quarta-feira, 16 de janeiro de 2019

João Salgueiro da Costa: "Procuro transmitir a emoção e o amor com que toureio!"

João Salgueiro da Costa ao colo do bisavô Dr. Fernando Salgueiro, ladeados por
seu avô Fernando de Andrade Salgueiro e por seu pai, João Salgueiro


A emoção vive a seu lado e define-se como "um toureiro de sentimento". Demorou, mas chegou. A temporada passada foi o ano do salto definitivo de João Salgueiro da Costa para o patamar das vedetas da nova vaga. Metas tem ainda muitas para atingir. Mas diz que "nunca se sentiu tão toureiro". Foi um dos cavaleiros que pisou em 2018 a "linha de fogo" e afirma que nem é capaz de tourear de outra forma. Diz que "ainda falta tudo" e que o que fez até agora foi "só criar condições para ser toureiro". Chegar a figura é o objectivo. João Salgueiro da Costa, toureiro de dinastia - e que dinastia! - é um dos cavaleiros em foco na próxima temporada

Entrevista de Miguel Alvarenga

- 2018 foi finalmente uma temporada de afirmação e mesmo de consolidação da posição que andaste tanto tempo a prometer. Porque demorou, João? Antigamente, os toureiros, caso, por exemplo, de teu pai, apareciam e num instante se afirmavam...
- 2018 foi a continuidade de um plano de reconquista a nível profissional e pessoal. Nunca nada está adquirido e eu vinha de uma fase em que as lesões e as baixas na quadra deixaram mossa. Sou um toureiro de sentimentos, transparente, que procura pisar terrenos para além da linha encarnada… os cavalos sentem esse risco e isso traz ao de cima as suas fragilidades, por isso a sua substituição não é fácil. Foi preciso recuperar a quadra. Mas 2018 foi o momento de viragem, houve boas actuações do princípio ao fim, como por exemplo na Nazaré, em Beja, Garvão, Portalegre, que foram sem dúvida de afirmação e de consolidação. Acho que o sucesso não tem prazo de validade e eu nunca me senti tão tranquilo e toureiro como hoje.

- Soaram e tiveram eco os teus triunfos em 2018, mas faltaram alguns palcos importantes, como o Campo Pequeno. Porquê?
- Estamos a passar uma época com muitos toureiros de qualidade e é impossível para a empresa do Campo Pequeno incluí-los todos numa só temporada. Calhou-me a mim em 2018 ficar de fora da temporada lisboeta, como já aconteceu a outros colegas ficar de fora e eu estar incluído! Faz parte!

- Ser filho de João Salgueiro e descendente de uma consagrada geração de cavaleiros ajudou ou foi prejudicial para a tua ascensão?
- Tudo tem os seus prós e contras, e neste caso, inicialmente facilitou porque o meu Pai estava no auge da carreira e a entrada nos cartéis surgia com alguma naturalidade, mas com o passar do tempo sofremos com muitas comparações por parte dos aficionados e isso dificulta porque o meu Pai deixou a fasquia alta!

- Como te defines como toureiro?
- Toureiro de sentimento..  procuro transmitir a quem se senta numa praça a emoção e o amor com que toureio!

- A emoção e até mesmo a verdade andavam algo arredadas da Festa. Toureiros como tu e outros mais destacaram-se em 2018 voltando a pisar a chamada “linha de fogo” e voltando a criar a emoção nas bancadas. Concordas?
- Concordo, penso que há um leque de toureiros com muita qualidade, prontos para competir a um nível alto e por isso adivinha-se um 2019 com grandes tardes!

- O que falta às novas figuras para serem ídolos e levarem público às praças?
- Faz falta as corridas ficarem na moda, as grandes marcas associarem-se a nós e os toureiros serem os protagonistas nos grandes eventos sociais como antigamente. Hoje em dia estamos muito focados no treino dos cavalos e na técnica do toureio e a parte comercial fica um pouco esquecida, mas penso que já estamos a dar a volta a essa situação.

- Novos cavalos e também um novo apoderado, José Manuel Ferreira Paulo “Cachapim”, motivaram-te a dar finalmente o salto que estava há uns anos adiado?
- Sem dúvida, o “Cachapim” tem sido fundamental. É um grande alicerce! É um grande amigo e está presente no meu dia-a-dia, envolveu-se muito na minha carreira e isso faz a diferença num apoderado! Os cavalos novos foram um grande “empurrão” para obter outros resultados, a égua “Princesa” é uma predestinada ao toureio e ter nascido cá em casa é uma enorme alegria, faz-nos recordar tempos de êxito com os cavalos do ferro Salgueiro!

- Os êxitos e o passo em frente que deste em 2018 vai ter consequências na próxima temporada?
- Tenho fé que sim, mas nesta vida cai-se de rabo a qualquer momento e por vezes isso faz-nos retroceder num processo normal que seria de evolução constante. Mas penso que a minha temporada de 2018 terá consequências positivas num futuro próximo!

- Acreditas que um toureiro que triunfa tem o caminho aberto ou hoje em dia a generalidade dos empresários não têm isso conta a baseiam mais as suas organizações na base das trocas e de interesses que não têm a ver com a realidade?…
- As trocas e interesses fazem parte do sistema, é uma realidade, mas não acho que prejudique quem triunfe de verdade. Por outro lado, quem triunfa de verdade, não significa que tenha praticamente o caminho aberto, tal como noutras profissões, a vida é uma luta constante!

- Tens superstições nos dias das corridas? 
- Deixei de ter tempo para isso numa altura em que tive que tratar dos cavalos mesmo no dia das corridas! Nesses dias não descuro de alguns hábitos que me ajudam na preparação e na concentração, mas são coisas diferentes das superstições.

- Que objectivos, que metas te faltam atingir?
- Falta tudo, até agora foi só criar condições para ser toureiro!

- A ministra da Cultura é inculta?
- A ministra da Cultura confundiu os seus gostos pessoais com o cargo que desempenha. A tauromaquia faz parte da Cultura Portuguesa e é um total contra-senso que a ministra a descrimine de tal forma! Na minha opinião deu um tiro nos pés!

- Qual o cartel ideal que gostarias de integrar?
- Não lhe posso chamar cartel ideal, mas talvez um cartel de sonho, que já é impossível de se realizar. Seria o meu bisavô Fernando Salgueiro, o meu Avô Fernando, o meu Pai e eu. Falando em cartéis possíveis de se realizarem, é óbvio que gostaria de tourear com o Pablo Hermoso e com o Diego Ventura, pois nunca reparti cartel com nenhum deles. Tem piada, que já estive anunciado uma vez com o Pablo em Santarém e outra com o Ventura em Haro, mas nenhum dos dois compareceu, já não me recordo se por doença ou alguma queda a cavalo..

- Se não fosses toureiro… 
- Era Veterinário ou Equitador, algo que me mantivesse perto dos cavalos no dia-a-dia.

- Que projectos para 2019? A equipa mantém-se?
- O projecto para 2019 é dar continuidade à temporada de 2018, apresentar cavalos novos e seguir crescendo, para concretizar o sonho de ser figura do toureio! A equipa irá manter-se.

Fotos Emílio de Jesus e D.R.