terça-feira, 23 de fevereiro de 2021

Ricardo Levesinho, presidente da APET: "As empresas estão preparadas para promover corridas já amanhã!"

Empresário conceituado e com obra feita, apoderado e actual presidente da Associação Portuguesa de Empresários Tauromáquicos (APET), Ricardo Levesinho fala, neste entrevista ao "Farpas", com esperança no futuro e na temporada que se avizinha depois do desconfinamento, apesar dos tempos de incerteza que continuamos a viver. Fala também das novas regras que poderão vigorar em 2021 e que têm sido tema das abordagens que a APET tem mantido com a IGAC. E, obviamente, fala do tema da polémica do cartaz da PróToiro que esteve na semana passada 24 horas em frente do Campo Pequeno e depois acabou por ser retirado. É uma entrevista lúcida e pertinente, na qual o líder da classe empresarial taurina apela à união e à necessidade de todos remarmos para um mesmo porto. Que seja seguro. E nos garanta um futuro melhor

- Entrevista de Miguel Alvarenga

Vivemos, tal como há um ano, um tempo de incertezas. Como presidente da Associação Portuguesa de Empresários Tauromáquicos, quais são as suas expectativas? Vamos ter temporada? E a partir de quando?

- Continuamos na incerteza, Miguel. Dependemos, como todo o tecido social e económico, do desenvolvimento do controlo das nefastas consequências desta pandemia que nos afectou a todos. Mas acredito totalmente que as empresas estão preparadas para promover corridas "amanhã", não só pela necessidade de reabrir o sector, mas muito pela competência que provámos ter no ano passado ao abrirmos as portas das nossas praças de toiros juntando muitos aficionados sem que nenhum surto tivesse existido, pelo respeito e compromisso que tivemos ao cumprir os planos de contingência que construímos. Mostrámos ao poder central e local que somos competentes e responsáveis e por isso não duvido que a DGS tenha em conta continuar a acreditar no nosso sector.


- A APET tem feito algumas diligências junto, nomeadamente, da DGS e da IGAC, com o objectivo de criar novas normas para a reabertura do sector, depois do confinamento?


- Existem diligências directamente com o Senhor Inspector-Geral da IGAC para, no momento certo, que ficou estipulado ser nos próximos tempos, reunirmos, para em conjunto com a DGS construirmos a reabertura.

 

- Considera que a temporada vai decorrer nos mesmos moldes da anterior, com as praças a 50%, outras a 30%, o público de máscara, tudo igual a 2020?


- O que nós pretendemos não é isso! O que iremos pedir é que a limitação dos 30% termine. Pelas razões que lhe disse anteriormente sobre a forma como tudo decorreu cremos que merecemos essa alteração. Em relação à máscara e aos ajustes que existiram, creio que até ao controle em massa da pandemia compreendemos que se mantenha, porque somos responsáveis e defensores da saúde pública, salvo uma ou outra alteração que entendemos possível como é, por exemplo, a obrigatoriedade de testes para os forcados e alguns ajustes relativos à presença dentro da trincheira, porque achamos que estarem toureiros fora de praça é não ter a dignidade e a importância devida a quem de direito.


- Está a ser estudada a possibilidade de se exigir aos espectadores que apresentem à entrada das praças um comprovativo de vacinação ou, quem não tiver sido ainda vacinado, um teste de covid feito 24 horas antes? Mas isso implica que um espectador gaste 100 euros (preço aproximado do teste) cada vez que quiser ir ver uma corrida... Será um projecto viável?


- Existem várias ideias no ar, muitas teorias, fala-se de passaporte, de bolhas, etc, e não podemos em momento algum recusar nenhum tipo de solução. Estamos disponíveis para junto da DGS avaliar as várias hipóteses, não esquecendo que é fundamental que os custos não recaiam sobre os aficionados nem sobre as empresas, porque se torna difícil suportar, por qualquer uma das partes, algum tipo de custo.


