sexta-feira, 13 de setembro de 2019

Moita: um acidente e algumas reflexões...



O acidente sofrido ontem na Moita pelo fotógrafo Fernando Clemente pode e deve servir de aviso a quantos pululam constantemente nas trincheiras das nossas praças de toiros, sem direito a ali estarem e muitos deles sem aptidões físicas para se salvarem numa situação perigosa. Alguém de direito, a IGAC, a Associação de Empresários, seja quem for, tem que urgentemente rever toda esta "balda" e tomar decisões - que vão ter mesmo que ser drásticas - para evitar que incidentes como o de ontem se repitam

Miguel Alvarenga - Pode ser exagerado, e é certamente, afirmar que o que aconteceu ontem ao fotógrafo Fernando Clemente na Moita só aconteceu por estarmos em Portugal e as coisas por cá continuarem a ser uma desorganizada balda no que à tauromaquia (mas não só...) diz respeito. Ainda há uns meses, também um repórter fotográfico mexicano foi atingido e gravemente ferido por um toiro que saltou as tábuas, pese embora o facto de se encontrar devidamente acomodado dentro de um burladero - o que ontem não sucedeu com Clemente, que estava fora do burladero.
A desorganização começa com a permanente e constante presença de curiosos nas trincheiras de todas as praças. Nem se entende como há tantas senhas de trincheira que tornem isso possível. 
Primeiro e importante passo a dar: a Inspecção-Geral das Actividades Culturais tem urgantemente - e deve, tem mesmo essa obrigação - que reduzir drasticamente o número de senhas de acesso às trincheiras, permitindo exclusivamente a presença nesse sector da praça a quem tenha mesmo um motivo válido (trabalho) para ali estar.
Critica-se a toda a hora o governo por ter mulheres, primos, filhos e enteados em todos os gabinetes, mas ninguém se importa que nas trincheiras das praças de toiros (como ontem foi bem visível na Moita e o é sempre em todas as praças) estejam permanentemente irmãos, primos, sobrinhos, filhos ou simplesmente amigos dos artistas... que não estão ali a fazer absolutamente nada, a não ser atrapalhar quem trabalha e tirar lugar nos burladeros a quem tem o direito e o dever de ali estar acomodado.
Segundo: há que disciplinar quem se encontra - legitimamente - numa trincheira, seja repórter fotográfico ou não, obrigando à sua permanência atrás dos burladeros sempre e durante todo o espectáculo, evitando movimentações desajustadas na trincheira - e aqui, sobretudo, há que chamar os fotógrafos à ordem -, criando mesmo multas para quem desobedecer a essa medida.
Ontem na Moita, como, aliás, é bem visível nas várias fotos de social que esta tarde publicámos, eram raros os transeuntes na trincheira que se encontravam devidamente situados atrás dos burladeros. São inúmeros (bastará rever essas fotos) os curiosos que estão fora dos burladeros e muitos deles, mesmo, encostados à trincheira, sem estarem, ao menos, atrás, junto à parede.
Há praças, como a da Moita, que têm burladeros suficientes para acomodar quem ali tem que estar. E outras que os não têm e, nesse caso, deverão ser obrigadas pela IGAC a tê-los. Mas a realidade é que, por muitos que eles sejam, há burladeros a menos para tanta gente que costuma estar nas trincheiras...
A trincheira de uma praça de toiros deveria ser um palco reservado aos artistas, suas quadrilhas e aos seus colaboradores mais directos (moço de espadas, apoderado e poucos mais). ao pessoal de curros e bandarilhas, às autoridades policiais e aos repórteres fotográficos, mas a um número reduzido destes, por exemplo, consoante a antiguidade e até mesmo a importância do orgão que representam. Que nenhum me leve a mal, mas a verdade é que hoje qualquer um cria um blog ou um site e se sente no direito de solicitar uma credencial para fotografar na trincheira - e as empresas dão-lhes.
Fernnado Clemente, mesmo com o descuido de não estar dentro de um burladero, estava legitimamente ontem na trincheira. Tem um site taurino mas, mais importante que isso, colabora desinteressadamente com todos os que lhe pedem fotos e está sempre pronto a ajudar e a colaborar.
Ontem, era o homem errado no lugar errado. E o que lhe aconteceu pode acontecer amanhã a qualquer outra pessoa numa trincheira, se esta balda continuar e se ninguém tomar medidas sérias, primeiro para reduzir drasticamente o número de turistas nas trincheiras, depois para consciencializar e ensinar, a quem ali tem direito de estar, que nunca, mas nunca - lá dizia o Emílio - se deve perder a cara ao toiro. Clemente ontem perdeu-a. E só mesmo por milagre não perdeu também a vida.
Estas imagens falam por si - e que sirvam, ao menos, de um sério aviso à navegação.

Fotos M. Alvarenga