segunda-feira, 24 de fevereiro de 2020

Campo Pequeno: sombras, dúvidas e mil incógnitas...


Continua ensombrado o futuro das touradas no Campo Pequeno, à espera da análise do Tribunal do Comércio à providência cautelar interposta pelo anterior administrador da sociedade insolvente - de que pode haver decisões nos próximos dias

Miguel Alvarenga - É escandaloso que isto esteja a acontecer, 128 anos depois do emblemático Campo Pequeno ter sido inaugurado com o propósito - bem claro - de ser uma praça de toiros, mas a verdade é que os dias passam e não há meio de nos dizerem se vai ou não vai haver corridas este ano - e nos próximos.
Normalmente nesta altura do ano já estavam praticamente formados os primeiros cartéis e já estava mesmo agendada a data da sua apresentação - e no dia de hoje ainda não há sequer um toureiro e um toiro contratados para actuar na primeira praça do país.
Vai realizar-se no próximo sábado o Dia da Tauromaquia, que já estava agendado antes da eventual compra da sociedade pelo empresário Álvaro Covões - e mesmo essa compra não se entende ainda se foi ou não efectivada, uma vez que a escritura continua a não aparecer nos autos do processo da insolvência da Sociedade de Renovação Urbana do Campo Pequeno (SRUCP) que decorre no Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, Juízo do Comércio-Juiz 5, com o nº 541/13.OTYLSB - como o "Farpas" revelou na última semana.
"Não é normal que a escritura não esteja ainda nesta altura apensa ao processo, como não são normais muitas coisas em todo este processo, nomeadamente o facto de não se saber quem mais concorreu à compra do Campo Pequeno, além de Álvaro Covões", diz um dos advogados de um dos credores, com procuração nos autos.
"O facto de os novos administradores já terem, aparentemente, 'tomado posse' e já estarem mesmo 'instalados' na praça, faz acreditar que a escritura tenha sido assinada, mas é muito estranho então que continue a não aparecer nos autos...", acrescenta.
Por outro lado, a providência cautelar interposta na véspera da alegada assinatura da escritura, pelo anterior administrador da SRUCP, João Borges, terá tido efeito suspensivo da referida venda e agora espera-se pela decisão do Tribunal do Comércio, que "no caso de considerar a providência procedente levará mesmo à anulação do negócio e, por isso, à saída do empresário Álvaro Covões, voltando tudo à estaca zero e mantendo-se ao leme a administradora de insolvência até à realização de um novo concurso", adianta a nossa fonte.
Tudo isto está a manter este impasse e a adiar, por consequência, o avanço da próxima temporada. Rui Bento, que nos últimos 14 anos esteve à frente da Direcção de Tauromaquia da empresa do Campo Pequeno, continua a estar diariamente na praça, mas "de braços cruzados" à espera de luz verde para iniciar a formação dos cartéis...
A incógnita permanece, ante a também incompreensível passividade dos agentes da Tauromaquia. A ProToiro já informou, em declarações do seu secretário-geral Hélder Milheiro na última quinta-feira ao site Infocul de Rui Lavrador, que vai pedir uma reunião à nova administração do Campo Pequeno. Mas a realidade é que não se entendeu ainda se a nova administração está em actividade ou se está, de facto, suspensa por obra e graça da providência cautelar de João Borges...
Existem dois cenários possíveis: o Tribunal considerar procedente a providência cautelar e anular a venda da sociedade a Covões, mantendo-se Paula Resende ao leme da empresa e avançando então, mesmo tarde e a más horas, com a realização da temporada tauromáquica; ou o Tribunal considerar improcedente a providência cautelar e Covões iniciar então o seu reinado como novo empresário da praça; e neste caso, existem também outros cenários possíveis:
Álvaro Covões já disse que o seu negócio "é a música e não os toiros" - mas não se pode esquecer que não comprou a exploração de um ringue de patinagem, mas sim de uma praça de toiros. O empresário do mundo musical pode vir a subalugar datas para a realização de touradas. Pelos corredores do Campo Pequeno, fala-se em surdina da sua intenção de disponibilizar quatro datas, duas em Julho e duas em Agosto, o que representaria que estávamos perante o princípio do fim, com apenas quatro corridas em Lisboa.
A confirmar-se, resta saber se Rui Bento está interessado em ser ele a promover essas quatro corridas ou se entraria em cena um dos grupos (pelo menos dois perfilam-se nesse sentido) que já terão manifestado a Covões o seu desejo de ser promotores de corridas de toiros na primeira praça do país.
Muita tinta vai ainda correr. Sobre várias incidências do processo de insolvência. E principalmente sobre o futuro, cada vez mais incerto, do Campo Pequeno enquanto praça de toiros, primeira do país, edificada há 128 anos precisamente com esse objectivo - que não pode ser desvirtuado de forma alguma. Ou, pelo menos, não devia...

Foto Guilherme Alvarenga