- Está no início do seu mandato como presidente da APET. Como encontrou a classe empresarial?


- Existem necessidades de ajustamentos e de entendimento, pois sem união e compromisso global não chegaremos onde queremos. É impossível a Direcção agradar a todos, mas a vida é mesmo assim, pois é normal que as pessoas tenham visões diferentes, agora o que tem de existir é respeito pelo programa aprovado em Assembleia-Geral e cooperação por parte de todos, desde as empresas que promovem mais espectáculos aos que promovem menos. Sempre sentimos que a participação de todos era a melhor forma de conseguir o sucesso, mas as empresas que promovem mais têm de entender as dificuldades das que promovem menos e as empresas que promovem menos naturalmente têm de compreender que os riscos, os investimentos e os compromissos em maior escala merecem igualmente respeito e compreensão. Nunca poderá existir uma APET dos que produzem mais e outra dos que produzem menos, mas tem que existir entendimento e racionalidade em algumas atitudes que às vezes surgem.


- No caso concreto das praças que gere como empresário e dos toureiros que apodera, quais as perspectivas e que novidades nos pode dar para 2021?


- As perspectivas são positivas como devem ser todos os projetos quando são construídos, porque o que procuramos desde logo é grandes espectáculos, inundados de triunfos e com casas cheias. Se não tivermos essa ambição creio que não seríamos o que somos. Temos esboçados os pilares da temporada e já fizemos várias gestões com toureiros e ganaderos. 

Em relação ao campo, já temos todos os curros selecionados e temos uma ilusão enorme pelas ganadarias escolhidas e estamos muito felizes com os curros que adquirimos pela sua apresentação para as nossas praças. 

Em relação aos cartéis estamos a fechar as negociações da temporada porque queremos ter tudo preparado para arrancar, se for possível, em Maio em Vila Franca, Chamusca e Moita.

Sobre os apoderamentos, continuo com muito gosto ao lado do João Ribeiro Telles, de quem me orgulho de acompanhar, e a principal novidade foi o compromisso em equipa com o Antonio Cardoso, da gestão da carreira do Tristão Ribeiro Telles Queiroz, em que acredito muito, porque possui características que nos fazem sonhar que irá conseguir ser Figura do Toureio.

 

- Vamos falar da polémica do cartaz da PróToiro, que dividiu o meio tauromáquico. Era a favor do cartaz tal como ele estava concebido?


- A resposta é muito simples. A decisão foi da PróToiro, onde a APET tem acento directivo. Por isso não existem dúvidas que a APET tem responsabilidade na elaboração do cartaz. Por ter existido polémica e opiniões divergentes, não obriga a que exista desresponsabilização por parte de ninguém. Foi um processo ponderado e discutido entre todos.

 

- A PróToiro ouviu a opinião dos associados e nomeadamente a opinião da APET antes de colocar o outdoor em Janeiro junto da Assembleia da República e agora junto da praça do Campo Pequeno?


- A PróToiro decidiu em sede de Direcção, onde todas as associações estão presentes, a elaboração e colocação deste outdoor junto da Assembleia da República, e a decisão positiva foi de todos, porque se entendeu promover uma abertura de consciências, porque o que sentimos é uma perseguição política com acordos parlamentares do governo com o PAN que colocam em causa os direitos e liberdades dos cidadãos. Temos tentado dialogar, pedir reuniões e inúmeros contactos que têm sido efectuados, mas têm existido dificuldades. Na minha avaliação pessoal, não entendi como nenhum ataque pessoal nem nenhuma provocação fútil e mal educada, pois sou completamente contrário a esse tipo de posturas, mas sim o dizer, estamos aqui, e queremos que os nossos filhos continuem a acompanhar-nos aos toiros. Só pedimos que nos respeitem, a nós e à liberdade consagrada na Constituição da República Portuguesa.

