António Prates: valente e decidido, a denotar uma vontade férrea de se afirmar. Lidou os toiros de Castro e de Palha com ousadia a valor |
Corrida de muitas emoções, praça cheia, toureiros jovens com atitude e ganas, forcados heróicos, toiros de verdade. Foi assim ontem em São Manços. O dinâmico (e sério!) empresário Rui Palma recolocou em definitivo esta data de Páscoa no roteiro dos aficionados. E Luis Rouxinol saltou à arena e fez um quite incrível a corpo limpo a seu filho num momento de apuros. O público levantou-se a aplaudi-lo. Concurso de ganadarias terminou com uma vaia monumental à decisão do júri quanto ao prémio de bravura. Não era preciso ter acabado assim uma fantástica tarde de toiros...
Miguel Alvarenga - O Domingo de Páscoa, outrora data oficial da abertura da temporada nacional e que tinha sempre por cenário a praça de toiros do Campo Pequeno, é desde há poucos anos e por obra e graça do empenho do jovem empresário Rui Palma, uma data obrigatória no roteiro dos aficionados, mas agora na castiça praça alentejana de São Manços - que ontem encheu.
O cartel era altamente apelativo. Fugia ao "mais do mesmo", integrando três jovens estrelas do toureio a cavalo. O triunfador da última temporada, Francisco Palha; o fantástico Luis Rouxinol Júnior, que está um torerazo e um portento de raça; e o promissor António Prates, que joga tudo em todas as tardes com uma vontade férrea de se afirmar - e arrisca.
Três grupos de forcados alentejanos - de valor. Os de São Manços, os do Grupo Real de Moura e os de Beja. Foi, no campo das pegas, uma tarde de emoções, os três grupos estiveram à altura do desafio, o grande pegão da tarde foi o de Jorge Valadas, forcado consagrado dos Amadores de São Manços, ao quarto toiro da tarde, o exemplar de Veiga Teixeira. Já aqui vamos mostrar as pegas todas, uma a uma.
Momento alto da corrida: o valente e arrojado quite de Luis Rouxinol, a corpo limpo, num momento de apuro de seu filho ao início da lide do seu primeiro toiro, o bonito e complicado exemplar da Herdade de Pégoras. Luis Rouxinol é, nestes casos, um verdadeiro herói. É sempre o primeiro a saltar quando um colega está em perigo. Muito mais, neste caso, tratando-se do seu filho. O público levantou-se a aplaudi-lo. Olé!
Artisticamente, não houve propriamente um triunfador. Os três cavaleiros alcançaram momentos notáveis, sobretudo na segunda parte da corrida, depois de um curto intervalo de dez minutos - que faz sempre falta. Cada qual no seu estilo, foram os três triunfadores de uma tarde emotiva e dura. Onde houve emoção. Lá está: quando há toiros de verdade, a Festa tem outro sabor. Outro risco. Outro triunfo.
A primeira parte foi assim-assim. Francisco Palha brindou a lide do toiro de Canas Vigouroux a sua mãe. Com presença, mas de investidas pouco claras, o toiro foi bem lidado e bem toureado. Os dois compridos ficaram algo descaídos, nos curtos Palha emendou-se numa lide de bom tom, mas sem um brilhantismo por aí além.
Na segunda parte, veio mais decidido a "partir a loiça". O toiro de Veiga Teixeira, de apresentação irrepreensível e que investia de todos os terrenos com alegria, permitiu a Francisco Palha executar, agora sim, o seu toureio de risco e de verdade, com aqueles ferros a entrar pelo toiro dentro "contra as tábuas", os que páram corações e consagram a verdade do toureio. Pisou a linha de fogo, esteve "à Palha", enorme.
Luis Rouxinol Júnior inicia esta temporada com a decisão dos toureiros que querem fazer História. Está na "guerra" para vencer todos os confrontos e fazer frente a todos os toiros. Com uma raça e umas ganas invejáveis, uma atitude e um desejo de vencer que confirmam estarmos na presença de um grande toureiro.
Toureou primeiro o toiro da Herdade de Pégoras, um toiro bonito e sério, complicado e que transmitiu. Levou logo de início um fortíssimo "aperto" contra as tábuas, depois empenhou-se e deu a volta a todas as dificuldades que o toiro impôs, conseguindo uma lide emotiva e de valor.
Mas foi também na segunda parte, frente ao toiro de Passanha, muito bem apresentado e bravo, que o novo Rouxinol brilhou em grande. Foi recto ao oponente, cravou com emoção e rematou as sortes com arte, levantando o público das bancadas. Uma lide memorável e a afirmação de um toureiro que não deixa dúvidas a ninguém: está a caminhar depressa e em força para o alto patamar da consagração como figura.
António Prates andou valente com o toiro de Fernandes de Castro, um toiro sério, meio reservado e sem grande clareza nas investidas, a que o jovem cavaleiro fez frente com ousadia e muito querer. Sofreu alguns toques violentos, mas não desarmou, evidenciando uma vontade férrea de se afirmar e fazer a diferença.
No toiro de Palha, um toiro bravo, imponente, de apresentação notável, Prates convenceu o público. Esteve decidido, com atitude, com imenso querer, a mostrar que vai mesmo ser um caso e não apenas só mais um toureiro. Ele faz tudo para agradar e é um toureiro de risco. Ao desafio de ontem, frente a toiros de verdade, segue-se a corrida de 11 de Maio no Montijo com os Castros e a alternativa a 22 de Junho em Alcochete.
Bem as quadrilhas dos cavaleiros com toiros que não foram fáceis, com destaque maior para Manuel dos Santos "Becas" e Diogo Malafaia.
Os forcados estiveram valentes e os três grupos bem a ajudar. Rui Pelado e Jorge Valadas (pega da tarde), honraram a jaqueta dos Amadores de São Manços com duas pegas à primeira. Pelo Real Grupo de Moura foram caras Rui Branquinho (à quarta) e Cláudio Pereira (à primeira). Pelos Amadores de Beja pegaram Nuno Vitória (à segunda) e Guilherme Santos (à primeira).
Eram júris do concurso de ganadarias três jovens críticos taurinos: Miguel Ortega Cláudio, Bernardo Patinhas e Pedro Guerreiro.
Com os representantes das seis ganadarias na arena, anunciou-se no final da corrida os vencedores. Prémio de apresentação atribuído ao toiro de Veiga Teixeira. E o público aplaudiu. Se bem que os de Passanha e de Palha e até o de Pégoras, tiveram também irrepreensível apresentação. Prémio de bravura atribuído (também) ao toiro de Veiga Teixeira. E a praça veio abaixo com uma vaia monumental. Era desnecessário terminar assim uma corrida que tinha corrido tão bem... Não foi um toiro manso, nem nada que se lhe pareça, o toiro de Veiga Teixeira. Não é por aí. Mas... o toiro de Palha e o toiro de Passanha... não estavam também em concurso? Enfim, assim vai a Festa...
Como sempre, acertadíssima direcção de corrida de Agostinho Borges, que esteve assessorado pelo médico veterinário Dr. Matias Guilherme. Ao início da corrida foi guardado um minuto de silêncio em memória de Ricardo Chibanga.
Só mais isto: bonita a atitude de Francisco Palha, que depois de um triunfo importante e valoroso, ao terminar a merecida volta à arena, se afastou, entregando o tricórnio ao forcado Jorge Valadas e empurrando-o para o centro da arena para que fossem dele e para ele os maiores aplausos nesse quarto toiro da tarde. Um Senhor, o grande Palhinha. Sempre.
Fotos Maria Mil-Homens