Miguel Alvarenga - Naquela manhã de 10 de Abril de 1977, vão passados 35 anos, Lisboa acordou sobressaltada com um toureiro dentro de um caixão à porta da praça de toiros do Campo Pequeno.
"Só saio daqui em triunfo ou morto" - garantia o brasileiro Fernando Guarany, que desta forma insólita lutava por uma oportunidade de pisar a primeira arena de Portugal.
A televisão, a rádio, os jornais e uma autêntica legião de curiosos acorreram ao Campo Pequeno para ver o toureiro, que vestia um traje azul e oiro e desde as sete da manhã permanecia dentro de um caixão colocado ao alto na porta principal do Campo Pequeno. A PSP prendeu-o, levou-o para a esquadra e apreendeu a urna, que lhe fora emprestada por um amigo que tinha uma agência funerária. O toureiro foi libertado e regressou para a porta da praça.
Já sem caixão, mas munido de capotes e muletas, estoques e bandarilhas e um cartaz onde informava ser o "único novilheiro brasileiro", ali permaneceu vinte dias e vinte noites, ao sol e à chuva. As necessidades fazia-as na velha Cervejaria "Zé Ricardo", regressando de imediato ao seu posto.
Ao fim dos vinte dias, a empresa (ao tempo, o filho de Manuel dos Santos, Manuel Jorge, Américo Pena, José Cardal e José Agostinho dos Santos) chamou-o ao escritório no primeiro andar e firmou-lhe um contrato para 29 de Maio. Guarany teve um mês para se pôr em forma. No dia da corrida, exigiu que a bandeira brasileira fosse hasteada na praça ou não actuaria. Esgotou o Campo Pequeno e iniciou aí a sua aventura nas arenas, actuando mano-a-mano com Paco Duarte.
35 anos depois, Fernando Guarany continua a tourear, menos corridas por ano que nos seus tempos, mas ainda agora acaba de regressar do México, onde participou num festejo ao lado do matador Óscar San Román. E este ano actuará no Verão na Monumental de Albufeira, assinalando os 30 anos da inauguração da praça e o 35º aniversário da aventura em Lisboa - um episódio que também pertence à história da praça de toiros do Campo Pequeno, este ano a assinalar o seu 120º aniversário.
Fotos M. Alvarenga e D.R.