Em relação à colocação junto ao Campo Pequeno, o que se passou resume-se a uma vontade enorme de apoiar, por parte da empresa de comunicação, que nos quis oferecer mais tempo de divulgação considerando que estava a dar uma enorme ajuda. No seu entender o Campo Pequeno era o lugar mais importante de Lisboa para ser colocado, depois do Parlamento, mas sem validar com a PróToiro. Assim que tivemos conhecimento da sua colocação, a Direcção da APET pediu desde logo a sua retirada, que foi aceite por todas as Associações, de imediato, pois todos concordaram que o cartaz não deveria estar naquele lugar. Este é um momento em que temos de estar todos unidos e remarmos todos na mesma direção. 


- A PróToiro anunciou na última semana que tem em mãos um projecto para continuar com as touradas no Algarve. Sabe-se que a Monumental de Albufeira, vendida pelo seu proprietário, o matador Fernando dos Santos, a uma empresa que já disse que não a ia utilizar mais como praça de toiros, é um caso arrumado. Assim sendo, por onde passa esse projecto da PróToiro, a que a APET não será certamente alheia? Pela construção de uma nova praça de toiros no Algarve? Ou por onde?


- O objectivo é que todas as Associações representadas na PróToiro reúnam vontades e criem um projecto para a realização de corridas, recuperando cidades que até há pouco tempo tinham corridas na região do Algarve. Terá de ser o resultado do esforço de todos, cada um contribuindo com a sua parte, para se reconquistar mercado e alargar a festa no Algarve.

 

- Peço-lhe agora um breve balanço da sua actividade empresarial no mundo da tauromaquia. Tem valido a pena?


- Esta actividade é acompanhada por uma grande paixão e às vezes a falta de racionalidade provocada por aspectos emocionais, por ser aficionado, provoca dificuldades económicas e já passei por isso tudo. Continuamos a querer continuar com mais vontade de vencer e contribuir positivamente para a nossa Festa e por isso estamos a trabalhar com bons profissionais ao nosso lado procurando assim melhorar, desde a comunicação e marketing, ao controlo do bem estar animal com presença constante de veterinário da empresa e a criação de formatos, como visitas a ganadarias levando os aficionados a verem os embarques, tentas e ferras, por exemplo. Continuo a pensar que vale a pena defender o que acreditamos e mais ainda quando conseguimos estar em projectos que contribuem para elevar a Festa, que sempre idolatramos, e conhecer pessoas que se tornam muito importantes na nossa vida. 

 

- Por último, Ricardo Levesinho, uma palavra de esperança aos aficionados. Tudo vai melhorar?


- Os desafios são muitos porque vivemos num tempo de grandes contradições, ignorância e desconhecimento, agravados por uma pandemia terrível. É na ignorância que se desenvolvem a demagogia, as realidades alternativas, as fake-news, a intolerância... que muitas vezes têm acolhimento nos media. 

Muitas das pessoas não ensinaram os seus filhos a conhecer o campo, as raízes, a história do nosso país e o conceito ético e humanista da tauromaquia. Por outro lado, temos na sociedade um problema de afecto. As pessoas estão isoladas umas das outras. Já verificou, Miguel, que entramos num elevador e nem um bom dia escutamos? E muitas vezes essa falta de afecto é compensada pela companhia de um animal de companhia e, daí a passar a humanizar os animais, é um passo muito rápido e que se está a verificar. E temos um partido político que defende isto, o que é inacreditável.

Se todos fizermos o papel de embaixadores, acredito que o caminho sairá muito fortalecido e teremos o futuro que sonhamos, que simplesmente passa pelo respeito, pela tolerância, pela liberdade cultural da tauromaquia, como sempre a conhecemos com os seus valores de coragem, solidariedade, ecologia, arte, entre muitos outros. Temos nas mãos uma jóia do património cultural português, um património único no mundo!  A Festa é muito grande, especialmente nos seus valores e humanismo, por isso há muito futuro para trilhar.


Foto D.R.