, e ficou classificado
como rejoneador de novilhos, o que, como cá sucede com os praticantes, já lhe
permite tourear em qualquer corrida de toiros no espaço europeu, seja em
França, em Espanha ou Portugal. Deste modo, ele é considerado em Portugal como
cavaleiro praticante. E como desde a data em que se tornou oficialmente
rejoneador de novilhos/cavaleiro praticante até ao dia de hoje, já tomou parte
em oito espectáculos, faltavam-lhe dois para completar os dez exigidos por lei
e poder, depois disso, receber a alternativa. É essa a razão das duas corridas
que hoje toureia em Alcochete, caso que não é inédito e já teve entre nós um
precedente: há uns anos, João Salgueiro da Costa também toureou seis toiros em
Alcochete, à porta fechada, para somar o número de espectáculos que lhe
faltavam para ascender à prova de praticante.
Mas para tomar a alternativa, Jacobo
Botero não tem que se apresentar em praça trajado à portuguesa, de casaca e
tricórnio?
O problema é mesmo esse. Tem, sim
senhor. Como não há em Portugal a classificação de rejoneador e, por
conseguinte, a alternativa de rejoneador, por mais razões que assistam a Botero
para querer ser rejoneador e não cavaleiro tauromáquico - temos que o respeitar
por essa opção, que é inteiramente legítima - a verdade é que na próxima
quinta-feira, para receber no Campo Pequeno a alternativa de cavaleiro
tauromáquico, teria que, à partida, ir trajado de casaca e tricórnio. Diz a
nossa lei (Regulamento Tauromáquico) que o traje é esse e daí não podemos
fugir.
Foi o que aconteceu com Paco Ojeda em
Santarém?
Exactamente. Por mais críticas que isso
tenha motivado, Paco Ojeda cedeu e tomou a alternativa em Santarém vestido de
casaca e tricórnio, trajes que nunca mais voltou a usar. Mas assim tomou a
alternativa dentro da maior legalidade. Foi ridículo, disse-se na altura que
"se mascarou" de cavaleiro e tudo o mais, mas a verdade é que a
alternativa foi legal e não levantou problemas.
E a alternativa de Botero na
quinta-feira, não vai ser legal?
Para todos os efeitos vai, receberá a
alternativa, embora trajado de curto. O que vai acontecer é que depois de
terminada a corrida, o director de corrida (que será Pedro Reinhardt)
levantar-lhe-à, a ele e à empresa do Campo Pequeno, um auto e ficam obrigados
ao pagamento de uma multa por terem desrespeitado a lei. Botero, por ter tomado
a alternativa sem usar o traje exigido; a empresa, por ter anunciado e
permitido que tal ocorresse na sua praça. Mas, àparte isso, a alternativa é
válida. E por muito que o director de corrida esteja, neste caso, obrigado a
votar contra, isto é, a não o aprovar, Botero ficará sempre aprovado por que
tem dois votos a seu favor, os dos outros dois toureiros do cartel (Rui
Fernandes e Ventura).
Pode considerar-se um desrespeito de
Botero pelas tradições portuguesas?
De alguma forma, é legítimo que se possa
pensar assim. Vários estrangeiros, nomeadamente mexicanos e franceses,
receberam em Portugal as suas alternativas, mas receberam as alternativas de
cavaleiros tauromáquicos e passaram a tourear sempre de casaca e tricórnio nos
seus países. Em Espanha e em França (Nimes), já houve cavaleiros portugueses
que receberam a alternativa, se bem que a mesma não foi depois considerada
válida cá e tiveram que se submeter de novo a nova prova. Aliás, em Espanha,
legalmente, a antiguidade de um rejoneador é considerada pela data da sua
apresentação na Monumental de Madrid e até terem inventado recentemente a prova
de alternativa (mais significativa do que propriamente legal) essa cerimónia
não ocorria nunca com rejoneadores. Há a alternativa de matador de toiros, a
seguir ao debute como novilheiro com picadores, mas não existe oficialmente em
Espanha a alternativa de rejoneador. E muito menos cá. Diego Ventura, por exemplo, embora lisboeta, optou por ser rejoneador, está no seu inteiro direito. Mas não veio tomar a alternativa a Portugal. Aqui, neste caso, a única coisa que não bate muito certa é facto de Botero querer ser rejoneador e se submeter à alternativa de cavaleiro tauromáquico em Portugal, trajado de rejoenador e para continuar a ser rejoneador. Isso, Ventura não fez.
Resumindo e concluindo, que alternativa
vai Botero receber depois de amanhã em Lisboa?
Resumindo e concluindo, vai receber a
alternativa de cavaleiro tauromáquico, depois de esta tarde concluir os dez
espectáculos obrigatórios que medeiam a prova de praticante e a cerimónia de
alternativa. A partir da noite de quinta-feira, Jacobo Botero passa a ser
legalmente cavaleiro tauromáquico profissional, mas na prática será, como ele
optou, rejoneador.
É uma ilegalidade?
Ilegalidade não é. Mas também não é uma legalidade, é antes uma trapalhada "à portuguesa". A única ilegalidade
ou, se preferirem, o único desrespeito pela lei, é tomar a alternativa trajado
de curto, não cumprindo, por isso, o que está exigido na nossa lei, que é o
traje tradicional de casaca e tricórnio. Pagará por isso uma multa - e a
empresa também - e portanto tudo se resumirá, no fim, a um problema
simplesmente monetário e mais nada. Digamos que Jacobo Botero não vai atropelar
ninguém, nem chocar com outro automóvel, continuará a ter carta de condução,
mas será multado por que passou um sinal vermelho. E a lei diz especificamnete
que o sinal vermelho é para parar. Depois de pagar a multa, tudo continuará
como dantes e não haverá mais nada a apontar à cerimónia da próxima
quinta-feira no Campo Pequeno. Por isso, siga para bingo, que a praça esgote
outra vez e que Botero e os seus companheiros triunfem, que isso é que faz
falta!
Quem é que se pode opôr a esta alternativa?
Se quisessem, podiam opôr-se os cavaleiros portugueses. Existe uma Associação de Toureiros (nova designação do Sindicato), que até aqui não tomou posição contra. Mas também não vem nenhum mal ao mundo, nem à Festa, pela alternativa de Botero. Na realidade, ele vai ser rejoneador, mas vai receber em Portugal a alternativa de cavaleiro tauromáquico, sem se submeter ao que a lei exige, ou seja, sem se trajar como deve ser. É mais ou menos como ir para a sala de exame em fato de banho e de sandálias. Se os professores não se opuserem e se passar no exame, está aprovado e que se lixe a forma como ia vestido.
Quem é que se pode opôr a esta alternativa?
Se quisessem, podiam opôr-se os cavaleiros portugueses. Existe uma Associação de Toureiros (nova designação do Sindicato), que até aqui não tomou posição contra. Mas também não vem nenhum mal ao mundo, nem à Festa, pela alternativa de Botero. Na realidade, ele vai ser rejoneador, mas vai receber em Portugal a alternativa de cavaleiro tauromáquico, sem se submeter ao que a lei exige, ou seja, sem se trajar como deve ser. É mais ou menos como ir para a sala de exame em fato de banho e de sandálias. Se os professores não se opuserem e se passar no exame, está aprovado e que se lixe a forma como ia vestido.
Foto Henrique de Carvalho Dias